A edição da Revista ISTOÉ da semana passada trouxe como matéria de capa uma denúncia de teor contundente que envolve o ex-ministro da Saúde José Serra com a máfia das ambulâncias – o escabroso esquema de desvio de dinheiro público que sangrou os cofres da União em mais de R$ 110 milhões. A denúncia era feita pelos empresários Darci e Luiz Antônio Vedoin (pai e filho), os mesmos que nortearam todas as investigações e acusações da CPI dos Sanguessugas, da Polícia Federal e do Ministério Público. A Revista chegou às bancas quase ao mesmo tempo que uma operação de busca e apreensão era deflagrada pela PF e flagrava dois personagens que, em nome do Partido dos Trabalhadores, negociavam um tosco dossiê, com provas vagas – entre as quais fotografias de inauguração, CD-ROMs vazios e vídeo – em que o ex-ministro Serra aparecia com supostos envolvidos na Máfia dos Sanguessugas. A coincidência de temas (Serra e os Sanguessugas) e de datas da chegada da Revista às bancas e da operação policial levou setores e pessoas a fazerem ilações irresponsáveis e indevidas de uma aliança espúria que ligaria a reportagem de ISTOÉ com a negociata de um dossiê fajuto.

Dadas as distorções que marcaram o assunto nos últimos dias, cabe informar a você, leitor, que ISTOÉ não participou de esquemas, tramas urdidas com fins eleitoreiros ou acordo de qualquer natureza. Nem fez “sociedade” com partidos políticos para pagar pela reportagem publicada, como chegou a ser divulgado. Ninguém esteve autorizado a negociar qualquer material em nome de ISTOÉ e se negociações paralelas envolvendo dinheiro ocorreram não foram com o aval da Revista. A equipe de ISTOÉ restringiu-se a avaliar o valor jornalístico das declarações feitas pelos empresários Vedoin. Em nota, o Editor e Diretor responsável da Editora Três, Domingo Alzugaray, apontou que a Revista “não compra e nem nunca comprou dossiês ou entrevistas”.

ISTOÉ praticou neste caso – como sempre vem praticando nos seus 30 anos, completados justamente em 2006 – jornalismo de primeira grandeza. A reportagem à qual você, leitor, teve acesso na edição passada foi fruto de uma cuidadosa apuração, dentro dos mais genuínos valores da informação, trazida por dois profissionais que, em várias ocasiões, demonstraram a qualidade do seu trabalho nas páginas de ISTOÉ e ajudaram a construir parte do prestígio que a Revista carrega até hoje. Mário Simas Filho, redator-chefe, e Biô Barreira, editor de fotografia, saíram na pista de uma fonte para chegar aos Vedoin e conseguiram deles uma entrevista que lança luzes sobre operações ainda obscuras no Ministério da Saúde à época da gestão Serra.

Naturalmente, como ocorreu em diversas ocasiões no passado, adversários do trabalho editorial de ISTOÉ animaram-se numa primeira hora com a idéia de tentar denegrir a imagem da Revista, misturando fatos e buscando fazer parecer tudo a mesma coisa. O intuito claro é de conseguir calar a Revista. Cabe a questão: por que ISTOÉ incomoda tanto? Você, leitor, mais do que ninguém, pode avaliar as razões – e deve estar certo de que nenhuma pressão vai conseguir desviar seus profissionais da prática cotidiana de um jornalismo maiúsculo, com o objetivo primordial de melhor informá-lo.

Para a completa compreensão do episódio cabe aqui reavivar as circunstâncias em que se desenvolveu a reportagem. Na quinta-feira 7, ISTOÉ foi procurada por um senhor que se apresentava pelo nome de Hamilton e que perguntou do interesse da Revista numa entrevista com os Vedoin. Dada a condição dos Vedoin de protagonistas do Caso Sanguessugas, ISTOÉ mostrou interesse. A entrevista não foi “negociada” – definição que pode pressupor algum tipo de troca –, mas sim sugerida por Hamilton e aceita pela Revista. Também não ocorreu “oferta de dossiê”. Os documentos divulgados na reportagem (cheques, depósitos bancários e a liberação das emendas para a compra de ambulâncias) foram entregues diretamente pelos Vedoin aos jornalistas e publicados por se tratar de papéis que corroboram a versão apresentada pelos entrevistados. Os referidos papéis foram encaminhados pelos advogados dos Vedoin e protocolados junto à Polícia Federal e ISTOÉ só se dispôs a publicá-los depois de confirmar esse protocolo. Vale a ressalva de que tais documentos nada têm a ver com o dossiê fajuto apreendido num hotel paulista com os emissários petistas Gedimar Pereira Passos e Valdebran Padilha, nomes dos quais a ISTOÉ só passou a ter conhecimento após a detenção dos mesmos.

