"Enquanto você está aqui sentado, tem um concorrente estudando." A sentença, rabiscada em diversas versões nas paredes dos banheiros dos cursinhos, lembra aos alunos que é hora de voltar para os livros. Em ano de vestibular, é preciso se dedicar às apostilas, cumprir à risca a batelada de tarefas e fazer todos os simulados. Afinal, você quer ou não quer entrar na faculdade? Se a moça larga o caderno para ir ao cinema, a mãe a chama de irresponsável. Se a turma do futebol convence o rapaz a jogar pelo menos o primeiro tempo, o pai promete não pagar cursinho no ano seguinte. Desde que inventaram os exames de admissão para o ensino superior, a escrivaninha virou prisão para a maioria dos adolescentes. Obrigados a renunciar ao lazer e aos esportes, muitos terminam por arriscar a própria saúde e transformam o período de preparação em uma estressante temporada de expectativa e ansiedade. Os resultados mais freqüentes são o famoso branco na hora H e, muitas vezes, um aproveitamento mediano na prova.

Para ajudar a garotada a superar essa etapa sem enlouquecer no meio do caminho, psicólogos e educadores resolveram adaptar para os vestibulandos um tema bastante difundido no mundo corporativo: a administração do tempo. “Renato Russo diz em uma de suas músicas que disciplina é liberdade”, lembra o pedagogo Paulo Kretly, especialista em produtividade e presidente da consultoria FranklinCovey no Brasil. “Isso se aplica ao vestibulando. Se ele assumir os estudos como prioridade e entender que sacrifício é deixar de fazer algo bom em prol de um objetivo ainda melhor, seu rendimento será maior e seu estudo, mais eficaz.” O consultor se inspira no best-seller Os sete hábitos das pessoas altamente eficazes, do americano Stephen Covey, para sugerir aos jovens que planejem o dia, a semana e o mês. Segundo ele, estabelecer horários para cada atividade – inclusive para as refeições e o lazer – contribui para que o dia pareça mais longo. “Não adianta abdicar de tudo por causa dos estudos. Alimentar-se e dormir bem contribuem para que o conteúdo seja mais bem assimilado. Mas é importante saber que o candidato colhe o que planta. Não existe milagre”, diz ele.

Em comparação com os anos anteriores, os meses que antecedem o vestibular exigem uma dedicação extra aos estudos. O desafio de quem freqüenta escola integral ou concilia o terceiro ano do ensino médio com um cursinho é ainda maior. Sobra menos tempo para praticar atividade física e namorar, por exemplo, o que exige dos alunos criatividade para encontrar alternativas. “Acordo mais cedo para correr antes de ir para a escola e meu namorado vem jantar na minha casa quase todas as noites”, conta Maria Carolina Palladino, 17 anos, candidata a uma vaga na faculdade de arquitetura. Às seis da manhã, Carolina está na sala de ginástica de seu prédio. De lá, segue para o colégio Santo Américo, onde fica até as cinco da tarde. Duas vezes por semana, estica o expediente até as 19h30 para as aulas de desenho – necessárias para a prova específica – e ainda encontra tempo para dedicar de uma a duas horas por dia às tarefas de casa e às revisões. Às segundas-feiras, tem aula de piano: um hábito que já dura 11 anos.

Miguel Arruda, coordenador pedagógico da turma de Carolina, sugere que nenhum vestibulando deve abandonar as aulas extracurriculares. “Atividades paralelas servem de válvula de escape para aliviar a pressão”, diz. Vale a pena, portanto, fazer intervalos para o lazer e os esportes, mesmo que seja necessário tirar o atraso no fim de semana. Maria Carolina, por exemplo, viaja todo sábado para Campos do Jordão, na serra, ou para o Guarujá, no litoral (duas cidades nas quais a família tem casas), e leva o material da escola na bagagem. “Já me acostumei a tomar sol com um livro no colo”, diz.

