Valeu ter enfrentado os obstáculos e o atraso dos salários. As adversidades não foram suficientes para esmorecer a ginasta Daniele Hypólito. A pequena Daniele, 1,45m, desembarcou no Aeroporto Internacional do Rio na manhã da quarta-feira 7, como uma gigante do esporte nacional, exibindo a medalha que lhe confere o título de segunda melhor ginasta de solo do mundo. O feito foi conquistado em Ghante, na Bélgica, na prova do último dia do Mundial de Ginástica. Ela atingiu 9.487 pontos, ficando atrás da romena Andreea Raducan. É a primeira vez que uma brasileira conquista essa medalha para o País nessa modalidade. O Brasil não tem tradição em ginástica olímpica e jamais figurou entre referências mundiais como Rússia, EUA e Romênia.

“Essa vitória tem um sabor especial”, exulta Daniele. A ginasta, de 17 anos, é uma vitoriosa, mas ainda não tem patrocinador. Daniele – filha do meio da costureira Geni e do manobrista Walter, que moram num apartamento cedido pelo clube – treina no Flamengo, no Rio de Janeiro, há 13 anos. No entanto, a atleta não tem as condições mínimas para desenvolver-se no esporte. Não fosse Ronaldinho, o jogador de futebol da Inter de Milão, a medalhista não teria dinheiro para custear sua alimentação durante o Mundial. “A dieta é importante para qualquer ginasta. Temos de comer com moderação, mas temos que comer, né?”, afirma. A família de Daniele come graças a cestas básicas fornecidas pela ex-nadadora e hoje vereadora carioca Patrícia Amorim. Para ir à Bélgica, juntou os recursos oferecidos pelo Ministério dos Esportes, que bancou a passagem aérea e a hospedagem, e pela Confederação Brasileira de Ginástica, que arcou com o seguro saúde e cedeu o uniforme.

As dificuldades se acirraram depois que o patrocinador do Flamengo, a empresa suíça ISL, considerada uma das maiores do mundo em marketing esportivo, quebrou. Nem mesmo a técnica da ginasta, Georgette Vidor, pôde acompanhá-la na viagem. Daniele continuou treinando oito horas por dia longe dos olhares atentos e severos da treinadora. Nem técnicos nem familiares fizeram parte da equipe que representou o Brasil na Bélgica. Desde agosto passado, Daniele não é mais vinculada contratualmente ao Flamengo. “Sairemos atrás de patrocínio. Não estamos conseguindo apoio nem para o futebol, imagina para o esporte amador”, angustia-se o superintendente do setor de esporte amador do clube, Reinaldo Lima. Daniele por pouco não teve a carreira interrompida em 1997, quando o ônibus em que viajava com a equipe do Flamengo acidentou-se na via Dutra, deixando sua técnica paraplégica e matando sete pessoas. A atleta é a prova da determinação de um brasileiro. Além da capacidade de superar adversidades, ela mantém vivo o sonho de superar competidores bem nutridos e se tornar a melhor do mundo.