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As más notícias sobre a economia americana parecem não ter fim e têm deixado as Bolsas com os nervos à flor da pele. Na semana passada, o Citibank anunciou o prejuízo recorde de US$ 9,8 bilhões no último trimestre do ano passado. E reconheceu perdas de US$ 18 bilhões em suas operações no mercado imobiliário. O banco de investimento Merrill Lynch não ficou atrás, com prejuízos de US$ 9,8 bilhões, também no último trimestre, e registrou uma baixa contábil de US$ 11 bilhões. Nos cálculos do Federal Reserve (o banco central americano), os prejuízos do sistema bancário com o mercado de subprime – hipotecas de alto risco – já atingiram US$ 100 bilhões, mas devem se aproximar de US$ 500 bilhões. Os fatos negativos não param por aí. Os Estados Unidos tiveram, em 2007, o pior ano de vendas de varejo, desde 2002, com uma evolução de apenas 4,2%. Enquanto a economia dá sinais de fraqueza e, quem sabe, de recessão, a inflação só sobe. Para uma previsão de crescimento do PIB pouco acima de 1% no ano passado, o índice de preços por atacado fechou em alta de 6,3%, o maior dos últimos 25 anos. Tio Sam está doente.

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RECESSÃO À VISTA
Na Broadway, ironicamente, encena-se a peça Os miseráveis. No Citi, o prejuízo é o maior da história. E na indústria automobilística as marcas americanas perdem espaço para as rivais

O presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, se esforça para não entregar os pontos. E diz não esperar uma recessão neste ano, mas apenas um crescimento mais lento. Pelo sim, pelo não, na quinta-feira 17, Bernanke anunciou, no Comitê Orçamentário da Câmara dos Deputados, em Washington, a elaboração de um pacote de estímulo econômico, com corte de impostos e redução de juros. "Qualquer pacote de incentivo fiscal tem que ser implementado rapidamente, pois se vier tarde demais não vai dar sustentação à atividade econômica", disse Bernanke. "E pode ter efeito desestabilizador se vier em um momento em que o crescimento já melhorou." As palavras de Bernanke quase caíram no vazio. No mesmo momento em que ele falava no Congresso divulgou-se recuo de 14% na construção de casas novas em dezembro de 2007, com impacto negativo na venda de material de construção. Outro dado empanou de vez a visão de Bernanke: a atividade industrial no Meio-Atlântico dos Estados Unidos, medido pelo FED da Filadélfia, caiu para – 20,9%. Resultado: a Bolsa de Nova York caiu mais 200 pontos.

A crise americana, pelo jeito, veio para ficar. Já há indícios de estagflação, uma mistura da estagnação e inflação. Discute-se agora sua profundidade e seu impacto na economia mundial. Mais especificamente, o que está reservado para o Brasil. Os economistas americanos têm certeza de que o resto do mundo não sairá incólume. Michael Pettis, professor de finanças na Universidade de Pequim, garante que a crise terá impacto sobre a China e depois contaminará os outros países em desenvolvimento, por meio da queda nos preços das commodities. E adverte que, ao contrário do que se pensa, a dependência em relação aos EUA aumentou. As importações americanas, segundo ele, representavam 3,7% do PIB mundial; hoje chegam a 4%. Na Bolsa de Valores de São Paulo, o pessimismo também se instalou. Depois de três pregões em baixa, o índice Bovespa acumulava perdas de 8,28% na quinta-feira, batendo no nível mais baixo desde 20 de setembro. Felizmente, as autoridades brasileiras não acreditam em cenário tão sombrio. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, põem suas fichas numa palavra valiosa nos últimos dias: descolamento.

Meirelles mantém a previsão de que o PIB brasileiro vai crescer entre 4,5% e 5%, embalado pelo mercado interno. Admite que se deve ficar atento às relações comerciais com os Estados Unidos, mas ressalta que o País está menos dependente e, por isso, poderá ser menos afetado do que outras nações. "O Brasil está bem preparado no que diz respeito aos fundamentos econômicos", sustenta o presidente do BC. O ministro Mantega antecipou em três dias o fim de suas férias e se apresentou em sintonia fina com Meirelles. Segundo ele, o presidente Lula pediu que a equipe econômica fique vigilante quanto aos movimentos da economia americana e, se necessário, adote medidas de emergência. "Por enquanto, não vejo necessidade, porque a economia brasileira está bem posicionada perante a crise." Na verdade, Meirelles e Mantega acreditam que a desaceleração da economia americana não será tão forte.

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Este é o prejuízo do sistema bancário com a crise das hipotecas de alto risco

E confiam na eficácia do pacote fiscal e monetário de Bernanke. O economista Octávio de Barros, diretor do Bradesco, também defende a tese do descolamento e afirma que não se pode subestimar a capacidade de recuperação da economia americana, pois os EUA sempre demonstraram potencial para lidar com crises e sair delas. "Eles têm tudo para se recuperar rapidamente já no segundo semestre. O dólar, nos últimos cinco anos, já caiu 54,8% em relação ao euro. É o bastante", diz. Na verdade, o mundo todo torce pela rápida recuperação de Tio Sam. Afinal, os americanos ainda respondem por 25% do PIB mundial.