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Conta a mitologia grega que a ave fênix renascia de suas próprias cinzas. Da Terra para o espaço, outra Phoenix renasce agora após 32 anos de projetos fracassados, lançada num vôo de 20 mil quilômetros por hora rumo ao horizonte vermelho de Marte. Após nove meses, essa sonda americana tornou-se notícia em todo o mundo na semana passada: venceu a atmosfera e o solo irregular marciano e, numa descida meticulosamente planejada, pousou nas regiões polares e desconhecidas desse planeta que freqüenta a imaginação ficcionista e as pesquisas científicas da humanidade em busca de vida extraterrestre. Baseado na Agência Espacial Americana (Nasa), em Washington, o comandante dessa viagem inacreditável é um brasileiro da cidade paulista de Guaratinguetá: o engenheiro Ramon de Paula.

Ele e sua equipe estavam ansiosos para saber como seria o pouso da sonda. Foram 15 minutos de silêncio, seguidos de um grito de comemoração. E também de alívio. Após abrir seus painéis solares, a sonda enviou um sinal de rádio que viajou 675 milhões de quilômetros. “A missão começou, queremos confirmar se existe água. Se existir água, calor e moléculas de carbono e de hidrogênio, então talvez haja vida”, escreveu à ISTOÉ, diretamente da Nasa, por meio de seu computador de mão, o chefe da missão Phoenix, justamente o brasileiro Ramon de Paula.

O pouso em Marte é tarefa arriscada e complicada. Desde que a Rússia lançou a primeira missão, em 1960, o índice de êxito de todas as sucessoras foi inferior a 50%. Em setembro de 1999, a nave Mars Climate Orbiter caiu em Marte por causa de um erro de navegação. Alguns meses depois, outra nave da Nasa, a Mars Polar Lander (MPL) foi perdida próximo ao pólo sul do planeta. Por esses motivos, a Phoenix representa a glória. E estabeleceu-se uma marca histórica: 20:53:33. Esse é o horário (de Brasília) em que ela nos mandou o seu primeiro sinal, já pousada. A missão custou US$ 450 milhões e a nave é totalmente original. Trata-se de um laboratório espacial que coletará amostras a serem colocadas sob dois tipos de microscópios e analisadas a distância pelos cientistas. Se antigamente o máximo que uma sonda podia fazer era registrar imagens das paisagens marcianas, agora será a primeira vez que os pesquisadores observarão a composição das rochas, do solo e até da poeira em imagens microscópicas. “Isso significa que nada passará por nós”, diz De Paula – e nesse momento ele interrompe a sua entrevista à ISTOÉ, bastante apreensivo, explicando que começara a detectar, em seu painel de controle numa sala da Nasa, uma violenta tempestade de areia em Marte. O tufão se aproximava da Phoenix. Estacionou. Ela ficou sã e salva, e o engenheiro brasileiro voltou a respirar aliviado.

A poderosa Phoenix percorrerá o solo desse inóspito planeta em regiões com 140 graus negativos e ativará seu braço robótico, equipado com uma espécie de furadeira, para perfurar o subsolo congelado e coletar amostras dos grãos do subsolo. Como um cientista autônomo, o braço da Phoenix colocará as amostras sobre placas de silício e elas serão analisadas por um microscópio óptico e por outro de força atômica, tudo para que não escape um único componente químico. Diversas experiências serão feitas dentro desse minilaboratório robótico (é a Phoenix comandando solitariamente a si mesma) até que, com o seu relatório “nas mãos”, a sonda enviará os resultados para a Nasa. Os cientistas anseiam por todas as respostas. Uma, no entanto, é particularmente especial: a que poderá indicar a existência de vida em Marte.

O brasileiro que tem Marte nas mãos
Nascido no interior de São Paulo, na cidade de Guaratinguetá, Ramon de Paula, 55 anos, sempre se interessou pela ciência e pelos mistérios do espaço. Ele tinha 17 anos quando seu pai foi nomeado pelo governo do Brasil para trabalhar nos EUA, na Comissão Aeronáutica Brasileira em Washington. Foi lá que De Paula concluiu o ensino médio e cursou a faculdade de eletrônica. Fez mestrado e doutorado. Conhecido por sua dedicação às pesquisas, em 1985 ingressou no Jet Propulsion Laboratory, um dos mais famosos centros de tecnologia que atuam em missões da Agência Espacial Americana (Nasa). Quatro anos mais tarde começou a trabalhar no quartel- general desse órgão e foi dos insucessos das missões a Marte que nasceu a sua primeira oportunidade: “A sonda Mars Polar Lander se perdeu em 1999. Por conta disso, a Nasa fez uma reavaliação completa do programa de Marte. Novas pessoas vieram trabalhar na área, e eu fui uma delas.” A competência e o incansável trabalho de pesquisa foram peças fundamentais em sua carreira. De Paula é executivo de duas missões espaciais, a Mars Reconnaissance Orbiter e Phoenix. Suas tarefas incluem o monitoramento e a solução de problemas que possam ocorrer durante o período em que as espaçonaves estão no planeta vermelho. Sobre a mais antiga dúvida dos homens, De Paula afirma: “Se estamos sozinhos no universo? Provavelmente, não.”

 

SUCESSO O brasileiro Ramon de Paula, chefe da missão
Phoenix e a primeira foto do pólo norte de Marte, enviada pela sonda