Na semana passada, as redes sociais fizeram circular uma informação que é o retrato do mundo empresarial na segunda década do século 21. A maior rede de hospedagem do mundo, o Airbnb, não é dona de um único quarto. O maior divulgador de conteúdo, o Facebook, não produz um único texto. A maior companhia de transporte, o Uber, não possui um carro sequer. Neste último caso, o sucesso estrondoso é ainda mais surpreendente. Por mais que o fundador Travis Kalanick diga que se trata de uma empresa de tecnologia, o Uber é, no fundo, apenas uma organização que oferece um serviço que existe há mais de 100 anos: o transporte pago de passageiros em veículos com quatro rodas. Mesmo sem trazer uma grande inovação, o aplicativo se tornou um fenômeno global. A mágica foi reciclar uma velha ideia – o transporte de pessoas –, seduzir os clientes com dinamismo e qualidade não encontrada nos concorrentes, e, em alguns casos, fazer corridas por preços mais em conta. Com essa fórmula simples e de alta eficiência, o Uber enfureceu taxistas do mundo inteiro, que viram seu mercado minguar, ao mesmo tempo em que embolsava bilhões de dólares.

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FORTUNA
O fundador Travis Kalanick se tornou uma das pessoas mais ricas dos Estados Unidos

Em apenas 5 anos de existência, o Uber já está avaliado em US$ 51 bilhões. É mais do que a centenária General Motors, cotada a US$ 47 bilhões. Para ficar no universo brasileiro, a Petrobras, uma das maiores petrolíferas do mundo, valia na semana passada US$ 26 bilhões, praticamente a metade. Dois fatores explicam o crescimento acelerado do Uber. Primeiro, ele está inserido na economia digital, quem tem notável capacidade para produzir bilionários da noite para o dia. O segundo ponto diz respeito ao modelo de negócios. “O Uber não tem amarras”, diz Rodrigo Tafner, coordenador do curso de Sistemas de Informação da ESPM. “A estrutura é enxuta e facilmente aplicável.” 

Funciona assim: a empresa fica com 20% das corridas dos motoristas do Uber Black (categoria top) e 25% do UberX (mais simples). Como os motoristas não são funcionários, não há custos trabalhistas e as despesas se restringem à atualização de softwares e às poucas pessoas que trabalham nos escritórios. O Uber também não gasta um único centavo com a manutenção e limpeza dos 500 mil carros que oferecem o serviço (pelo acordo entre as partes, essas são responsabilidades dos motoristas). Outra vantagem é que um único modelo de aplicativo se aplica a todos os 58 países onde atua (a única necessidade é a tradução). “O sucesso do Uber se deve ao fenômeno da economia compartilhada”, diz Tallis Gomes, fundador do aplicativo concorrente Easy Taxi.

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CONFUSÃO
Taxistas protestam contra o aplicativo e tentam invadir a
prefeitura de São Paulo. Disputa está longe de acabar

No Brasil, o aplicativo passou a funcionar em maio de 2014 no Rio de Janeiro. Atualmente, está disponível em cinco cidades: além do Rio, também em Belo Horizonte, Brasília, Maceió e São Paulo. No País todo, há seis mil motoristas cadastrados, mas esse número vem aumentando rapidamente. Em Nova York, a quantidade de carros pretos (a cor oficial do Uber) já é maior do que a de táxis amarelos, que se transformaram nos últimos anos num dos símbolos da cidade americana.

O Uber acelera no mundo inteiro apesar dos intensos protestos de taxistas e do cerco das autoridades. Nos Estados Unidos, há o risco de a Justiça obrigar a empresa a reconhecer os motoristas como funcionários, o que inviabilizaria o modelo de negócios da empresa. Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad anunciou, na quinta-feira 8, a criação da categoria “transporte por aplicativo.” Para se encaixar na nova regra, o carro deverá ser preto, ter quatro portas e, no máximo, cinco anos de uso. Também foi definido que todas as cobranças deverão ser feitas por meio de aplicativos. Pouco depois do anúncio, o Uber divulgou um comunicado criticando a iniciativa, dizendo que não é uma empresa de táxis e que “não se encaixa em qualquer categoria”. Novas disputas deverão ser travadas nos próximos dias.

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PORTAS ABERTAS
O motorista do Uber Rodrigo Federice: ganhos de até R$ 10 mil por mês

Os profissionais que apostaram no Uber dizem que melhoraram de vida. No final de 2014, Rodrigo Federice, 36 anos, deixou a multinacional em que trabalhava há 15 anos para abrir uma empresa de brindes. Em janeiro, desistiu do projeto depois de conhecer o Uber. Vendeu a moto, pegou o dinheiro da rescisão e comprou um Toyota Corolla preto. Como funcionário de empresa, ganhava R$ 8,5 mil brutos. Depois que virou motorista, passou a embolsar entre R$ 8 mil e R$ 10 mil por mês, com a diferença de que controla melhor o seu tempo. Há sete meses com o Uber, Marcos da Silva, 43 anos, também não tem do que reclamar. Como motorista de transportadora, ganhava R$ 2 mil por mês. A renda agora mais do que triplicou. “Até consegui colocar o meu filho em uma escola particular”, diz.

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FOTOS: Divulgação; FELIPE GABRIEL; Dario Oliveira/Agência o Globo