A caravela seguia de velas enfunadas. O humorista Millôr Fernandes até estava em Portugal em uma festa diplomática quando o cantor e futuro menestrel Juca Chaves o aconselhou a dar uma olhada na revista que se sustentava com a seção “Pif Paf” e que, por sua vez, o sustentava, O Cruzeiro. Assim, além-mar, e de supetão, ficou sabendo que havia sido demitido através de um editorial nada singelo no qual estava escrito, “confiamos (na seriedade intelectual de Millôr) e erramos”. O motivo tinha sido a publicação de A verdadeira história do paraíso, considerada insultuosa. De volta ao Brasil, durante um almoço de desagravo no ipanemense Bar Vinte, o humorista foi intimado pelos presentes a lançar uma publicação sua. E que presentes! De Glauber Rocha a Fernanda Montenegro, de Otto Lara Resende a Paulo Francis, de Tom Jobim a Nara Leão, passando por Sérgio Porto, Sérgio Ricardo, Giani Ratto, Jaguar, Ziraldo, Mario Pedrosa e até o editor da Seleções do Reader`s Digest, Tito Leite, todos queriam Millôr nas bancas. E ele não se fez de rogado.

Há quatro décadas, no dia 4 de maio de 1964, o tablóide Pif Paf era lançado “direto do produtor ao consumidor”. Quinzenal, durou oito números. Pif Paf – quarenta anos depois (Argumento, oito jornais, R$ 80) é a reunião fac-similar dessas edições, hoje preciosas, introduzidas por textos de Janio de Freitas, Claudius, Ziraldo e do próprio Millôr. O projeto gráfico, uma expressão que ainda não tinha sido inventada, pertenceu a Eugênio Hirsch, a publicação foi editada por Ziraldo e, como era de esperar, contava com a participação da maioria dos convidados do famoso almoço. O modelo seria o seguido pelo O Pasquim, cinco anos depois.

A “gloriosa”, como ficou conhecido o golpe de 1964 autodenominado revolução, havia se instaurado há pouco mais de um mês, tornando o Pif Paf a primeira iniciativa editorial de resistência. Sérgio Porto com seu alter ego, Stanislaw Ponte Preta, e Millôr Fernandes, com Vão Gôgo, não davam moleza. No primeiro número este estabeleceu como mandamento uma pérola até hoje citada: “Todo homem tem o sagrado direito de torcer pelo Vasco na arquibancada do Flamengo.” Não é à toa que se descrevia como alguém cuja ambição máxima era divagar. “Divagar e sempre”, frisou. No número oito, sem saber que era o derradeiro, disse que o País corria o risco de cair em uma democracia. Não teve perigo. Foi fechado. O número derradeiro trazia uma briga nos bastidores do concurso Miss Alvorada entre as candidatas Castelinha e Carlotinha, nada menos que o general Castello Branco, então presidente, e Carlos Lacerda, governador. Não há ditadura que aguente uma dessa. Mas tudo bem. Ela se foi e Pif Paf está aí. Ri Millôr quem ri por último.