A ciência está aprofundando em mapeamentos cerebrais o que Gilberto Gil já presumia desde 1978. Na esteira da liberação sexual, “viver a ilusão de que ser homem bastaria” era até então uma bandeira levantada poeticamente na canção “Super Homem”, em defesa de uma “porção mulher” resguardada e da igualdade de gêneros. Mas a verdade é que ser masculino e feminino ao mesmo tempo é uma característica dos cérebros. Não importa qual seja sua genitália. É o que confirma uma pesquisa internacional liderada pela Universidade de Tel Aviv, em Israel, na qual participam cientistas alemães e suíços. Recém-publicado pela revista científica PNAS, o estudo demonstra que a maior parte dos cérebros de homens e mulheres estudados em ressonâncias magnéticas de 1.400 pessoas tem áreas masculinas e femininas completamente misturadas, em forma de mosaicos. As imagens foram obtidas por tecnologias e métodos diversificados.

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O trabalho comparou imagens de cérebros de homens e de mulheres com objetivo de identificar neles as áreas que pareciam mostrar diferenças mais significativas. Não que essas áreas não existam, mas apenas 10% das ressonâncias analisadas tinham essas regiões mais definidas. O hermafroditismo cerebral predomina, enquanto os tipos de cérebro 100% femininos ou masculinos são exceção. “Não há nenhuma região em nossas amostras que distingua e se apresente de forma evidente apenas nos homens ou nas mulheres”, diz a pesquisadora Daphna Joel, que liderou o trabalho. “Há muitos tipos de cérebro, mas o tipo que só apresenta características mais prevalentes nos homens do que nas mulheres é muito raro.”

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CONCLUSÃO
A pesquisadora Daphna Joel: ”Há muitos tipos de cérebro”

 

A prevalência dos mosaicos masculinos-femininos sugere que há pouca demarcação cerebral para distinguir o que é “coisa de mulher” ou “coisa de homem”. A ideia de que os homens tenham áreas cerebrais mais ligadas a maior raciocínio espacial, por exemplo, não impediria-os de ter também desenvolvidas áreas que indiquem facilidade verbal e exacerbação dos sentimentos, características socialmente tidas como femininas. Independentemente de rótulos e preconceitos, o que se convencionou chamar de traços mais masculinos e mais femininos seriam determinados por razões multifatoriais, como culturas e o meio em que se vive.

Do ponto de vista da massa cinzenta, das conexões neuronais e da espessura do córtex, não há diferença entre os cerébros pelo simples fato do gênero ser distinto. Mais da metade dos córtex pesquisados se encaixaram na categoria do mosaico.

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Ilustrações: iStock
FOTO: Tel-Aviv University