No quarto preservado do médium, uma das atrações do museu, em Uberaba, estão ainda 13 imagens de santos, como São Francisco de Assis, Santa Sara e São João Bosco. Há ainda perucas, boinas, dentaduras e a cadeira de rodas que o acompanhou nos últimos momentos de vida. “Chico nunca pediu para alguém se converter ao espiritismo”, conta Célia, do Centro Luiz Gonzaga. “Ele foi o bandeirante da mediunidade. As pessoas atiravam pedras, mas ele seguia desbravando”, reforça o empresário Neto, da Casa de Chico. De fato, o mineiro foi julgado e tachado de louco e mentiroso, abriu mão do conforto e conviveu com problemas de saúde desde muito novo, sem reclamar de nada. “Eu o vi gastar dinheiro para transferir uma fazenda, em Goiás, que lhe foi doada por um milionário goiano, para poder entregá-la o quanto antes para os pobres”, conta Eurípedes Tahan, 73 anos, seu médico pessoal. “Gostaria de ser sucessor de Chico ou, como muita gente, ser como ele. Mas não dou conta de amar, trabalhar, ter a paciência e a capacidade de perdoar que ele tinha”, diz o aposentado Celso de Almeida Afonso. Aos 68 anos – 28 de psicografia –, Afonso se tornou um dos médiuns mais procurados em Uberaba depois da morte de Chico. Apesar de ter psicografado 18 mil mensagens, de acordo com suas contas, ele diz ter preguiça de escrever. Por outro lado, relata ter recebido seis mensagens assinadas pelo maior nome do espiritismo nacional.

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Na “Casa de Chico”, em Pedro Leopoldo, estão os 458 livros publicados pelo médium e outros 180 títulos sobre ele

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Treze imagens de santos, perucas, boinas e dentaduras estão entre os objetos expostos no quarto dele em Uberaba

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LAR
A casa onde funcionou o centro espírita do médium, em Uberaba

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“Entendo que estou sendo agraciado sem que o não mereça, mas cabe- me saber que sou, o que fiz e o que pretendo ainda  realiza…”, diz um trecho da última,segundo ele, ditada por Chico Xavier, em meados de dezembro passado. Outro médium de Uberaba e antigo frequentador do Grupo Espírita da Prece, fundado por Chico em 1975, Carlos Baccelli, foi mais ousado. Ele publicou três livros com mensagens de Chico psicografadas, segundo afirma, por ele. “Eu sou um médium resolvido. Eu esperava, sim, receber mensagens do Chico. Esses 25 anos de convivência tornaram fácil essa sintonia. Tem de haver algum grau de afinidade entre o médium e o espírito”, afirma ele, com 120 livros no currículo e autor do recémlançado “100 Anos de Chico Xavier – Fenômeno Humano e Mediúnico”. Eurípedes, o filho de Chico, refuta a ideia de que seu pai tenha feito contato com Afonso, Baccelli ou qualquer outra pessoa, argumentando que o pai teria deixado um código para ele, a amiga Kátia Maria e o médico Tahan poderem identificar um recado autêntico (leia quadro). É Eurípedes quem administra o museu, a livraria e o Grupo da Prece e Assistência Chico Xavier, que oferece jantar para pessoas carentes e distribui enxovais para gestantes.

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TESOURA E NAVALHA
Belmiro Neto, barbeiro de Chico: ele aparava as perucas do amigo de 30 anos

Também estão em seu poder psicografias inéditas do pai, que serão compiladas para a confecção de meia dúzia de novos livros. No dia seguinte ao aniversário do pai, Eurípedes fará um bolo de 160 quilos para ser distribuído para quem visitar o museu. “Meu pai consolava as mães que perderam seus filhos, dizendo para elas distribuírem um bolo no aniversário deles, pois seria a melhor maneira de homenageá-los”, conta. “Faço isso todo ano, como ele ensinou, porque a saudade do meu pai é grande.” Ainda não está programado nenhum outro evento em comemoração ao centenário daquele que colocou Uberaba em destaque no mapa mundial. Os uberabenses costumam comentar que a morte de Chico teve o impacto da perda de uma indústria. A movimentação na cidade tem aumentado, como contam os comerciantes. Nada comparável à época em que Chico reinava diante de um séquito, entre presidentes da República, artistas e empresários, que toda semana o visitavam e contribuíam para o PIB de Uberaba. “Nossa cidade é, da parte da classe política, muito ingrata com Chico”, reclama o médium Baccelli. “Ele desencarnou há quase oito anos e não há uma rua ou praça com seu nome. E a única ação pública, o memorial Chico Xavier, é uma novela que já dura quatro anos.

Ao contrário de Pedro Leopoldo, em Uberaba não há uma rua ou praça que homenageiem o médium

” Em Pedro Leopoldo o cenário é outro. A começar pela existência da Fundação Cultural Chico Xavier, que tem por objetivo promover a vida e a obra do médium. Mais: por meio de uma votação, a população elegeu os locais tidos como obrigatórios para os visitantes que pretendem saber um pouco mais sobre o religioso. Assim, viraram pontos turísticos a casa onde Chico nasceu e hoje abriga o Centro Luiz Gonzaga, a construção onde viveu, atualmente Casa de Chico, a Fazenda Modelo, endereço de seu antigo trabalho, o açude, próximo do qual ele teve o primeiro contato com Emmanuel, seu maior guia espiritual, o centro espírita Meimei, fundado por Chico, e a praça Chico Xavier. Entre 30 de junho e 10 de julho, Pedro Leopoldo será a sede da 8a. Semana Espírita Chico Xavier e palco de apresentações teatrais e ciclo de palestras. Em junho também será lançada a primeira biografia do maior médium do Brasil escrita por um cidadão pedro-leopoldense. O autor, o psicólogo e professor de educação física John Harley Madureira Marques, conviveu com Chico por 21 anos e está há dois trabalhando na obra, cujo título é mantido em segredo. Fazia tempo que Chico Xavier não ficava tão próximo das pessoas que o viram crescer e triunfar na missão a que ele se propôs. Não precisa ser nenhum médium para sentir sua presença em Minas Gerais. 

O CÓDIGO XAVIER

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AMIGO
O médico Eurípedes Tahan, um dos três que conhecem a senha

É de esperar que quem dedicou a vida a ser porta-voz dos espíritos mantenha alguma comunicação com os vivos depois de morto. Desde o falecimento de Chico Xavier, há quase oito anos, inúmeros médiuns apareceram dizendo-se receptores de mensagens enviadas por ele. Para driblar os aproveitadores, Chico combinou um código secreto com as três pessoas mais próximas dele – o filho adotivo, Eurípedes Higino dos Reis, o médico particular, Eurípedes Tahan Vieira, e Kátia Maria, grande amiga e acompanhante dele até a morte. Quando, e se houver comunicação, a mensagem será recebida por algum médium e conterá três informações. Os três continuam esperando. “Infelizmente, até hoje, nenhuma era dele”, diz o filho.


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