Terça-feira, 22 de agosto, 13 horas. O Mercedes CLS 500 aproxima-se do restaurante Antiquarius, um dos endereços mais exclusivos freqüentados pela elite no elegante bairro dos Jardins, em São Paulo. “É o Bivar”, afirma o manobrista Luis Rodrigues de Carvalho, um dos poucos brasileiros que sabem quem é o ocupante do veículo que está chegando. “É nosso cliente antigo”, explica. Com menos de 1% das intenções de voto para presidente da República, o empresário pernambucano Luciano Bivar, do minúsculo Partido Social Liberal (PSL), continua na mesma posição que ocupava quando começou a campanha eleitoral gratuita no rádio e na tevê, em 15 de agosto: o último lugar. Não está sozinho – Cristovam Buarque (PDT) e José Maria Eymael (PSDC) dividem com ele a lanterninha da disputa presidencial. “O eleitor ainda não conhece o Luciano Bivar”, lamenta o próprio candidato.

De todos os postulantes à sucessão no Planalto, Bivar é o mais rico: declarou um patrimônio de R$ 8,8 milhões. É o principal acionista de uma empresa de seguros, a Companhia Excelsior, tem aplicações financeiras no Exterior e muitos imóveis no Recife e em São Paulo. Mesmo assim, faz uma campanha pobre, sem grandes eventos nem movimentações pelo País. Sua estimativa oficial era arrecadar até R$ 60 milhões, terceira maior cifra apresentada pelos partidos. Até agora, entraram apenas R$ 230 mil no caixa. “Achava que ia para o segundo turno”, diz Bivar, ao explicar por que um partido com somente 138 mil filiados e sem representante no Congresso Nacional (o único deputado eleito pela sigla, Lincoln Portela, debandou para o PL) estimou uma arrecadação tão vultosa. Apesar do que poderia indicar a Ferrari amarela estacionada em frente ao comitê central do PSL, também nos Jardins, as perspectivas de entrar mais dinheiro na campanha não são das melhores. A macchina italiana pertence ao seu filho Cristiano, 24 anos. E as duas inserções diárias de um minuto e 15 segundos na tevê não estão atraindo o apoio esperado dentre os eleitores e os doadores potenciais. “Com essas pesquisas, não tenho cara-de-pau de incomodar nenhum empresário amigo meu”, diz.

Exceto quando fala na tevê ou no rádio, Bivar também não tem a cara-de-pau necessária para incomodar os eleitores. Ao contrário dos demais candidatos, ele não faz caminhadas, não discursa em público, não carrega crianças no colo nem faz promessas em sua campanha. Na visita ao prefeito de Osasco, Emídio de Souza (PT), na quinta-feira 17, ele cancelou uma caminhada no calçadão e voltou ao seu escritório, no flat George V Residence – nos Jardins, claro. Antes, ouviu pacientemente o folclórico funcionário da prefeitura José Flávio Carneiro, que, de gravador em punho, apresentou-se como Cidadão Osasquense e Missivista Oficial da Pujante Cidade de Osasco e pediu uma declaração, como faz há anos com todos os políticos que passam por lá. “Perfeito, perfeito”, disse Bivar, sem prometer nada. Na terça-feira 22, no Antiquarius, cumprimentou os funcionários, mas não pediu voto a nenhum. “Não sou político profissional”, afirmou a ISTOÉ. “Sou o anticandidato.” E por que está na disputa? “Por indignação e total falta de opção”, responde. “E porque temos uma proposta viável para o Brasil”, insiste.

Apesar do discurso, Bivar não é novato na política. Há 12 anos, foi candidato a prefeito do Recife, sem sucesso. “Nem lembro quantos votos eu tive”, diz. Em 1998, elegeu-se deputado federal pelo PSL, “com uns 80 mil votos”, e exerceu o mandato até 2003. Ligado ao Sport Club do Recife, do qual é presidente pela sexta vez, Bivar já foi chamado de “Ricardo Teixeira” do Nordeste pelos adversários e fez parte da chamada “bancada da bola” no Congresso Nacional. Vêm dessa época suas principais propostas, a maioria de conteúdo polêmico e de difícil realização.

