A principal marca brasileira no mercado internacional de joias nasceu da insistência de um imigrante culto, pobre e cego de um olho em valorizar as gemas nacionais. Hans Stern dizia que assim como não existe mulher semigrávida ou pessoa semi-honesta, não se podia chamar uma pedra de semipreciosa. Dessa forma, esse judeu alemão que fugiu para o Rio de Janeiro durante a Segunda Guerra Mundial, ergueu um império idolatrado pelas maiores estrelas do cinema e reconhecido em todo o mundo como a principal grife de luxo do País.

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CRIADOR E CRIATURA
Hans Stern (abaixo) na praia de Copacabana, em 1939. Angelina Jolie (acima) na
entrega do Oscar em 2004, onde desfilou com o colar Athena, uma joia com
93 diamantes desenhada pela H. Stern especialmente para a ocasião

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Ao entender o alcance do arco narrativo da vida do fundador da H. Stern (1922-2007), quando foi chamada pela família para escrever um “livro mais pessoal”, a jornalista Consuelo Dieguez fez uma contraproposta. Em vez de produzir um texto em cima de entrevistas que acabaria na mesa de amigos e parceiros, Consuelo foi bater na porta da Editora Record com o projeto de uma biografia que passa com atenção por momentos históricos, da Europa e do Brasil, que ela vasculhou durante dois anos e meio.

“H. Stern – A História do Homem e da Empresa”, que chega às livrarias este mês, é por tudo isso, fonte múltipla de interesses. A construção da identidade da marca traz consigo o glamour internacional de grandes divas do cinema, ícones que elegeram a H. Stern como marca-amuleto. Catherine Deneuve, nos anos 1980, chegou a lançar uma linha com Stern. Angelina Jolie pensa em vestidos depois de escolher a peça da joalheria brasileira, que ostenta em cerimônias do Oscar, como o colar Athena, a peça de 93 diamantes que roubou todas as atenções na entrega do prêmio de 2004. O chamado tapete vermelho é hoje um dos grandes palcos do produto final dessa história.

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Tudo o que ocorreu antes dos momentos de holofotes e glória, porém, empresta ao volume interesse histórico da melhor cepa. Filho de industriais de Essen, Hans estava no coração do fatídico ataque a propriedades judias que ficou conhecido como A Noite dos Cristais. Graças ao acesso exclusivo a cartas do empresário enviadas a amigos, a jornalista pôde reconstituir relatos como o desse momento do qual quase não restam testemunhas oculares. “Sempre tive interesse pela Segunda Guerra Mundial e li muitos livros a respeito durante a pesquisa para o livro. Mas nunca antes havia me deparado com uma descrição feita por uma pessoa que viveu aquele terror”, diz a repórter da revista Piauí, que foi finalista do último Prêmio Jabuti pelo livro “Bilhões e Lágrimas – A Economia Brasileira e seus Atores”.

A chegada ao Rio de Janeiro, a transformação do filatelista em amante das gemas e a admiração rasgada pela cultura nacional, amarram passagens da história do Brasil de antes da metade do século, atravessando ditadura militar e o milagre econômico e chegando até as crises econômicas recentes e momentos em que a empresa familiar teve de se reinventar para sobreviver.

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CAMINHO DAS PEDRAS
Para Stern não existiam pedras semipreciosas. Acima,
a pulseira Rua das Pedras, feita de quartzos e ametistas,
em homenagens aos passeios de Búzios (RJ)

A discrição de Hans Stern e sua resistência a entrevistas contribuem com o ineditismo do livro. A reprodução de peças como a pulseira Rua das Pedras, uma homenagem aos passeios de paralelepípedos de Búzios, mostram a reverência pelo Brasil que o joalheiro queria que suas peças transmitissem.

Fotos: JOE CAVARETTA; Acervo H.Stern/Registro Histórico; Acervo H.Stern