Em meio ao debate sobre a reforma ministerial de Dilma, atribuiu-se ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, a indicação de dois nomes do PMDB – mesmo depois de ele se recusar, em conversa com a presidente, a participar do processo de preenchimento de cargos.  Questionado por ISTOÉ, em entrevista exclusiva concedida na quinta-feira 24, Cunha disse que mantém a defesa do rompimento do PMDB com o governo e que sua ascendência sobre a bancada peemedebista faz com que “todos” sejam ligados a ele de alguma forma. “Tenho uma relação com a bancada como um todo. Qualquer um que for escolhido da bancada é uma pessoa próxima a mim”. Sobre o impeachment de Dilma, ele se diz pressionado “por todos os lados”. Perguntado se vai ajudar ou dificultar o trâmite do processo, Cunha garante que se limitará a cumprir o regimento.

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DEIXOU CHEGAR…
Eduardo Cunha afirma que o regimento da Câmara dá poder ao presidente,
mas a última palavra sobre o impeachment de Dilma será do plenário

ISTOÉ – O governo passou quatro anos e meio acusando o PMDB de ser um partido fisiológico. Agora, a presidente da República bate à porta oferecendo cargos em troca de apoio. Isso garante governabilidade?
Eduardo Cunha –
Não é o caminho. O problema de cargo na administração pública tem que ser tratado como uma consequência de um processo de participação e não necessariamente uma razão pela qual você vai participar. Não adianta ter dez ministérios se isso só faz bem ao próprio ministro. Não estamos aqui para arrumar emprego para ninguém. Nossa preocupação é de participar na formulação da discussão, colaborar com ideias nos projetos e, se for relevante, como no caso da CPMF, tem que ter concordância.
 
ISTOÉ – A concordância vem mais fácil se ganhar cargo?
Cunha –
Olha, fisiologismo é aceitar cargo e dizer amém a qualquer coisa, com ou sem convicção. Não vai funcionar assim. Quando você participa da formulação da política, você já é por si só solidário à sua execução. As pessoas não concordam mais com a ideia de “ah, eu tenho um cargo tal, então vou ter que votar do jeito tal”. Não acho o PMDB fisiológico. É que não adianta você aumentar o número de cargos e continuar sem ingerência. Só distribuir cargo não resolve.
 
ISTOÉ – Os nomes indicados pela bancada da Câmara, como os do deputado Celso Pansera (RJ) e Manuel Jr. (PB), por exemplo, são nomes ligados ao sr.?
Cunha –
Em primeiro lugar, fui líder da bancada dois anos. A bancada velha, que foi reeleita, é de uma convivência e intimidade enorme comigo. E a bancada nova me reconduziu como líder por unanimidade. Tenho uma relação com a bancada como um todo. Qualquer um que for escolhido da bancada é uma pessoa próxima a mim. Aí dizem que o Hugo Mota (PB), da CPI, é ligado a mim, o Marcos Rotta (AM), da CPI do BNDES é ligado a mim, o Sergio Souza (PR), relator do Fundo de Pensão, é ligado a mim. Aí eu sou ligado a todo mundo, não tem jeito.

“Se tem alguém que teve um comportamento sóbrio, fui eu.
Quem colocou a palavra impeachment na rua foi a própria presidente”.
Eduardo Cunha, Presidente da Câmara dos Deputados

ISTOÉ – Ao aceitar esses cargos não parece que a bancada do PMDB na Câmara está fazendo negócios com o governo?
Cunha –
“Negócio” é muito ruim e pode ter outro tipo de conotação. A bancada parece que ainda tem uma maioria que prefere ficar com o governo. Não é o que representa a maioria partidária. Então, não vejo muita mudança. Acho que esta é mais uma tentativa de “fidelizar” aqueles que já têm pré-disposição de apoiar essa gestão.

ISTOÉ – O sr. vem sendo acusado de ser fomentador do processo de impeachment da presidente.
Cunha –
Quero saber quem está me acusando. Porque se tem alguém que teve um comportamento sóbrio, fui eu. Cansei de dar declarações públicas de que impeachment não é recurso eleitoral, que não é forma solução para baixa popularidade, então não sou fomentador de absolutamente nada. Eu sou instado, quem colocou a palavra impeachment na rua foi a própria presidente.
 
ISTOÉ – A decisão de barrar ou levar a análise adiante é do sr …
Cunha –
Não, por isso a questão de ordem que foi colocada e eu respondi (na quinta-feira) esclarece: o regimento da Câmara dá poder ao presidente, mas sempre a última palavra é do plenário. Então, não existe decisão do presidente que não caiba depois ser referendada pelo plenário.

ISTOÉ – Está sendo pressionado para barrar o impeachment?
Cunha –
Eu sofro pressão de todos os lados. Daqueles que pediram para que eu acolha (o pedido de impeachment) e dos que querem que eu recuse. Trabalho muito tranquilo com esse negócio de pressão, eu não tenho problema com pressão. Vou cumprir minha obrigação. Não quero antecipar a decisão, porque seria antiético, mas elas são sustentadas monocraticamente e terão que ser confirmadas.

ISTOÉ – O sr. vai ajudar ou dificultar a abertura de um pedido para abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff?
Cunha –
Eu, sozinho, não tenho poder sobre esse processo de impeachment. Apenas tenho que cumprir o regimento naquilo que me diz respeito.

ISTOÉ – O senhor recuou?
Cunha –
Não, claro que não. Disseram que o Renan (Calheiros, presidente do Senado PMDB-AL) teria aderido ao governo. Aí manifestantes foram para a porta das nossas casas, porque somos vizinhos, tocar vuvuzela. Disseram estar lá para não deixar Renan dormir e eu disse: “Se ele não dorme, também não durmo”. Esculhambam o Renan, mas minha posição não é que o PMDB rompa. “Rompa” parece briga, né? Mas, digo, saia formalmente da base do governo.

ISTOÉ – O ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), acusado de ter trabalhado contra a sua eleição para a presidência da Câmara, agora está com poderes esvaziados. O sr., que é um homem crente, acredita que Deus atendeu seus pedidos?
Cunha –
(Risos) Sou crente, mas não estou crente de que ele está esvaziado. Acho difícil ele conseguir ficar fora da articulação política.