Em Ibaretama, uma das cidades mais pobres do Ceará, a 124 quilômetros de Fortaleza, uma história vem quebrando a monotonia das conversas de botequim. Há pouco mais de um mês, o ex-pároco do lugarejo, José Antonio Castilho, 40 anos, e um suposto vidente, José Ernani dos Santos, de 33, foram expulsos da diocese de Quixadá pelo bispo dom Adélio Tomasin. Motivo? Os dois são acusados de aplicar um golpe de mais de R$ 40 mil no comércio das cidades de Ibaretama e Quixadá em nome da Igreja. Além disso, a dupla fugiu em uma caminhonete Ranger adquirida num consórcio com o caixa da Igreja. Mas foram pegos pela polícia na última semana e estão presos por crime de estelionato e apropriação indébita.

No rosário de “pecados” do padre e do beato também consta a acusação de desvio de R$ 22 mil da diocese de Quixadá. Segundo o padre Márcio Oliveira, foram emitidos mais de 92 cheques sem fundo, assinados pelo padre Castilho. As peripécias não param por aí. Eles também são acusados de vender e trocar terrenos e casas pertencentes à diocese. O desfalque no comércio atingiu depósitos de construção, uma loja de eletrodomésticos, outra de material esportivo e uma farmácia. Com os cheques, também faziam cestas básicas para distribuir entre os pobres e pagavam medicamentos dos necessitados.

Para explicar a compulsão em dar calotes, o padre culpa a pobreza nordestina: “Eu não conhecia essa realidade. Acabei me descontrolando e fiz tudo isso para ajudar os pobres.” Ordenado há 11 anos em Rio Preto (SP), o padre acredita que Ernani viu a Virgem Maria: “Creio que ele esteve com Nossa Senhora, mas isso não tem nenhuma relação com o problema dos cheques. Ernani não tem nada com isso”, garante. Mas o currículo do suposto vidente é suspeito. Fundador da comunidade Filhos do Imaculado Coração de Maria em Fortaleza, é acusado de maus-tratos, constrangimento ilegal, semi-escravização e posse sexual. Os acusadores são alguns dissidentes do seu próprio “rebanho”. Em 1995, surgiram no seu corpo o que seriam as cinco chagas de Cristo. Depois de um exame no IML, constatou-se que Ernani havia se automutilado.

Segundo o padre, 11 dos cheques que emitiu já foram pagos. Ele foi afastado da paróquia no último dia 26 por dom Adélio Tomasin. No documento, o bispo diz que o sacerdote é controlado por Ernani. Apesar de ter direito a uma prisão especial, por ter formação superior, o padre preferiu dividir, “em solidariedade”, o xadrez com o seu companheiro de inquérito.