Na terça-feira 23, o relator da CPI do Apagão Aéreo no Senado, Demóstenes Torres (DEM-GO), vai divulgar seu relatório final. Nos últimos dias, os técnicos da CPI cruzaram as quebras de sigilos bancários de alguns personagens acusados de corrupção com o conteúdo dos depoimentos e as investigações em curso nos órgãos públicos. Ao contrário do relatório chapa-branca produzido pelo deputado petista Marco Maia (RS) na CPI que a Câmara dos Deputados fez sobre o mesmo tema, o relatório produzido pelo Senado é duro. Resultado: foram pedidos 23 indiciamentos na Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero) e na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A parcela mais gorda do relatório é mesmo sobre a corrupção endêmica dentro da estatal Infraero. A investigação produzida pela CPI no Senado reafirma tudo o que ISTOÉ vem denunciando desde março deste ano. Comprova o que a empresária Silvia Pfeiffer disse numa entrevista para a edição 1956 da revista, em abril. Mais da metade dos indiciados foi personagem das reportagens veiculadas pela revista, que abriram a caixapreta da Infraero.

O relatório final da CPI do Senado passeia com desenvoltura pelos artigos do Código Penal que relacionam os crimes que se referem à administração pública: lavagem de dinheiro, corrupção, improbidade administrativa, licitação dirigida, superfaturamento. As empresas com as quais a Infraero deveria manter relações de interesse público, diz o relatório, “apropriaram-se da estatal”. O relator assim descreve a situação: “A apropriação do público pelo privado é tão endêmica na Infraero que, independentemente de quem esteja ocupando cargos na direção da empresa, continua sendo o interesse dos empreiteiros o guia para a definição de prioridades nas obras e serviços.” A despeito de melhorar o atendimento ao público nos aeroportos, a Infraero só conseguiu produzir rombos milionários. Os vôos continuam atrasados e as pistas de aeroportos como Congonhas continuaram perigosas. Mas, segundo o relatório, as obras em Congonhas tiveram um superfaturamento de R$ 12 milhões. No Santos Dumont, no Rio, o desvio foi bem maior: R$ 41 milhões. Em Salvador, R$ 28,4 milhões, e no Macapá, R$ 52 milhões. No Aeroporto de Guarulhos, impressionantes R$ 254 milhões de desvio e superfaturamento.

O relatório aponta com todas as letras os nomes dos responsáveis. O deputado Carlos Wilson Rocha de Queirós Campos (PT-PE), expresidente da Infraero, encabeça a lista. Na gestão Carlos Wilson, foram publicados vários editais de licitação de obras em aeroportos, questionados pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Contas da União por favorecer determinados grupos empresariais, retirando o caráter competitivo das concorrências. O volume é astronômico: R$ 3 bilhões em obras licitadas, com vários tipos de irregularidades nos contratos. Foi também na gestão de Carlos Wilson que foi assinado o contrato com a empresa FS3 Comunicação, da dupla Ettore Casória e Michel Farah, ambos na lista de indiciamentos. A CPI concluiu que só no contrato com a FS3 houve superfaturamento de R$ 17 milhões. O contrato todo era de R$ 26 milhões. Braço direito de Carlos Wilson, a ex-diretora de Engenharia Eleuza Terezinha Lores patrocinou e intermediou interesse privado junto à Infraero. No capítulo sobre Eleuza, a CPI pede que a Polícia Federal faça um rastreamento dos recursos financeiros depositados pela Infraero nas contas das empreiteiras.

Na lista de empreiteiras que serão investigadas a pedido da CPI estão gigantes como Camargo Corrêa, OAS, Via Engenharia, Norberto Odebrecht, Mendes Junior, Queiroz Galvão e a Gautama, de Zuleido Veras. A principal acusadora das fraudes na Infraero, a empresária paranaense Silvia Pfeiffer, considera que o resultado da CPI no Senado, que comprova tudo o que ela dissera à ISTOÉ, é uma forma de resgatar a verdade. “A CPI teve a felicidade de ter um relator sério, o Demóstenes Torres”, diz ela. O ex-sócio que ela acusa de roubar sua empresa, Carlos Alberto Carvalho, também está na lista de indiciamentos.

Se é muito exato quanto às irregularidades nos contratos da Infraero, o relatório da CPI não é tão conclusivo quanto aos problemas envolvendo o acidente do avião da TAM. Prudente, a CPI recomenda o término das investigações da Aeronáutica. Diante dos documentos e dos depoimentos, o relator diz que não é possível ainda concluir se a principal causa foi o estado da pista de Congonhas, falha humana ou técnica. De resto, o relatório mostra o caos administrativo em que se transformou a Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac. A ex-diretora Denise Abreu foi indiciada por falsidade ideológica, fraude processual e improbidade administrativa. O relator Demóstenes Torres sofreu muita pressão para não indiciar Denise e Carlos Wilson. Denise foi auxiliar do ex-ministro José Dirceu e Carlos Wilson foi escolhido a dedo pelo presidente Lula.

OUTROS ACUSADOS
Denise Abreu, ex-diretora de Engenharia da Infraero, foi acusada de falsidade ideológica, fraude processual e improbidade. Além dela estão: Fernando Brendaglia, Adenauher Figueira Nunes, José Welington Moura, Tércio Ivan de Barros, Marco Antônio Marques de Oliveira, Roberto Spinelli Júnior, Josefina Valle Pinha, Márcia Gonçalves Chaves, Mariângela Russo, Maria do Socorro Sobreira Dias, Érica Silvestri Duttweiler, Ettore Ferdinando Casória, Michel Farah, Carlos Alberto Carvalho, Mário de Ururahy Macedo Neto, Hildebrandina Macedo, Luiz Gustavo da Silva Schild, Aristeu Chaves Filho, Eurico José Bernardo Loyo e Paulo Roberto Gomes de Araújo.