08/04/2016 - 19:00
No dia em que consolidou sua vitória nas primárias republicanas do estado americano de Wisconsin, o candidato Ted Cruz disse à plateia: “esta noite é um ponto de virada. Nós temos uma escolha, uma escolha real”. Se referia, claro, à sua batalha contra o empresário Donald Trump, que lidera a disputa que definirá o nome de oposição a concorrer à presidência dos Estados Unidos. Cruz estava otimista porque na terça-feira 5 venceu o rival por 13 pontos percentuais no estado e ganhou força numa eleição que até pouquíssimo tempo atrás parecia praticamente definida a favor de Trump, o polêmico aspirante à Casa Branca cujo discurso mistura populismo e radicalismo. “O sucesso de Trump será mais difícil depois de Wisconsin”, afirma Arnold Haiman, professor da Universidade George Washington. “Agora, pela primeira vez, sua força parece estar diminuindo.”
REAÇÃO
Acima, Ted Cruz comemora a vitória em Wisconsin na terça-feira 5.
Abaixo, Donald Trump, que está sendo atacado pelo próprio partido
Nos Estados Unidos, o voto popular confere delegados para cada um dos postulantes em 50 estados. No final, quem conseguir mais representantes ganha a corrida interna da legenda e lutará para suceder Barack Obama. Na terça, Cruz ficou com 36 delegados e Trump com apenas 6. O empresário ainda está 237 à frente, mas a estratégia do segundo colocado é evitar que ele forme a maioria mínima necessária. Nesse caso os representantes ficam desobrigados de votar respeitando as urnas, e Cruz leva vantagem porque a elite republicana está majoritariamente contra Trump. O plano é arriscado, pois uma pesquisa do site Vox constatou que 55% dos entrevistados não concordam que o vencedor das primárias não seja o nomeado.
A derrocada de Trump aconteceu pela inédita junção dos três atores capazes de derrubá-lo: os doadores de campanha, a mídia conservadora e os cabeças do partido. Em meados de março, um fundo de financiamento republicano lançou uma campanha de TV mostrando atrizes lendo as frases mais cabeludas proferidas pelo empresário sobre o sexo feminino (entre elas “mulheres: você tem que tratá-las como merda”). A propaganda viralizou na internet e foi vista por mais de 3 milhões de pessoas no Youtube. Aliado a isso, Trump foi massacrado por emissoras de rádio do Wisconsin, e acabou ofendendo jornalistas publicamente em represália. Por fim, o governador do estado, Scott Walker, uma das figuras mais proeminentes da legenda, defendeu abertamente a candidatura de Cruz. Walker venceu, ali, três eleições em cinco anos, e quando o empresário resolveu atacá-lo as declarações pegaram mal perante a população local.
Sob pressão da frente tríplice, Trump viveu uma semana infernal antes da abertura das urnas, que prejudicaram muito sua imagem e certamente afetaram seu desempenho na votação. Primeiro, um assessor seu foi indiciado por agredir uma repórter. Sem ser provocado, o empresário disse ainda que grávidas que fazem aborto deveriam ser punidas (pelo que depois se desculpou, mas o estrago estava feito). Como se não bastasse, compartilhou na internet uma foto comparando a beleza de sua esposa, que é ex-modelo, com a mulher de Cruz. “Sua visão está mudando entre o eleitorado republicano”, afirma Alexander Keyssar, professor de história e políticas públicas da Universidade de Harvard. “Mas ele continua possuindo um bloco de apoiadores, e isso não está mudando.”
Aos 45 anos, Ted Cruz está longe de ser a pessoa mais amada dentro do Partido Republicano, mas nesse momento é o único que possui condições de barrar a ascensão do empresário, visto como um aventureiro nas fileiras da sigla. Filho de um pastor evangélico cubano e primeiro senador hispânico do Texas, o atual segundo, no passado, já foi muito criticado pelos líderes tradicionais da legenda. Um dos motivos é sua visão radical em relação a tópicos como as mudanças no sistema de saúde americano, os direitos dos gays e os conflitos no Oriente Médio (ele defende a “destruição absoluta” do Estado Islâmico). “Cruz é, quem sabe, o maior conservador dessa geração”, diz Haiman. “Trump é mais populista, suas posições em alguns assuntos são conservadoras, mas em outros soam mais liberais.” Apesar da reação de Cruz, o empresário está longe de estar morto. As próximas primárias serão em Nova York, seu estado natal, em 19 de abril. Trump está à frente das pesquisas, resta saber se seu carisma pessoal será capaz de superar os jogos partidários nos quais o adversário é especialista.
Fotos: Paul Sancya, Mary Altaffer e Paul Sancya/AP Photo