A mais notória é a criação de um imposto único federal, que substituiria todas as taxas cobradas pela União por uma alíquota fixa de 3,4%. “É a melhor solução econômica para o País”, defende. Ele também quer privatizar os presídios, instalar miniquartéis do Exército em todas as favelas e instituir a pena de morte no Brasil. A pena capital seria por apenas 20 anos e para um crime específico: seqüestro seguido do assassinato da vítima. “É a única maneira que o Estado pode ameaçar o seqüestrador”, afirma. A idéia lhe ocorreu quando seu filho mais velho, Luciano, sofreu um seqüestro relâmpago, em 2000.

Outra proposta ousada do candidato é a extinção da dívida externa brasileira. Em vez de pagar os credores internacionais, o País usaria os recursos para construir uma grande rodovia de Norte a Sul. Os investidores não só abrirão mão de receber os US$ 170 bilhões a que têm direito, segundo seus cálculos, como irão emprestar mais US$ 170 bilhões para financiar a auto-estrada. Vão receber todo o dinheiro de volta em 50 anos, com a exploração dos pedágios. Pelo menos, é o que Bivar imagina. “Os investidores vão aceitar, pois estão abarrotados e não têm mais onde investir”, argumenta. E como convencê-los sem dar o calote? “Vou fazer como o barão do Rio Branco. Com a pastinha na mão, vamos negociar”, planeja, enquanto almoça um delicioso carré de cordeiro.

Na cartilha constitucional distribuída pelo PSL, Bivar faz outras propostas para o que chama de “revolução democrática sem sangue, sem armas e sem invasões”. Dentre elas, uma ampla anistia fiscal, que cancelaria as dívidas dos Estados e dos municípios com a União, as dívidas das pessoas físicas com o poder público e as dívidas securitizadas de todas as origens, incluídas as contraídas pelo setor agrícola no primeiro semestre de 2006. O grande perdão aos devedores somente seria possível após a adoção do imposto único federal. “Ninguém mais vai declarar Imposto de Renda no Brasil”, diz Bivar. A anistia também garantiria a volta dos dólares de investidores brasileiros depositados irregularmente no Exterior, imagina o candidato.

Tais propostas, agora veiculadas em cadeia nacional, não têm sido capazes de melhorar sua posição na corrida presidencial. Mesmo assim, Bivar ainda faz planos para ir além e, uma vez eleito, acabar com a “burocratocia”. E o que é isso? “Burocratocia”, segundo definiu em um livro sobre o tema, é o poder invisível da burocracia, que utiliza cargos e funções públicas em busca de privilégios para se eternizar no poder. Ela está em todas as esferas de governo e representa um perigo real para a democracia, sustenta Bivar, que é filho de um funcionário público. “O próprio presidente da República é refém desse poder invisível”, queixa-se o candidato. Com exemplos, fica mais fácil explicar. “O PMDB e o PFL são partidos de burocrácios, que tudo fazem para se manter no poder”, diz. Entendeu?

Se não conseguir a adesão dos eleitores, Bivar deverá voltar a fazer o que mais gosta: passear de barco, jogar tênis e conviver com a família e os amigos. Ele aprecia embarcações com motores potentes, que o levem rapidamente de sua casa de praia em Jaboatão dos Guararapes a Fernando de Noronha e a outros pontos do litoral nordestino. “Barco bom é barco novo”, afirma, entusiasmado. Mesmo que não vista a faixa presidencial, ele já tem outras favoritas para exibir à única neta, Maria Luiza: a de campeão brasileiro pela segunda divisão, conquistada pelo Sport Club do Recife em 1990, e a de pentacampeão pernambucano, de 2000. Ao perder o hexa, em 2001, renunciou ao cargo. “Os torcedores foram muito ingratos”, lamenta. Hoje, de volta ao posto, Bivar não atua mais com tanta paixão na cartolagem. “Sou apenas uma rainha da Inglaterra: não mando nada”, diz.