Popularizado no Brasil pelo rapper Gabriel O Pensador, o mito da loura burra nasceu nos anos 20, mais precisamente durante uma viagem de Nova York a Los Angeles no luxuoso trem Santa Fé Chief. Passageira de seu vagão primeira classe, a morena Anita Loos (1893-1981) começou a escrever bem-humoradas observações sobre suas rivais de madeixas no mesmo bloco que costumava fazer anotações para seus consagrados roteiros hollywoodianos. A fonte de inspiração era uma blonde verdadeira e aspirante a atriz que viajava com seu grupo. A cada movimento, a moça levava a ala masculina à loucura. “Se por acaso ela deixasse cair o romance que estava lendo, vários homens pulavam para pegá-lo, enquanto eu arrastava malas pesadas do bagageiro”, escreveu Anita, mais intrigada que invejosa. Publicados originalmente em capítulos na revista Harper’s Bazaar, os relatos se transformaram no clássico Os homens preferem as louras (Record, 174 págs., R$ 18) e em sua sequência Mas os homens se casam com as morenas (Record, 158 págs, R$ 18), de 1925 e 1927, respectivamente. Ambos têm como subtítulo O revelador diário de uma lady profissional.

Depois de deixar a provinciana Little Rock, no Arkansas, a fictícia autora dos diários, Lorelei Lee, mostra como é estafante a rotina de uma garota empenhada em se dar bem na vida. Embora tenha gritantes limites intelectuais, Lorelei é tudo, menos ingênua. Um detalhe: Lorelei é loura. Diante de um “cavalheiro”, em qualquer situação, ela só pensa em cifrões. Sua única dificuldade é convencer a amiga, Dorothy Shaw, a se comportar da mesma forma. Como se fosse um pólo oposto, a morena Dorothy sofre constantes recaídas em sua atração por homens musculosos e cafajestes. Mas Lorelei não desiste.

Em sua trajetória de alpinista social, Lorelei é cristalina. “Acho mesmo que os americanos são os melhores cavalheiros porque se alguém beijar sua mão é muito-muito agradável. Mas uma pulseira de diamantes e safiras é para sempre”, filosofa. Em 1953, na versão cinematográfica de Os homens preferem as louras, musical dirigido por Howard Hawks, a estonteante Marilyn Monroe celebrizou o episódio cunhando a frase “os diamantes são os melhores amigos de uma mulher”. Dois anos depois, Mas os homens se casam com as morenas também chegou às telas, com Jane Russell e Jeanne Crain nos papéis principais.

A popularidade das histórias de Lorelei não se limitou aos frequentadores dos cinemas. William Faulkner e James Joyce estavam entre os escritores que reservavam tempo para acompanhar as peripécias da loura desmiolada. Editada em 14 idiomas, a obra de Anita retrata com perspicácia a sociedade americana dos anos 20, relacionando sexo e dinheiro sem nenhum tipo de moralismo. Com linguagem fluída e tiradas divertidíssimas, os diários só tropeçam quando lançam mão do artifício fácil de cometer erros ortográficos para demonstrar a falta de neurônios da personagem. Assim, amizade platônica vira “plantônica”. Um recurso totalmente dispensável.