ALAN RODRIGUES/AG. ISTOENo jazigo 39 do Cemitério da Vila Assunção, num bairro de classe média da cidade paulista de Santo André, repousa o corpo embalsamado de Celso Daniel, o prefeito petista brutalmente assassinado com 11 tiros, em 19 de janeiro de 2002. No túmulo, fora o retrato de um Celso sorrindo, apenas um tímido epitáfio pede aos deuses que aquela alma descanse em paz. Passados seis anos da morte do político, o mistério sobre a autoria e as razões do crime permanece. Ameaçados de morte, por não concordarem com a tese oficial da morte – de que o prefeito fora vítima de um crime comum –, dois dos quatro irmãos de Celso Daniel e suas famílias se refugiaram na Alemanha, Itália e França, em 2006. Na França, conseguiram o status de exilados, pois comprovaram que corriam risco de morte caso permanececem no Brasil. Um fato bastante justificável. Nos últimos seis anos, oito pessoas envolvidas com as investigações foram assassinadas em circunstâncias ainda não esclarecidas de forma convincente. Apesar do apoio obtido na Europa, os irmãos de Celso Daniel não pretendem sepultar a história. Mesmo do Exterior, pretendem pressionar as autoridades judiciais brasileiras para que a história não seja esquecida. Segundo a família, não existe disposição política no Brasil para pôr um ponto final nesse crime porque a morte de Celso Daniel seria um fantasma que assombra o governo Lula.

“Foi um furacão na nossa vida”, desabafa Marilena Nakano, cunhada do prefeito morto. Mulher de Bruno, o irmão mais novo da família Daniel, Marilena, o marido e os três filhos foram “obrigados” a trocar a vida confortável de classe média em Santo André pela solidariedade de uma família francesa com quem dividem a casa, na periferia de Paris. Desempregado, o casal, que trabalhava como professores universitários no Brasil, vive hoje de bicos na capital francesa. “Nós temos muita clareza das perseguições que sofremos, por isso não podemos voltar sem segurança”, disse, irritada, à ISTOÉ, Marilena. Do quarto andar do Palácio do Planalto, o chefe de gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho, reage: “O exílio foi uma opção pessoal. Eles têm segurança no Brasil.” Não foi assim que avaliou o Estado francês ao conceder o pedido de exílio.

ANDRÉ DUSEK/AG. ISTO

AMEAÇADOS João e Bruno (à dir.) convenceram os franceses de que no Brasil não têm segurança

O drama da família aprofundou-se em 2005, quando os irmãos de Celso Daniel descobriram um plano de uma quadrilha para assassiná-los. De posse de um dossiê sobre o caso e alegando ameaças contra suas vidas, Bruno, um ano depois, recorreu ao Estado francês com o pedido de asilo político. Deu certo. Eles se tornaram os únicos brasileiros reconhecidos pelo Ofício Francês de Proteção aos Refugiados e Apátridas (OFPRA) como exilados políticos. Já João Francisco, o irmão mais velho, resolveu raspar suas economias que apurou em anos no trabalho como oftalmologista e se escondeu na Itália. Como refugiados, eles vivem nas sombras. “É lastimável que brasileiros, em pleno regime democrático, tenham que viver no Exterior por não terem segurança em seu próprio País”, diz Roberto Wilder Filho, promotor que trabalha na investigação e que também discorda da versão oficial. Depois de ouvir 57 testemunhas, ele e outro promotor aguardam uma decisão do Supremo Tribunal Federal – que julgará se o Ministério Público paulista pode ou não realizar investigações – para finalizar o caso. Nos 60 volumes e mais de 12 mil páginas produzidos no processo, não há fatos que levem os promotores a aceitar a tese do crime comum. Para eles, o assassinato de Celso Daniel está relacionado com um esquema de arrecadação de propina na prefeitura para repassar dinheiro para o PT.