Quando passeava na praia de Copacabana na última manhã do ano passado, a jovem paulista Paola Bertuol, 23 anos, era uma mulher emocionalmente tranquila: nada de amores, namoros só na base do ficar, paixões nem pensar – na sua página na internet ela gostava de ver, no item do estado civil, a sua condição de solteira. Quando passeava na praia de Copacabana, Paola, técnica em turismo e moça da alta classe média, cruzou com Marcelo Alves Monteiro, 24 anos, flanelinha na vida real no Rio de Janeiro, dono de quiosques na vida de mentira que contava às mulheres. Conversaram, se entenderam, e daí para a frente Paola passou a chamá-lo de “meu eterno boy da sunga vermelha”. Também daí para a frente, Paola passou a sonhar em ver na sua página na internet a qualificação civil de casada – casada, é claro, com o “eterno boy da sunga vermelha”. Eles se viram seis vezes, um pouco em São Paulo, um pouco no Rio. Por algum motivo, se é que paixão tem motivo, a onda da paixão refluiu, o “eterno boy da sunga vermelha” deixou-lhe de ser eterno no departamento amoroso. E isso ela lhe disse na madrugada da segunda-feira 28, e isso ela lhe disse sob o mesmo teto do apartamento que ganhara
do pai na avenida Nossa Senhora de Copacabana, e isso ela lhe disse na cozinha do apartamento, e lhe disse próxima a uma faca de pão. Nove vezes a faca de pão golpeou o seu peito, e segundo a polícia o grande suspeito do assassinato é Marcelo. No apartamento a polícia achou três gramas de cocaína, os vizinhos só ouviram gritos, o zelador é a principal testemunha: diz que viu o boy da sunga vermelha saindo do prédio com as mãos igualmente vermelhas. Na sexta-feira 1º de abril, Marcelo Monteiro se apresentou à polícia, foi detido e alegou ter matado Paola em legítima defesa. No dia da mentira.

“Ele me pareceu uma pessoa sensata”
“O Marcelo me pareceu uma pessoa sensata, não tive má impressão dele. Conheci pessoas formadas que foram amigos da minha filha e essas pessoas não me pareceram boa gente. Quando ele foi barrado pelos vigias do prédio, respondeu apenas e calmamente que essas coisas acontecem”
Paolo Bertuol, pai de Paola

“Fora do nosso mundo”
“Marcelo foi a primeira pessoa por quem Paola se apaixonou, ele era sempre muito atencioso, educado e falava bem. Todo mundo achava o cara legal. Ele era muito pobre se comparado com as pessoas do nível de Paola. Fomos à sua casa no Rio de Janeiro, ele morava no centro, num casarão antigo, fora do nosso mundo. Ele também era possessivo, ciumento e não gostava de tirar fotos. Na véspera do crime eles discutiram”
Maurício Irineu, colega de faculdade de Paola

“Um ato psicótico”
“Paola vivia a heroína que por amor resgata um homem criado num mundo diferente do seu, num mundo socialmente e economicamente mais difícil. A intensidade e a dramaticidade de todos os tipos de diferenças são altamente estimulantes num relacionamento amoroso, mas podem ser a forma que uma das partes encontra para compensar carências ou imagem negativa de si mesmo. Isso se dá num plano inconsciente. O rapaz parece que identificava nela a figura da mãe sustentadora da vida, uma transferência doentia. O seu ato é psicótico, fora da realidade”
Nairo de Souza Vargas, chefe do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP