Há algo de novo na atual geração de governadores do País. E não é exatamente a idade média, abaixo dos 50 anos. Ao conquistar pela segunda vez o governo do Amazonas, por exemplo, o engenheiro eletricista Eduardo Braga, 46 anos, deixou para trás dois grupos radicais que se digladiavam quanto à forma de convivência com a Floresta Amazônica. De um lado, ambientalistas que insistiam em manter a floresta intocada. De outro, os que chegavam a distribuir motosserras para as populações ribeirinhas. Encontrando a racionalidade no meio-termo, Braga estabeleceu uma forma de conciliar as tecnologias mais modernas das indústrias que abriga na Zona Franca de Manaus ao discurso do desenvolvimento sustentável da exploração da floresta. Com isso, vem agregando valor e conferindo mais eficiência a essas atividades extrativistas. É um exemplo do que parece haver de novo e comum na atual geração de governadores: no lugar das disputas ideológicas e partidárias mais radicais do passado, uma atuação mais pragmática, que visa a obter maior eficiência administrativa.

“Acho que a boa relação que hoje existe entre os governadores dessa nova geração, independentemente da sua coloração partidária, pode começar a marcar o início de um novo tempo na política, que fuja dessa polarização danosa que existe hoje, que põe o PT de um lado e o PSDB do outro”, resume o governador de Minas Gerais, o economista tucano de 46 anos Aécio Neves. Quando foi conhecer a política de segurança pública da Colômbia, Aécio levou consigo o democrata José Roberto Arruda, do Distrito Federal, e o peemedebista Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro. Já Cabral, ao mesmo tempo que defende com unhas e dentes o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Rio, conversa em média duas vezes por semana com o governador tucano de São Paulo, José Serra, um dos mais ferrenhos opositores de Lula, para implantar projetos comuns, como o trem-bala que ligará as capitais dos dois Estados. Uma freqüência igualmente intensa marca os telefonemas do petista Marcelo Déda, de Sergipe, com Aécio. Ou de Aécio com o socialista Eduardo Campos, de Pernambuco. Este último, aliás, é neto e herdeiro político do ex-governador Miguel Arraes, mas em nada lembra os métodos do avô, um típico “coronel da esquerda”. Também o petista Binho Marques, do Acre, e o peemedebista Eduardo Braga, do Amazonas, podem ser considerados parte desse time de políticos inovadores. “Esta é uma geração que se pretende mais pragmática quanto a essa questão da mera disputa política e ideológica”, resume o governador do Rio, Sérgio Cabral. “O que nós queremos é alcançar maior eficiência no serviço público. Trabalhar para colocar a máquina pública, tanto a estadual como a federal, a serviço da população. Para conseguir isso, não vale a pena se perder em disputas políticas com adversários”, completa.

As características comuns da nova geração de governadores repetem-se em todas as regiões. No Amazonas, Eduardo Braga tem obtido sucesso incorporando tecnologias mais modernas na extração dos produtos da floresta, como açaí, guaraná e borracha. É o que o governador chama de “Zona Franca Verde”. As empresas instaladas na Zona Franca são estimuladas, com incentivos fiscais, a investir com tecnologia nas atividades de extração na floresta. Com isso, Braga já conseguiu, por exemplo, industrializar a exploração de açaí na região do médio Solimões. Estabeleceu também uma parceria com a Ambev para extrair o guaraná, matéria-prima do principal refrigerante da companhia de bebidas. Braga não aceita que a defesa do discurso da preservação da Amazônia signifique manter a floresta absolutamente intocada, sem possibilidade de aproveitamento econômico. Assim, ele defende, por exemplo, que as reservas indígenas possam receber visitação turística, e que os próprios índios possam lucrar com a sua exploração, como acontece nos Estados Unidos e no México. “O índio é dono da terra para quê? Para morrer de fome?”, questiona. Embora não se atreva a pregar a construção de um cassino na selva dos índios tucanos, Braga lembra que Las Vegas, por exemplo, a meca americana da jogatina, fica dentro de uma reserva indígena.

Nas últimas semanas, um tema tem marcado as conversas de vários desses governadores: a forma como vêm se institucionalizando, como coisa normal, as práticas fisiológicas do toma-lá-dá-cá, a troca de votos favoráveis ao governo por cargos e emendas orçamentárias. Alguns governadores chegaram a imaginar a hipótese de formalizar alguma proposta de lei que, com o seu patrocínio, pudesse ser inserida no bojo da reforma política. Desistiram em seguida por não conseguirem alcançar consenso suficiente para elaborar um texto. De qualquer modo, o tema continua sendo discutido, e o espaço para o debate entre os governadores se manteve. Segundo Marcelo Déda, o advogado de 47 anos que governa Sergipe, há um grupo grande de governadores que esteve ao mesmo tempo no Congresso Nacional. E que trouxe de lá relações de amizade. “A Câmara sempre teve a tradição de ter uma turma que conversava independentemente de seus partidos. Muita coisa importante saía dessas conversas, porque elas aconteciam acima dos meros interesses partidários”, explica Déda. “Com a conflagração do ambiente político no Congresso hoje, esse espaço de certa forma se transfere para os governadores.” É, avalia Déda, um “lubrificante para ajudar a desobstruir as coisas”.