O mundo, tão castigado por notícias ruins do Norte e do Oriente, terá um momento de alívio, pelo menos visual, nas primeiras madrugadas desta semana. É o espetáculo anual do cometa Tempel-tuttle em sua trajetória ao redor do sol. Em contato com a atmosfera desde quarta-feira 14, ele deixa um rastro de meteoros incandescentes que, na madrugada deste domingo, deverá ter uma visibilidade só comparável à que proporcionou há 35 anos, em novembro de 1966. “O ângulo de incidência, pela posição da Terra em relação à constelação de Leão, é que torna essa visibilidade muito maior. O fenômeno pode ser visto a olho nu e a sensação será de uma chuva de estrelas cadentes, com todas partindo de um ponto na constelação, em várias direções”, explica o físico Marcomede Rangel, do Observatório Nacional do Rio de Janeiro.

Os vestígios do cometa podem ser apreciados até o dia 20, mas sua maior intensidade será neste domingo, entre 2h e 4h da madrugada. Mesmo sem telescópio, será possível contar até 100 meteoros por hora viajando na direção de onde nasce o sol. Vê melhor quem tem o horizonte amplo, sem obstáculos como elevações e construções – de preferência longe das luzes da cidade. No Brasil, a visibilidade aumenta nas regiões Norte e Nordeste. O show de meteoros, cujo tamanho varia de um grão de areia a uma bolinha de gude, faz tanto sucesso que influenciou a escolha da data e do local do 4º Encontro Nacional de Astronomia, que ocorre entre os dias 14 e 18, em Salvador. Observadores profissionais de estrelas, amadores e curiosos deixarão os telescópios de lado para ver, como os leigos, a “chuva das Leonidas”, assim chamada por estar na constelação de Leão.

Os meteoros são pedaços de rocha com hidrogênio, amônia e metano que se soltam dos cometas e ficam incandescentes ao entrar em atrito com os gases da atmosfera terrestre, chegando a atingir 650oC. A tempestade de pedrinhas espaciais não representa, segundo Marcomede, nenhum risco para a Terra porque essas fagulhas cintilantes se desintegram no ar. Elas beneficiam os radioamadores por estimular eletricamente a alta camada da atmosfera e melhorar a qualidade das transmissões. Podem, no entanto, causar avarias nos satélites à frente de sua trajetória desordenada.

Os cometas não passam de restos da perfeita montagem do sistema solar, há cinco bilhões de anos. “O cometa é como uma bola de gelo suja. Um fóssil do sistema solar, a rebarba, a escória dos planetas”, exagera o físico Marcomede. Do alto dessa insignificância, o cometa Tempel-tuttle embeleza o céu dos novos tempos, cravejado de mísseis e de aviões em chamas.