Nas grandes democracias do mundo, os debates entre os candidatos são o ponto mais alto das eleições presidenciais. O Brasil tinha tudo para seguir essas mesmas regras, mas a influência dos marqueteiros sobre os candidatos provocou uma distorção. Acredita-se, aqui, que o candidato que esteja liderando as pesquisas de intenção de votos só tem a perder se comparecer aos embates televisivos programados para as vésperas das eleições. Na quinta-feira 28, Lula não fugiu à regra. Às 19 horas, informou oficialmente que não compareceria ao embate com os demais candidatos e em nota oficial procurou justificar: “Sou um dos políticos que mais participaram de debates eleitorais neste país. No entanto, é fato público e notório o grau de virulência e desespero de alguns adversários, que estão deixando em segundo plano o debate de propostas e idéias para se dedicar, quase exclusivamente, aos ataques gratuitos e agressões pessoais.” Em outras palavras, o presidente Lula mandou dizer que não foi ao debate porque sabia de antemão que seria crucificado pelos demais e que a discussão sobre um projeto para o Brasil seria colocada em segundo plano diante de temas como mensalão e dossiê Vedoin, que abateram o PT no último ano. Apesar da óbvia constatação, a decisão de Lula em não ir ao debate não foi tomada às pressas. E o que mais pesou foi uma fria argumentação defendida pelo seu publicitário João Santana Filho. A tese foi matemática. Usando como base as regras anteriormente definidas, Santana constatou que se ausentando do debate Lula sofreria exatos um minuto e 40 segundos de ataques diretos dos seus adversários, sendo 40 segundos em cada um de três blocos nos quais os candidatos fariam perguntas uns aos outros. Se estivesse presente, segundo Santana, Lula seria atacado durante uma hora e meia. Por fim, o publicitário considerou que a ausência de Lula iria reduzir em até 40% a audiência do embate. A considerar a temperatura amena do debate, tudo indica que Lula pode ter acertado.

Enquanto Geraldo Alckmin (PSDB), Heloísa Helena (PSOL) e Cristovam Buarque (PDT) criticavam a ausência do presidente e lançavam ataques contra a corrupção, Lula participava de comício em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo. Ali, durante 20 minutos, ele fez seu último discurso desse primeiro turno da campanha política. Não citou seus adversários e não fez nenhum comentário sobre a mais recente crise que abate o PT. “Não poderia deixar de vir a esse comício por nada desse mundo”, disse o presidente. “Há uma pequena elite preconceituosa deste país que gostarioa de trocar de povo. Qualquer dia eles vão fazer um decreto anulando a parte pobre que vota”, bradou Lula.

No debate, o primeiro a disparar contra o petista foi Cristovam Buarque. Dirigindo-se à cadeira vazia onde deveria estar sentado presidente, perguntou sem muito entusiasmo: “O senhor é candidato sob forte suspeita de uso de recursos públicos e de outros recursos que ninguém sabe a origem. Isso é um caso muito grave. Se o senhor for eleito e se comprovarem todas as suspeitas, o senhor renunciaria ao cargo?” Mais eloqüente foi a senadora Heloísa Helena. Com as suas tradicionais camisa branca e calça jeans e o costumeiro tom agressivo, a candidata, olhando fixamente para a câmera, reportou-se à cadeira vazia: “Ele (Lula) tinha a obrigação de descer do seu trono de arrogância, de covardia política e estar aqui para responder ao povo brasileiro.” O tucano Geraldo Alckmin, que nas últimas semanas animou-se com a perspectiva de um eventual segundo turno, atacou educadamente: “Lula é fraco com o colarinho branco e forte com o jardineiro Francenildo”, uma alusão à quebra do sigilo bancário do caseiro que denunciou o ex-ministro Palocci.

Há um outro fato ocorrido no debate que poderá se traduzir a favor de Lula. De longe a mais incisiva era a candidata do PSOL. Ela, no entanto, não se limitou a enviar petardos na direção do petista e colocou no mesmo balaio de corrupção o PSDB, obrigando Alckmin a se explicar e a defender os oito anos de FHC. Com isso, as agressões a Lula acabaram diluídas. Sobre os projetos para o País, os candidatos presentes não avançaram nada em relação ao que vinham dizendo no horário eleitoral gratuito. A questão que fica no ar é se a ausência de Lula possibilitará ou não um segundo turno. Isso, só as urnas dirão.