"Getúlio Vargas está se revirando na sepultura.” A frase, do governador do Rio, Anthony Garotinho (ainda no PDT), é uma crítica à decisão de Leonel Brizola de acelerar a fusão do PDT ao PTB. Garotinho, que vinha negociando sua filiação ao PSB, vê na fusão uma nova perspectiva: lutar na Justiça pelo controle da sua atual sigla. Após nove dias de viagem à China, onde curtiu a ressaca das derrotas de seus candidatos nas principais cidades do Estado, o governador conversou com ISTOÉ.

ISTOÉ – Quando o sr. vai deixar o PDT?
Anthony Garotinho – Quando forem esgotadas todas as possibilidades de libertar o partido da ditadura de Leonel Brizola.

ISTOÉ – O sr. já escolheu o partido ao qual vai se filiar caso seja frustrado nessa missão?
Garotinho – Não, mas não vou quebrar minha tradição. Sempre fui de esquerda. Vou para uma legenda de esquerda.

ISTOÉ – O PMDB é de esquerda?
Garotinho – Essa pergunta você pula.

ISTOÉ – A preferência dos dirigentes do PSB pela candidatura presidencial de Itamar Franco não impede sua filiação?
Garotinho – A eleição presidencial não é para ser tratada agora. Isso não impede minha entrada no PSB, até porque não entro em partido só para disputar eleição. Vamos decidir o que fazer em uma reunião dos dirigentes do PDT no próximo dia 15.

ISTOÉ – Como o sr. explica a derrota de seus candidatos em todas as cidades importantes do Estado?
Garotinho – Fui o grande vitorioso. De 92 municípios, vencemos em 54, com a cabeça de chapa em 32. Na Região Metropolitana, o problema é que a condução da eleição ficou com a direção do PDT, que lançou no Rio um candidato para perder, Brizola, e nos municípios onde podíamos ganhar eles fizeram tudo errado. A direção foi incapaz.

ISTOÉ – Qual sua opinião sobre a fusão do PDT com o PTB?
Garotinho – É uma imoralidade histórica. Imagine que gracinha Brizola de braços dados com Pedrinho Abraão, Gastoni Righi e Roberto Jefferson no palanque. Getúlio Vargas está se revirando na sepultura. Se isto acontecer, vou lutar na Justiça para manter a sigla PDT. Nós, os socialistas trabalhistas, a corrente à esquerda do PDT, vamos reivindicar a sigla na Justiça.

ISTOÉ – O resultado das eleições deste ano no Rio não enterram seus projetos presidenciais para 2002? Ou já estavam enterrados?
Garotinho – Não enterram nem estavam enterrados. Só o tempo dirá se sou candidato. Por agora, quero continuar mantendo altos índices de popularidade. Vamos decidir o que fazer em meados do próximo ano.

ISTOÉ – Os dois maiores partidos de esquerda do Rio, PT e PDT, estão rompidos com o sr., o que inclui até sua vice, Benedita da Silva. Isso não vai empurrá-lo para a direita?
Garotinho – Não vou contrariar minha história. Benedita é que teve um papel lamentável, apoiando Cesar Maia (PTB) por baixo do pano, numa frente do atraso para o Rio, com Brizola e Marcello Alencar. Todos se uniram para me derrotar. Benedita deve pôr a cabeça no travesseiro e fazer um exame de consciência, se sentirá ingrata. Espero que ela faça uma autocrítica e peça perdão a Deus por ter apoiado um candidato que vai governar contra os pobres. Logo ela, que veio da favela, apoiou uma pessoa que acha que problema de morador de rua se resolve com creolina. Se ela abrir o coração, pode haver reconciliação.

ISTOÉ – O sr. não se sente isolado?
Garotinho – Quem se sente isolado é quem não tem o povo. Minha popularidade e minha aprovação estão acima da média dos governadores brasileiros.

Fusão confusão

Depois de amargar um quarto lugar nas eleições para prefeito do Rio este ano, o ex-governador Leonel Brizola decidiu dar um passo que pode arranhar ainda mais a imagem do líder de esquerda que garantiu a posse de João Goulart em 1961 e simbolizou a redemocratização do País ao retornar do exílio para se eleger governador do Rio em 1982. Temeroso de que a futura reforma política ponha em risco a existência do PDT, Brizola decidiu uni-lo ao PTB, partido sempre identificado como pragmático, nome delicado para o fisiologismo. O passo mais recente foi dado na terça-feira 7, quando as bancadas dos dois partidos, autorizadas por seus comandos, aprovaram a incorporação. O tamanho do novo partido empolga os dirigentes. O revigorado PTB nasceria com 53 deputados e cinco senadores, além de 750 prefeitos, um tamanho semelhante ao do PT. Duas reuniões de Brizola com o presidente do PTB, deputado José Carlos Martinez (PR), abriram as negociações.

Em 1979, Brizola voltou ao País articulando a recriação do PTB, inventado por Getúlio Vargas para organizar os trabalhadores sob seu comando. Uma articulação atribuída então ao chefe do Gabinete Civil do governo Figueiredo, general Golbery do Couto e Silva, entregou a sigla a uma sobrinha de Getúlio, Ivete Vargas. Brizola chorou, deu a volta por cima e fundou o PDT. “A fusão pode ser uma sobrevida para Brizola, mas também seu último suspiro”, avalia a cientista política Lúcia Hippolito