Aos 19 anos de idade, Ilona Marita Lorenz se tornou amante de Fidel Castro. Era o auge da Revolução Cubana, em 1959, e o navio de seu pai passou pelo Porto de Havana. Um ano depois, voltava à ilha a mando da CIA para matar o amante em uma missão sobre a qual afirma ter orgulho de ter falhado na autobiografia “Eu fui a Espiã que amou o Comandante”, que sai agora no Brasil pela editora Planeta.

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OFICIAL
Enquanto viveu em Cuba, Mariita Lorenz assinava documentos no nome de Fidel

 

A história da alemã filha do capitão de um navio com uma atriz americana é mais impressionante do que alguns dos melhores romances sobre a Guerra Fria. Tem pouco heroísmo, muito de sobrevivência e quase nenhuma possibilidade de final feliz: o depoimento que chega agora ao País terminou de ser escrito em sua pequena e escura casa em Balitmore (EUA), onde hoje, aos 76 anos, passa seus dias, quase todos em frente a um velho aparelho de televisão numa sala separada do banheiro por nenhuma porta.

“Minha vida tem se limitado à mera sobrevivência”, escreve Ilona Marita, batizada com o nome que seria dado à sua irmã gêmea morta ainda no útero da mãe pelo ataque do cão de soldado nazista. “Meu destino sempre foi ficar sozinha.”

“Nunca vou esquecer da primeira vez que vi de perto aquele
olhar penetrante, o belo rosto e o sorriso maroto e sedutor”

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VÉSPERA
Marita Lorenz, aos 19 anos, em uma praia em Cuba,
dias antes de conhecer Fidel Castro

 

A narrativa mostra que por muito tempo – e em circunstâncias extraordinárias – Marita lutou contra essa sina quase sempre para perder. Enviada na primeira infância ao campo de concentração de Bergen-Belsen – o mesmo em que morreu Anne Frank – sobreviveu ao frio extremo abraçando-se aos outros prisioneiros que pareciam (e algumas vezes estavam) mortos. De volta à casa materna, tentou recuperar a infância se aproximando das crianças da vizinhança em Bremerhaven. No porão de uma delas, arrumada pela mãe com vestido e fita branca no cabelo, “um dia depois do Natal”, foi estuprada por um sargento americano, anos depois condenado também por violentar a filha de quatro anos.

A atriz Alice June Lofland, sua mãe, entregou o primeiro filho ao exército de Hitler para não perder a cesta básica com que sustentava os outros três e a si mesma. Não é de se estranhar que a filha tenha desistido cedo dos estudos para navegar com o pai, Heinrich Lorenz, que nunca viveu com a família. Foi justamente dentro do navio de Heinrich – no momento em que o capitão dormia – que Marita conheceu o homem que ela chama de amor da sua vida. Fidel Castro, segundo suas memórias e algumas fotos, teria entrado na embarcação alemã assim que ela aportou na costa cubana. Marita lembra que munido de armas e muitos charutos, o comandante se apresentou e logo em seguida passou a cortejá-la, não demorando a roubar-lhe um beijo dentro do convés do pai. A autora se tornaria imediatamente uma amante ciumenta e adepta da Revolução. Até engravidar.

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Começa nesse ponto uma das passagens mais nebulosas do relato. Marita afirma que foi drogada e submetida a um aborto involuntário. E diz que nesse momento, levada aos Estados Unidos, sofreu “uma lavagem cerebral” da Agência Central de Inteligência, a CIA, que a convenceu a voltar para a ilha e assassinar o seu namorado. Corria o ano de 1960. Se a missão tivesse sido bem sucedida, talvez não ocorresse a invasão da Baía dos Porcos, uma pedra angular nos rumos da Guerra Fria.

Com pílulas de veneno escondidas em um pote de creme Pond’s, Alemanita – como era chamada por Castro – marcou um encontro com o amante, em um dos hotéis que serviam a revolução, o Habana Libre. Mas ao chegar ao quarto em que os dois teriam sua última noite de amor, Marita já havia desistido de realizar o trabalho. Nem Cuba nem os Estados Unidos eram mais seguros para a espiã, treinada na mesma turma de Lee Harvey Oswald, o assassino de John Kennedy.

Em 2000, Marita voltou à Cuba com uma equipe de pesquisa para a preparação do documentário “Querido Fidel”. Castro não a recebeu e a única fonte próxima do casal a conceder entrevista foi Yánez Pelletier, que morreu naquele mesmo ano. O filme estreou em 2001, sem todos os detalhes que a ex-amante do ditados revela agora no livro.

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