Para a maioria dos especialistas, no entanto, a praia não é exatamente o melhor local para estudar. Ambientes silenciosos e bem iluminados, onde o aluno possa se concentrar sem ser interrompido, costumam favorecer a assimilação de conteúdo. O psicólogo Paulo Motta, da Unesp de Assis, vai contra a corrente. “Essas dicas são positivas para a maioria dos alunos, mas cada um precisa descobrir a si mesmo. Muitos preferem estudar com música tocando”, diz. Motta coordena um grupo de estagiários que responde diariamente (em horários específicos) a dúvidas de cunho psicológico encaminhadas a eles por meio do Messenger, um programa de comunicação instantânea via internet, sobre os cuidados pré-vestibular. “Se o aluno dormir oito horas por noite e tiver seis horas de aula por dia, sobram dez para serem preenchidas da maneira que ele escolher”, diz.

Passar dez horas por dia em um barco seria o sonho de João Augusto Hackerott, 17 anos, campeão paulista de vela. Por causa do vestibular, o jovem teve de restringir os treinos às tardes de sexta, sábado e domingo, quando veleja na represa de Guarapiranga, em São Paulo. Às terças e quintas, ele joga futebol com os amigos. “A vida não é só vestibular. Meu rendimento nos estudos seria menor se eu não reservasse tempo para fazer as coisas que me dão prazer”, justifica. Erra quem pensa que ele é um aluno relapso. Seu resultado no Enem foi suficiente para aumentar em pelo menos seis pontos sua nota na Fuvest. No último simulado, João acertou 63 das 90 questões, enquanto a nota de corte para o curso de meteorologia, sua opção, é inferior a 50. Seu segredo é prestar atenção às aulas e revisar a matéria do dia logo depois do almoço. Três horas diárias de estudo, inclusive aos sábados e domingos, têm sido suficientes.

De fato, com exceção dos candidatos a cursos altamente concorridos, como medicina, dedicar uma média de quatro horas por dia à preparação costuma ser o bastante. Depois disso, o cansaço faz com que o jovem coloque em risco sua capacidade de assimilar conteúdo. Uma dica simples é dividir o tempo de estudo em janelas de 50 minutos e colocar dez minutos de intervalo entre elas, alternando matérias de exatas, como matemática e química, e de humanas, como história e geografia. Roberta Edo, orientadora pedagógica do terceiro ano do colégio Santa Maria, onde João Augusto estuda, lembra que o estudo contínuo é mais eficaz do que o de última hora. “Tem de ser um hábito rotineiro, e não restrito às vésperas das provas. Os alunos devem estabelecer horários para o estudo e seguir a agenda. Não adianta deixar para estudar quando der vontade”, diz.

Foi pensando nisso que Luiz Cláudio Carvalho, diretor-geral do sistema de ensino Integral – colégio e cursinho com três unidades em Campinas e 14 franquias espalhadas principalmente pelo Estado de São Paulo – desenvolveu o Mais (Método de Aprendizagem Integrada). Cada aula é resumida em uma ficha que pode ser arquivada em duas pastas diferentes: em uma ficam as aulas dadas pelos professores e na outra, as aulas estudas. “O aluno sabe exatamente em que disciplina está atrasado e que aulas ele ainda precisa estudar”, diz Carvalho. Um plano de estudos em forma de tabela permite ao vestibulando compor uma agenda pessoal, colorindo cada horário conforme o tipo de atividade: aulas, estudo, lazer, esportes etc. “Muitos pecam por falta de organização, e não de dedicação. Estudam, mas não as matérias necessárias”, completa o educador.

“Sem isso, eu teria dificuldade em estabelecer prioridades e me perderia ao procurar as matérias dos anos anteriores”, elogia Rebeca Dias, 17 anos, candidata a uma vaga em medicina. Preparada para enfrentar uma maratona de seis vestibulares, Rebeca estuda cinco horas por dia em sala de aula e outras seis por conta própria. A cada simulado, analisa os erros para se concentrar nos pontos fracos. A mãe, coisa rara, acha que ela tem estudado demais. Fã de futebol e de handebol, a jovem deixou de jogar bola durante a semana, mas faz questão de dormir pelo menos sete horas por noite. A pelada fica para o domingo. “É um sacrifício que vale a pena”, acredita. É isso aí, Rebeca, falta pouco!