Ao ver na tevê imagens do impeachment do ex-presidente Fernando Collor, em 1992, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, brincou: “Como as pessoas estão envelhecidas. Não podemos chegar ao espelho”. Em janeiro de 2016, o ministro estará de férias coletivas no Rio de Janeiro, mas não descartou uma convocação excepcional por conta do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. “Teremos plantão. E, em caráter excepcionalíssimo, claro que podemos ser convocados se o STF precisar atuar em colegiado”, diz.

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ISTOÉ – Pode haver quebra do recesso no STF por causa do impeachment?
Marco Aurélio Mello –
Aquele que estiver respondendo pela presidência estará capacitado para enfrentar medidas de urgência que forem requeridas. Mas estou há 25 anos no supremo e nunca tivemos uma convocação nas férias. Mas não há essa excepcionalidade para se reunir ministros.

ISTOÉ – E se o parlamento decidir por suspender o recesso?
M.Aurélio –
O parlamento terá a decisão deles. Não sabemos. Mas o processo de impeachment está num estágio muito inicial.

ISTOÉ – Como o sr. entendeu o ato do deputado Eduardo Cunha?
M.Aurélio –
O deputado Eduardo Cunha cumpriu a lei e o dever. Ele só podia arquivar o pedido (de impeachment) se fosse uma peça defeituosa. Quem define se o processo deve prosseguir ou não é nem a comissão que ele vai constituir. São os 513 deputados. Se o colegiado entender que merece ter sequência, a interessada (a presidente Dilma) é notificada para apresentar defesa e também testemunhas e provas.

ISTOÉ – Mas e as acusações de chantagem e barganha com o governo?
M.Aurélio –
Barganha para mim é inimaginável. Barganha é prevaricação. Ele não aceita ou deixa de aceitar o pedido de impeachment. Não sei por que ele não deu sequência antes. Pelo rigor legal, ele teria que dar sequência imediatamente ao pedido, a não ser que fosse uma peça sem assinatura, sem elementos mínimos de prova, sem um raciocínio desenvolvido. Ai sim, ele poderia ter mandado o pedido para o arquivo.

ISTOÉ – A decisão de ontem foi tida como histórica, o sr. concorda?
M.Aurélio –
Histórica? Como e por que? A sequência é algo natural. O que vinha ocorrendo é que não era natural: ele (Cunha) sentar em cima do processo.


ISTOÉ – O PT entrou com recursos no ST. Chegou a ser noticiado que o partido desistiu de um deles ao saber que o relator seria Gilmar Mendes…
M.Aurélio –
Mas o ministro Gilmar Mendes, um juiz, não é querido pelo PT? Pensei que os demais processos fossem para o ministro Celso de Mello pela conexão probatória (já havia sido designado como relator no primeiro mandado de segurança). Eu não vejo motivos para o Supremo interferir. Isso de chantagem não prevalece. Temos que esperar o ministro Celso decidir, é muito cedo para judicializar o incidente do impeachment. Temos que esperar um pouco.

ISTOÉ – A Bolsa subiu…
M.Aurélio –
A alta da Bolsa é um péssimo sinal para a presidente da República. Se a Bolsa subiu é porque houve uma euforia por dias melhores. Não deixa de ser uma forma para tentar se suplantar esse impasse do Executivo com o Legislativo. Independentemente do afastamento ou não dela. Se o Legislativo disser não ao impeachment, a presidente pode suplantar essa onda. E vai poder governar. Vamos encarar com serenidade e com muita temperança, sem atropelos. Atropelo é justiçamento, não é justiça.