Pequenas cidades do interior do País estão dando exemplo ao abdicar da maior festa popular dos brasileiros, o Carnaval, e investir seu dinheiro em programas sociais urgentes, principalmente relacionados à saúde. A severa crise econômica que assola o Brasil atingiu em cheio os cofres municipais e muitas prefeituras assistiram suas arrecadações despencarem mais de 20% com a diminuição dos repasses federais e estaduais. Diante dessa situação calamitosa, os mais prejudicados são os municípios menores. Com isso, muitos deles reavaliaram seus orçamentos para 2016 e decidiram abrir mão de patrocinar a folia para beneficiar as questões consideradas inadiáveis.

Os exemplos se espalham pelo País. No interior de São Paulo, o município de Capivari se viu ameaçado por outra crise, além da econômica, na área da saúde pública. A região enfrenta, há mais de um ano, uma epidemia de dengue, que em 2016 chegou acompanhada ainda pelo risco do perigoso zika vírus. O valor de R$ 100 mil que seria destinado à festa municipal de Carnaval foi remanejado para a pasta da Saúde. A folia foi cancelada e a verba agora vai reforçar as ações de combate ao Aedes aegypti, mosquito transmissor das doenças. Serão mutirões de limpeza, nebulização, obras de tapa-buraco e forças-tarefa de agentes de saúde visitando as residências em busca de potenciais criadouros de mosquito.

“Administrar é escolher e priorizar e este é o momento de priorizar a saúde”, disse à ISTOÉ o prefeito de Capivari, Rodrigo Proença. Também no interior de São Paulo, Porto Ferreira entrou o Ano Novo com R$ 10 milhões a menos em caixa e uma frota de ambulâncias sucateada. Diante da situação, a administração municipal não hesitou em repassar os R$ 150 mil que seriam destinados ao desfile oficial da cidade – que teria ‘Olimpíadas’ como tema – para a compra de uma ambulância, no valor de R$ 120 mil. Em Minas Gerais, na histórica São João Del Rey, com a verba do cancelamento do desfile foi possível destinar R$ 200 mil para operação tapa-buracos e R$ 150 mil para a compra de medicamentos da Unidade Básica de Saúde (UBS).

“Não podíamos fugir da realidade”, diz o prefeito da pequena Piracuruca, no norte do Piauí, Raimundo Alves. A principal fonte de renda do município são os repasses do governo federal, que, segundo Alves, não só diminuíram cerca de 30% em 2015 como ainda chegaram com atraso. “Como gestor e médico, tive que eleger prioridades, é nossa responsabilidade.” O prefeito adianta que novos cortes virão. A verba de R$ 150 mil para o Carnaval irá reforçar o orçamento das obras de um centro de saúde da mulher, previsto para atender cerca de duas mil pacientes por mês, e para a reestruturação do centro de diagnósticos do hospital municipal. Para o prefeito de Amarante (PI), Luiz Neto, a decisão de cancelar a festa popular foi muito difícil, mas preventiva. A verba do Carnaval será destinada a serviços públicos como saúde, educação, infraestrutura e folha de servidores.

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A preocupação com serviços de saúde também foi a responsável pelo cancelamento do Carnaval de Morretes, no litoral paranaense, que agora conta com R$ 120 mil para bancar o programa Saúde da Família. Segundo o secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico Neto Gnatta, nos últimos oito meses a queda na arrecadação foi de 22% e a cidade enfrenta dificuldade para manter os salários dos servidores em dia. “Seria uma irresponsabilidade deixar os programas de saúde desfalcados e manter uma festa de Carnaval”, afirma Gnatta. O secretário explica também que os recursos da prefeitura para eventos vão priorizar a Festa Feira Agrícola e Artesanal de Morretes, que conta com a participação de 80 produtores e rende para a cidade, pelo menos, R$ 15 milhões.

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Em Taquari, no Rio Grande do Sul, a beneficiada pela decisão da cidade de priorizar os gastos públicos será a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae). A instituição acabou de perder o aporte dado para uma empresa privada em um de seus programas terapêuticos e a prefeitura usará parte da verba carnavalesca de R$ 190 mil para não suspender o atendimento das 30 crianças que estudam no local. O restante do volume viabilizará mais de mil exames médicos que estão pendentes na cidade. Segundo o prefeito Emanuel Hassen de Jesus, a decisão foi em parceria com as agremiações e autoridades da cidade e contou com o apoio da população, já que Taquari enfrenta atrasos nos repasses do governo estadual. “Estamos falando de uma quantia de mais de R$ 1 milhão”, diz. Iniciativas como essas mostram que, com organização e empenho, é possível enfrentar a crise.

 

  


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