Charles Darwin explicou direitinho o que acontece com as espécies quando predadores mais evoluídos passam a ocupar espaços antes habitados por indivíduos pouco preparados para sobreviver em um ambiente em transformação. As espécies que não se adaptaram simplesmente desapareceram. Outras, para permanecerem vivas, desenvolveram características que lhe permitiram combater ou conviver com os rivais em ambientes inóspitos. Para os evolucionistas, essa é a regra vigente na face da Terra desde o princípio dos tempos. Darwin deu a volta ao mundo em busca de exemplos biológicos que comprovassem sua tese. Hoje, podemos observar esse mundo em mutação literalmente em cada esquina.

Sempre que um passageiro embarca em um carro chamado pelo aplicativo Uber, ele está se transformando em um agente darwinista. Contribui para a extinção de um ser com prazo de validade vencido na superfície das grandes cidades, o antigo taxista. Podem protestar quanto quiserem. Não se freia a marcha evolutiva por decreto ou vontade política. Os humanos mantém-se como espécie predominante por aqui porque tiveram a habilidade de aprender e discernir. São capazes de entender que acima das questões classistas e mesmo sociais (as milhares de famílias que dependem da renda dos taxistas) está algo mais forte: o bem estar promovido pela qualidade dos serviços, a liberdade de escolha e até mesmo nossa natural disposição de ir adiante, buscar o novo. Compreendem como são as transformações. No início vem o conflito e a dor. Depois, a recompensa pelo avanço.

Nas últimas décadas, a tecnologia nos ofereceu a experiência de sermos cobaias em vários confrontos evolutivos. Muitos dizem hoje que a indústria da música foi salva por empresas de compartilhamento de canções como o Spotify, que abriu caminho para que milhões de pessoas tivessem acesso a seus hits favoritos. É tanta gente pagando pouco para consumir muito que a empresa pode fazer bons acordos com os artistas e gravadoras, que antes praguejavam contra o que chamavam de piratas digitais, personificados na figura do Napster, serviço gratuito que desafiou a indústria ao permitir que os consumidores trocassem arquivos de músicas livremente. A evolução, em ambas as frentes, levou a um modelo melhor. O predador voraz transformou-se em parceiro de uma simbiose lucrativa.

Cinema, mídia, transporte aéreo, hotelaria, todos enfrentam sua saga de sobrevivência digna de um estudo darwiniano. A diferença é o tempo. Darwin estudou evoluções forjadas em milênios. Hoje elas se fazem em meses. Taxistas, normalmente associados a um sistema cartorial de licenças negociadas em um mercado negro, são alvo agora porque se acomodaram num mundo sem concorrência. Poucos se qualificaram para prestar um serviço à altura do que esperam consumidores mais informados e exigentes. Sua resistência hoje – às vezes até violenta – no máximo lhes dará tempo para se adaptar.