EDNILSON AGUIAR/SECOM-MT

FRONTEIRA AGRÍCOLA
Maggi quer aumentar infra-estrutura do Estado, como a estrada da Chapada dos Guimarães

Em 1969, a família Maggi, vinda do Paraná, desembarcou em Mato Grosso embalada pelo lema do regime militar para seus projetos de colonização do Brasil e expansão da fronteira agrícola: “Integrar para não entregar”. Partindo do princípio de que a região amazônica sempre seria vulnerável enquanto fosse inexplorada e desabitada, esses projetos levaram para lá pessoas do Sul do País, filhos de imigrantes europeus que tinham o germe da agricultura nas veias. Entre eles estava o descendente de italianos André Maggi, pai do atual governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, que chegaria a ser o maior plantador de soja do Brasil. “Viemos para cá de forma legal, incentivados pelo governo. Temos orgulho de sermos agricultores. Nossa contribuição para o mundo é a produção de alimentos”, diz Maggi. Ele entende que a realidade de Mato Grosso não é a mesma do que a do resto da Amazônia e, por isso, defende um tratamento diferenciado para seu Estado, quando se trata de preservação da floresta. “Os povos do Amazonas ou do Acre, como a ex-ministra Marina Silva, podem ter outra relação com a floresta, de manejo ecológico. Mas é impossível querer que pensemos da mesma forma, e isso precisa ser levado em conta”, diz Maggi.

Esse posicionamento fez com que Maggi se tornasse o grande vilão dos grupos ambientalistas, que o acusam de querer destruir a Floresta Amazônica para transformá- la em plantação de soja. A ONG Greenpeace, por exemplo, concedeu-lhe em 2007 o prêmio “Motosserra de Ouro”. O lance mais recente dessa batalha ocorreu há um mês, quando o governador contestou as informações do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) que apontam aumento do desmatamento na região amazônica, especialmente em Mato Grosso – e que deram origem à operação “Arco de Fogo” da PF contra desmatadores. Na semana passada, a pressão de Maggi provocou o adiamento do anúncio de novo levantamento do Inpe, que mostraria aumento do desmatamento. “Quando não são corretos, os dados do Inpe não prejudicam apenas o Mato Grosso, prejudicam o Brasil”, prega ele. O governo também deverá anunciar a redução da área protegida da Amazônia, deixando de fora o cerrado.

Há duas semanas, quando a senadora Marina Silva (PT-AC) deixou o Ministério do Meio Ambiente, Maggi voltou a ser alvo dos ambientalistas. Entre outras razões, a ministra atribuiu seu pedido de demissão à vitória dos setores que defendem flexibilizações na questão ambiental. “Não ceda às pressões de Blairo Maggi”, disse ela na primeira conversa com seu sucessor, Carlos Minc. Por sua vez, antes mesmo de tomar posse, Minc bateu em Maggi. “Se pudesse, ele plantava soja nos Andes”, provocou.

O governador de Mato Grosso, porém, não se intimida. Ele alega defender uma política que integre a necessidade de preservação ambiental às necessidades econômicas do País, da região, e da população que ali vive. Mesmo adversários admitem que suas idéias devem ser consideradas. “Ele deve ser contido, mas precisa ser ouvido”, diz o presidente do PPS, Roberto Freire. Maggi, hoje no PR, foi eleito governador pelo PPS, mas rompeu no segundo turno das eleições de 2006, quando resolveu apoiar a reeleição de Lula. “Às vezes, o que ele sugere pode descambar para o capitalismo predatório, mas é também um absurdo continuar imaginando a Amazônia como um santuário intocável”, diz Freire.

Maggi aposta suas fichas num projeto de mapeamento das potencialidades das terras do Estado. Encontra-se em fase final de tramitação na Assembléia Legislativa o projeto de lei que estabelecerá o Zoneamento Socioeconômico Ecológico de Mato Grosso. Trata-se de um mapeamento completo da situação matogrossense, levando em conta o tipo de vegetação, a possibilidade de exploração e as necessidades sociais de cada região. A partir desse mapeamento, será possível, com conhecimento científico, dizer se determinada área é ideal para plantação de soja, criação de gado ou, simplesmente, para a exploração da floresta, com técnicas de manejo sustentável. Com base nesse zoneamento, o governo estabelecerá protocolos com os setores produtivos, com regras e metas estabelecidas de produtividade e preservação ambiental. Na sexta-feira 23, num encontro em Belém, Maggi entregou o piloto desse projeto ao presidente Lula.

“Chega de sermos considerados vilões”

O governador Blairo Maggi quer superar as diferenças com o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, que ele atribui a informações distorcidas de ONGs ambientalistas. Maggi prega um tratamento para o seu Estado que respeite as peculiaridades de Mato Grosso em comparação com outras regiões da Amazônia. Em outras palavras, sem hostilizar a produção agrícola. A seguir, trechos da entrevista concedida à ISTOÉ:

ISTOÉ – O sr. é o grande vilão ambiental?
Blairo Maggi – Eu sempre fui claro sobre a necessidade de uma relação entre os setores produtivos e as questões ambientais. Mas não se faz omelete sem quebrar os ovos. É preciso lembrar que existe uma legislação que permite a ocupação produtiva de até 20% das áreas de floresta.

ISTOÉ – Esse limite tem sido respeitado em Mato Grosso?
Maggi – O problema é que houve um hiato provocado por uma modificação na legislação feita por medida provisória. Antes, a possibilidade de ocupação da floresta era de 50%. Alguns agricultores imaginam que medida provisória é algo que pode ser modificado. Eu acho que é lei e precisa ser cumprida. Mas é preciso entender também que o Mato Grosso vive uma realidade diferente da de alguns outros Estados da Amazônia Legal.

"Não planto soja nos Andes porque o clima não permite"

ISTOÉ – Onde está a diferença?
Maggi – Em primeiro lugar, dois terços do Estado são cerrado. Não dá para tratar essa região da mesma forma como se trata a Floresta Amazônica. Além disso, temos uma população de agricultores que foi trazida para cá por programas governamentais. Eu sou tataraneto de agricultores e espero que meu filho seja agricultor também. Estamos falando de agricultores, como eu. Não tem sentido sermos tratados como vilões. Há tarefa mais bonita que produzir alimentos? Essa questão pode parecer menor numa terra de abundância como a nossa, porque não sentimos a miséria que existe na África ou no Haiti.

ISTOÉ – O sr. plantaria soja nos Andes, como disse o ministro Minc?
Maggi – Nos Andes não dá, porque o clima não permite. É claro que o ministro falou no sentido figurativo. Planto com muito orgulho soja no meu país. Mas, apesar dessa polêmica inicial, acredito que me darei muito bem com o ministro. Acho que ele não terá as dificuldades que tinha a ministra Marina para compreender as peculiaridades de Mato Grosso. Tenho certeza de que, quando ele tomar conhecimento, verá que o Mato Grosso respeita a legislação ambiental.