Nunca houve uma mulher como Cecilia no Palácio do Eliseu, sede do governo francês. Independente, ela jamais se entusiasmou com a função de primeira-dama. “Isso não importa. Não sou politicamente correta, danço de jeans, de lona e botas mexicanas. Não uso moule”, afirmou antes de Nicolas Sarkozy assumir a Presidência. Para quem nem sequer se dispôs a sair de casa para votar no marido no segundo turno das eleições, a idéia do título a “entediava mortalmente”. Agora ela está livre de qualquer obrigação como mulher do presidente. Na quinta-feira 18, Nicolas, 52 anos, e Cecilia Sarkozy, 49, anunciaram a separação após 11 anos de casamento, encerrando semanas de especulação na imprensa européia. O pedido de divórcio já foi formalizado perante um juiz.

Eleito há cinco meses com um discurso liberalizante, inspirado em nações como Estados Unidos e Inglaterra, o presidente está sob pressão. Na mesma quinta-feira do anúncio da separação, ele enfrentou a maior greve dos transportes públicos na França em 12 anos em protesto contra a reforma previdenciária proposta por seu governo. Mas pelo menos num campo a França conseguiu igualar-se a ingleses e americanos: o interesse da mídia pela vida pessoal do presidente.

A crise conjugal de Nicolas e Cecilia foi acompanhada como uma novela pela imprensa francesa. O divórcio foi o capítulo de maior audiência até agora, mas o público aguarda ansiosamente novos desdobramentos. Qual o motivo da separação? Quem aparecerá com outra pessoa primeiro? Uma diferença e tanto em relação à época de François Mitterrand, que escondeu amante e filha até sua morte, em 1996. O caso não era exatamente um segredo, mas a imprensa francesa optou por nunca publicá-lo.

Parte da fascinação da opinião pública com o assunto deve-se à própria história do relacionamento e à postura aberta de Sarkozy. “Ele acendeu a luz verde para a imprensa falar de sua família”, diz o jornalista Axel Gylden, da revista L’Express. Sarkozy nunca se furtou a expor os filhos, que participaram da campanha, e a mulher. Cecilia atuava nos bastidores e tinha forte influência sobre o marido. Foi sua conselheira na época em que ele era deputado e também quando foi ministro do Interior e das Finanças. “Trabalhar juntos é uma escolha de vida que fizemos, a política é tão violenta que a dois fica melhor”, dizia ela. “Cecilia é minha força e meu calcanhar-de-aquiles”, definia ele.

Ex-modelo, Cecilia Maria Sara Isabel Cuganer-Albeniz é filha de um pianista de origem russa e de uma espanhola. Estudou direito e trabalhou no Parlamento francês. Em 1984, aos 27 anos, uniu-se a Jacques Martin, um apresentador de programas dominicais de tevê, 24 anos mais velho, no elegante subúrbio parisiense de Neuilly. Quem celebrou a cerimônia foi o então administrador regional, Nicolas Sarkozy, um ambicioso político filho de imigrantes húngaros. Poucos anos depois os dois se reencontraram e iniciaram um romance. Terminaram com os respectivos cônjuges, casaram-se formalmente em 1996 e tiveram um filho, Louis, dez anos. Cada um tem dois filhos da união anterior.

“Ele é o primeiro presidente francês nascido no pós-guerra, é uma nova geração com uma família dos dias atuais”, diz Estevão Martins, professor de história contemporânea européia da Universidade de Brasília (UnB). “Cecilia sempre foi muito independente, não tem nada a ver com as mulheres de outros chefes de Estado da França.” Em 2005, o casal separou-se por alguns meses. Cecilia foi flagrada em Nova York com o publicitário Richard Attias. As fotos foram publicadas na revista Paris Match, um furo de reportagem que custou a cabeça do editor chefe. Hoje, com o claro interesse do público sobre sua vida amorosa, talvez seja mais difícil para o presidente barrar notícias na Europa. Na época, Sarkozy chegou a reconhecer na tevê que eles passavam por “dificuldades”. Em meados do ano passado, os dois se reconciliaram numa viagem pela Guiana Francesa, mas a lua-de-mel durou pouco.

Ela se manteve distante na campanha e depois que ele ganhou as eleições, em maio, foi vista apenas três vezes ao lado do presidente em compromissos oficiais, a última vez em 14 de julho, Dia da Bastilha. O fato lhe valeu o apelido de “mulher invisível” pela imprensa. Se seu objetivo era passar despercebida, o efeito foi inverso. Cada ausência repercutia ainda mais nos jornais.

Em agosto, ela quase protagonizou um incidente diplomático. Os Sarkozy passavam férias nos Estados Unidos e foram convidados pelo casal presidencial George e Laura Bush para um piquenique. Cecilia não foi, alegando dor de garganta, mas no dia seguinte foi vista fazendo compras com amigas. Recentemente, se envolveu em outra polêmica internacional. Como emissária de Sarkozy convenceu o ditador líbio Muammar Khadaffi a libertar enfermeiras búlgaras presas no país. A imprensa francesa especula se há algum contrato militar milionário por trás e o Partido Socialista, de oposição, acaba de instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o caso. Mesmo longe da Presidência, Cecilia dificilmente se livrará dos holofotes.