A morte da inglesa Emma Christoffersen, 28 anos, no aeroporto de Heathrow, em Londres, está provocando um certo desconforto nas companhias aéreas e preocupando os médicos. Apesar de o fato ter ocorrido há cerca de 15 dias, a notícia só aterrissou na mídia na segunda-feira 23. Emma morreu após desembarcar de um vôo de 20 horas da companhia australiana Qantas Linhas Aéreas que havia partido da Austrália para a capital inglesa. Emma foi vítima da “síndrome da classe econômica”, um distúrbio que acontece quando o passageiro fica muito tempo sentado nos assentos apertados da aeronave, típicos desta categoria de vôo. Quanto menor o espaço (pitch, em inglês) das cadeiras, mais difícil movimentar as pernas.

O saldo desse sufoco – sofrido por Emma – é o desenvolvimento de trombose de veias profundas. “Quando se fica sentado por um longo período sem se movimentar, a circulação sanguínea fica prejudicada. Assim, dificulta-se o retorno do sangue para o coração, pois ele precisa subir contra a força da gravidade”, explica o médico Pedro Puech, de São Paulo. “As pernas incham e podem se formar coágulos ou trombos que obstruem as veias”, completa. Ao andar, a musculatura das pernas empurra o coágulo para cima e há chances de ele se soltar na hora ou dias depois na corrente sanguínea. Nesse caso, o coágulo se transforma em êmbolo. Foi o que aconteceu com Emma. “O êmbolo se alojou na artéria pulmonar, interrompendo a circulação nos pulmões. O sangue deixou de ser oxigenado no órgão. Isso causou morte súbita”, conta o cardiologista Mário Maranhão.

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Emma morreu após o desembarque

Sufoco – Esse problema pode acontecer, por exemplo, em dez horas de vôo na classe econômica. “Mas quanto maior o tempo, mais riscos”, avisa Maranhão. O advogado Luiz Cesar D’Ottaviano, 35 anos, sofreu as consequências da classe econômica. Em sua viagem de lua-de-mel para Nova York, ele ficou comprimido na cadeira. Não só por causa de suas medidas – 1,79m e 130 quilos. Mas também porque o passageiro da frente deitou a poltrona. “Não consegui me levantar e o cabelo dele ficava no meu nariz”, lembra-se. “Cheguei torto no hotel e passei duas horas deitado com dor nas costas”, conta. Na volta, ele preferiu a classe executiva.

É importante salientar que o avião não é o único vilão. A trombose de veias profundas tem relação direta com a imobilidade. Ficar sentado num lugar pequeno sem movimentar o corpo por um longo período aumenta as chances de o problema aparecer. Assim, quem viaja de ônibus por 15 horas sem se mexer também pode ter a doença. Na verdade, o impressionante para os médicos é o fato de Emma ser tão jovem e ter apresentado o mal. “A doença pode aparecer nos idosos porque já existem alterações nas veias nessa fase da vida. É possível que Emma tivesse algum histórico de trombose na família”, suspeita Maranhão. De acordo com ele, têm maiores chances de apresentar a trombose os fumantes (a nicotina aumenta os riscos de o sangue coagular) e as mulheres consumidoras de anticoncepcionais e que fumam. O hormônio estrógeno, presente na pílula, acelera a coagulação sanguínea.

No Brasil, não há dados sobre a incidência da trombose de veias profundas causada pelo aperto na classe econômica. Para o cirurgião Puech, ela não é uma doença comum. Já o médico Murillo Villela, da Academia Internacional de Medicina Aeroespacial, defende que o mal vem se tornando mais frequente devido ao aumento do número de turistas viajando por causa da redução do preço da passagem. “Pouca gente ouve falar disso porque vários passageiros só sofrem as consequências muito tempo depois”, justifica Villela. Para evitar que a doença desligue as turbinas das empresas aéreas, companhias como a Varig estão adotando medidas. “Estamos preparando um vídeo no qual serão ensinados aos passageiros cuidados que eles devem adotar”, afirma Paulo Magalhães, gerente-médico da empresa. A assessoria da Qantas garante que em sua revista de bordo há recomendações aos turistas, como fazer exercícios de flexões com os pés durante três minutos, a cada uma hora. Para evitar surpresas desagradáveis os turistas terão que integrar mais esse hábito no seu kit de viagem.