Nos últimos dias, o apagão do petróleo já consumiu a Índia, a Austrália, a China, tirou o sono dos EUA, empurrou a uma greve de caminhoneiros na Espanha, gerou protestos na Coréia do Sul, bateu na porta da inflação brasileira, derreteu as bolsas globo afora e subiu ao grau de alerta máximo na avaliação de analistas. "Estamos todos em perigo", decretou uma rede de tevê americana na semana passada, ao registrar a escalada no preço do barril. A gigante dos automóveis GM planeja vender toda uma linha de fabricação e montagem de carros nos EUA, enquanto as liquidações dos chamados SUVs – jipões de alto luxo – entraram na ordem do dia no mercado americano. Os "beberrões" de diesel e gasolina estão com os dias contados, cotados a preço de banana. O banco de investimentos Goldman Sachs trabalha com a perspectiva do barril a US$ 200 até o ano que vem. Fábricas param e, em meio aos rigorosos invernos que estão por vir nos países nórdicos, muitos temem passar frio por falta do combustível da calefação. Na raiz desse novo colapso energético há fatores mais graves. O mundo já enfrentou dois grandes choques do petróleo no passado. Em cada um deles, a mão pesada do cartel da Opep, a organização de produtores, se fez sentir como a gerar uma espécie de crise fabricada. Desta vez não. Essencialmente, a escassez do produto, a ausência de um plano global de substituição efetiva – apesar das promessas do etanol brasileiro – e a pouca capacidade dos países do Oriente Médio, em constante conflito, de atender ao crescimento dos pedidos estão acelerando o problema. Por séculos a humanidade se acostumou a depender cada vez mais do petróleo, consagrado como o "ouro negro". Em cada uma das mais básicas necessidades cotidianas ele está presente: do plástico empreendido nos utensílios domésticos à sola do sapato escolar, do computador ao telefone e nas infinitas soluções modernas. Tirá-lo da condição de matéria-prima essencial não é tarefa fácil, mas o mundo está percebendo que terá de fazê-lo. No Brasil as conseqüências do novo choque ainda são brandas por conta de sua especial condição no experimento de substitutivos e, principalmente, devido à proximidade das eleições. Reajustes na boca das bombas de postos só deverão ocorrer no final do ano, logo após os votos chegarem às urnas. Mas a ameaça está à espreita e é bom se preparar.