Para entender o significado do rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor´s, basta responder a seguinte pergunta: você emprestaria o seu dinheiro para um mau pagador? A não ser que se trate de um perdulário irremediável, provavelmente dirá não. Ao colocar as finanças brasileiras na segunda divisão – a nota caiu de “BBB-” para “BB+” –, a S&P fez mais do que tirar o grau de investimento conquistado a duras penas em abril de 2008. Numa tacada só, a agência americana desmoralizou a política econômica da presidente Dilma Rousseff, colocou pressão adicional em um governo aturdido e escancarou para o mundo inteiro o buraco em que o País se meteu. A expressão mais adequada para definir as nações que se enquadram no nível “BB+” é “potencial caloteiro.” Daí se compreende o tamanho da encrenca que os brasileiros terão pela frente. Designado pelo Palácio do Planalto para falar oficialmente sobre o assunto, o ministro Nelson Barbosa (Planejamento) era na quarta-feira 9 o retrato do desespero. Nervoso e atrapalhado, Barbosa não conseguiu encontrar nada melhor para dizer a não ser que o Brasil passará por uma fase de “travessia.” E se do outro lado estiver o abismo?

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"É preciso fazer escolhas. Sem coragem para decidir, tudo ficará mais caro"
Joaquim Levy, ministro da Fazenda

As consequências do rebaixamento serão desastrosas. De imediato, o Brasil terá dificuldades para atrair recursos estrangeiros. O selo de bom pagador é uma exigência dos principais fundos de investimento para aplicar em títulos de governos. Com o risco de calote cravado na imagem do Brasil, esses investidores desaparecerão. “Os grandes fundos serão obrigados a retirar suas aplicações”, diz Celso Grisi, professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo. “Como o nível de poupança do Brasil é muito baixo, o crescimento do País depende de capital externo. É esse dinheiro que vai sumir.” O setor mais afetado deverá ser o de infraestrutura, que depende das grandes somas desembolsadas por capitalistas internacionais. Na quinta-feira 10, a S&P deu uma nova demonstração dos estragos que virão. A agência excluiu a Petrobras da lista de empresas com grau de investimento.

Com menos dinheiro circulando, o crédito se torna mais escasso e, por isso, mais caro também. Assim, as empresas terão dificuldade para se capitalizar – dificuldade dupla se a nota da empresa for ruim, como é agora o caso da Petrobras –, reduzindo seus projetos e planos de expansão. Na medida em que os investimentos minguam, o desemprego cresce, a renda média encolhe e o consumo cai. A onda perversa deságua no PIB, que, no caso brasileiro, já está em ritmo negativo. É impossível dimensionar, em termos percentuais, o impacto da perda do grau de investimento na performance da economia, mas é certo dizer que o rebaixamento da S&P contribuirá para alimentar a recessão. Para Clemens Nunes, coordenador da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas, o corte da nota brasileira eleva a pressão sobre o dólar, que tende a aumentar, e poderá trazer prejuízos para o mercado acionário.

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O principal argumento usado pela S&P para o rebaixamento da nota de crédito foi o projeto de orçamento apresentado há duas semanas pelo governo que prevê um déficit R$ 30,5 bilhões nas contas públicas em 2016. Esse equívoco deve ser atribuído principalmente à presidente Dilma, principal defensora da proposta. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, era contra. Voz solitária no governo, Levy defendia o corte radical de custos para equilibrar as contas, mas a presidente não mostrou disposição para isso. Depois do anúncio do rebaixamento da nota, Levy disse que “é preciso fazer escolhas” e que, sem coragem para decidir, “tudo ficará mais caro.” Ele tem razão.

Foto: Pedro Ladeira/Folhapress