5 motivos para visitar Barra dos Remédios (CE), um encontro entre rio, mar e silêncio

Coluna: Flavia Vitorino

Flavia Vitorino é jornalista e turismóloga especialista em destinos e viagens de natureza. Diretora de conteúdo do aplicativo LYFX e agente de viagens pela GO Escape.

5 motivos para visitar Barra dos Remédios (CE), um encontro entre rio, mar e silêncio

Flavia Vitorino
Foto: Flavia Vitorino

A pouco mais de 60 km de Jericoacoara, quase na divisa com o estado do Piauí, encontrei uma das praias mais preservadas e silenciosas do litoral oeste do Ceará. A Barra dos Remédios fica no município de Barroquinha, e ainda escapa ao turismo de massa, em um ponto onde o Rio dos Remédios encontra o Atlântico e as dunas móveis formam desenhos que mudam a cada vento. Um lindo contraste do azul do mar com o ocre da caatinga que cria uma das paisagens mais singulares do Nordeste.

O acesso é fácil, mas o destino parece longe de qualquer pressa. Desde o aeroporto de Jericoacoara, a estrada segue por povoados pequenos, cercada de carnaúbas e lavouras, até que o cenário muda: o asfalto termina e surgem os primeiros montes de areia. O caminho dura em torno de duas horas, mas a sensação é de estar se afastando de tudo, como se a estrada ajudasse o olhar a se ajustar à paisagem.

Sem barracas de praia, letreiros ou quiosques, a vila é feita de pescadores, jangadas, e casas de taipa nas dunas. O pôr do sol é o espetáculo diário, totalmente sem filtro.

Entre as dunas e lagoas temporárias, Barra dos Remédios guarda o encontro raro entre o sertão e o mar. A caatinga avança até a beira d’água, os cactos dividem espaço com o mangue e o vento sopra do continente para o oceano, levando consigo um pouco da alma nordestina e uma ótima condição para quem curte kite surfe. Ali ainda se preserva o essencial: o som da natureza e o ritmo das marés.

1. Cruzar as dunas, deslizar no vento e assistir ao pôr do sol

Um passeio pelas dunas, seja a pé, de quadriciclo ou ainda remando pelo rio dos Remédios, é o primeiro convite a diminuir o ritmo. No caminho, as lagoas rasas formadas pelas chuvas viram espelhos de céu. Barra dos Remédios fica no extremo norte do Ceará, já quase na divisa com o Piauí, e é uma das últimas praias do estado antes que o litoral se transforme nas paisagens dos Lençóis Maranhenses. Essa localização cria um cenário raro: dunas que lembram o Maranhão, mas com a textura e a vegetação da caatinga costeira. No final da tarde, a cena se transforma: O pôr do sol sobre a foz do Rio dos Remédios é um dos mais belos do Ceará.

2. Visitar a Casa Daia e ouvir quem vive o lugar

Situada em uma fazenda de mais de 200 hectares que margeia dunas, manguezais e a caatinga costeira de Barra dos Remédios, a Casa Daia conta com apenas sete acomodações: três suítes na casa principal e quatro bangalôs modulares construídos em madeira, todos erguidos com mínima intervenção no terreno e em diálogo direto com a paisagem. O projeto arquitetônico privilegia materiais locais, janelas amplas que enquadram o horizonte e um ritmo de hospedagem que respeita o tempo do lugar.

A decoração segue o mesmo princípio: tons terrosos, cerâmicas artesanais, fibras naturais e peças que evocam o cenário da caatinga, traduzindo o espírito do bioma em textura e cor. Na cozinha, o chef Fábio Vieira comanda uma proposta autoral: ingredientes frescos da pesca artesanal, mariscos locais e vegetais da agrofloresta e do apiário do sítio são tratados com leveza e técnica, transformando cada refeição em uma experiência silenciosa e memorável. Ali, todos os colaboradores são moradores da comunidade local, reforçando o vínculo entre hospitalidade, cultura e território.

3. Acompanhar o retorno dos pescadores: o verdadeiro amanhecer da vila

A vila desperta quando o mar devolve seus pescadores. Por volta das sete da manhã, o horizonte se movimenta com dezenas de jangadas coloridas que surgem ao longe, voltando da pescaria noturna. Aos poucos, elas encostam na margem do rio, e o silêncio do amanhecer dá lugar ao burburinho das vozes e risadas.

Os homens carregam os peixes frescos: pargo, serra, robalo e cioba, que logo serão distribuídos entre as vilas vizinhas. É um ritual antigo e coletivo: enquanto uns desembarcam o pescado, outros organizam as redes, lavam as embarcações e preparam o barco para o próximo ciclo de maré. A cena é cotidiana, mas carrega a beleza de um coreografia espontânea, feita de gestos herdados e de olhares cúmplices.

4. Ver o sertão encostar no mar

Poucos lugares no Brasil revelam de forma tão clara o encontro entre biomas quanto Barra dos Remédios. A paisagem muda a cada curva: o verde-escuro do mangue dá lugar às areias brancas das dunas, que por sua vez se dissolvem na vegetação seca da caatinga costeira. Em um mesmo campo de visão é possível ver cactos, carnaúbas e o Atlântico, um contraste quase improvável, mas harmonioso.

Ao longo das trilhas de areia fofa (que podem ser feitas à pé ou de bike), atravessamos pequenas áreas de restinga. marisqueiros e falésias baixas que se erguem sobre o mar.

5. Ventos constantes e águas rasas: o cenário ideal para o kitesurf

Bem vindo à um dos mais novos pontos do mapa do kitesurf no Nordeste. Os ventos alísios que sopram de julho a janeiro chegam fortes e constantes, formando correntes ideais para quem busca navegar longe das praias cheias de Jericoacoara. Com águas rasas, largas faixas de areia e uma foz protegida, o Rio dos Remédios oferece um terreno perfeito tanto para iniciantes quanto para quem já tem experiência.

O curioso é que os instrutores são moradores da própria vila, pescadores e jovens que aprenderam a dominar o vento observando os primeiros praticantes que passaram por ali. Sem escolas formais, a transmissão de conhecimento acontece de modo direto e empírico, uma mistura de tradição e intuição. Hoje, eles mesmos conduzem as aulas e passeios pelo rio, adaptando o esporte ao ritmo da comunidade.