Outra confusão lançada sobre a reportagem diz respeito ao ritmo da apuração e seu fechamento. A entrevista com os Vedoin foi realizada na quarta-feira 13, na casa deles em Cuiabá – e não “entre os dias 6 e 7” ou “duas semanas antes” como chegou a ser noticiado. Assim, 24 horas depois, já na noite da quinta-feira 14, a edição da Revista estava concluída e chegava às bancas ainda nas primeiras horas da sexta seguinte. As 11 da manhã daquele dia, ISTOÉ atingia dezenas de Estados, incluindo toda a praça de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Não ocorreu favorecimento algum de informação antecipada a candidatos ou partidos – e se, porventura, a edição foi usada em horário eleitoral gratuito, não é de responsabilidade da Revista. Qualquer leitor poderia se dirigir à banca mais
próxima e adquirir seu exemplar.

O que coube ao corpo editorial de ISTOÉ foi a decisão de publicar o teor das declarações dos Vedoin e tal decisão se deu em virtude da atuação que os
dois tiveram como pivôs da Máfia das Ambulâncias. Os depoimentos de ambos vinham sendo considerados pela Polícia Federal dentro do mecanismo da delação premiada e serviram também de base para que a CPI abrisse 67 processos de cassação de mandatos parlamentares na Câmara dos Deputados e outros três processos no Senado. Dois deputados, denunciados pelos Vedoin, já renunciaram
e várias candidaturas às próximas eleições estão sub judice nos tribunais eleitorais por constarem da lista desses empresários. Em outras palavras, o que disseram e vêm dizendo os Vedoin têm tido efeito direto no cenário político brasileiro e ISTOÉ não podia simplesmente desconsiderar as graves acusações que eles traziam por ocasião da entrevista. O ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage, diz que há mais provas contra Serra além da denúncia dos Vedoin. E observou: “Serra deve ter o mesmo tratamento que usaram para incriminar Humberto Costa”, outro ex-ministro da Saúde, que já está indiciado no inquérito da PF.

Curiosamente, o caso Serra foi poupado de apuração, abafado pelos eventos paralelos que redundaram no dossiê forjado. A Revista ISTOÉ entende que cabe à polícia e à CPI investigarem com profundidade a história do dossiê encontrado em mãos dos petistas, assim como acredita que as acusações lançadas contra o ex-ministro Serra pelos Vedoin precisam seguir os mesmos trâmites de apuração. Não devem cair no esquecimento. É vital para o processo democrático brasileiro, e também por uma questão de justiça, que as nebulosas operações dos Sanguessugas durante a gestão do ex-ministro Serra passem pelo crivo de averiguação das autoridades. Fazer diferente é colocar o ex-ministro numa condição especial, abrindo um perigoso precedente no caso dos Sanguessugas.

De sua parte, ISTOÉ segue adiante mostrando nesta edição quem são e quais os laços de envolvimento de alguns dos personagens trazidos à baila pelos Vedoin. Destaca-se nesse grupo o nome do empresário Abel Pereira, para quem foram lançados alguns dos cheques do Grupo Planam, dos Vedoin, e que possui estreito relacionamento com Barjas Negri, o braço direito de Serra à época de sua passagem pelo Ministério da Saúde. A reportagem sobre Abel Pereira, que começa à página 28 desta edição, segue o mesmo princípio de bem informar você, leitor, com responsabilidade, equilíbrio e contra qualquer tipo de pressão. A Revista imagina estar desta maneira contribuindo para o esclarecimento dos fatos, dentro de uma sociedade que preza a liberdade de informação. Tenha uma boa leitura.