A Operação Lava Jato atingiu seu ponto de ebulição, na semana passada, com a condenação, pela Justiça Federal do Paraná, de três ex-integrantes da cúpula da empreiteira Camargo Corrêa. Dalton Avancini e Eduardo Leite – então presidente e vice, respectivamente – foram sentenciados a 15 anos e 10 meses de prisão. João Ricardo Auler, que presidiu o conselho de administração da companhia, pegou 9 anos e seis meses de cadeia. Como Avancini e Leite fizeram delação premiada, poderão cumprir a pena em regime domiciliar. Foi uma sentença dura e exemplar. A primeira contra o grupo de empreiteiros que integrou o chamado “clube do bilhão”. Eles acertavam preços em licitações da Petrobras, superfaturavam obras e desviavam recursos para pagar políticos. Os empreiteiros condenados também terão de pagar multa de R$ 50 milhões.

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OS PRIMEIROS
Dalton Avancini, João Ricardo Auler (acima da esq. para dir) e
Eduardo Leite (ao lado), executivos afastados da Camargo Corrêa,
foram condenados por crimes cometidos em contratos com a Petrobras

A punição contra os corruptores jogou ainda mais lenha na fogueira das investigações do Petrolão, alimentando novas críticas dos advogados dos executivos que se queixam da diferença da condução dos processos na Justiça Federal em Curitiba em relação ao trâmite no Supremo Tribunal Federal. Para a defesa dos investigados, o açodamento na prolação das sentenças decorreria de vícios do processo, com restrição de direitos dos réus, prisões preventivas e uso de delações como instrumento de prova. Se para os advogados o Supremo é mais cauteloso, para os investigadores é apenas “lento”. Seja como for, a Justiça deve ser isonômica. Mas, por enquanto, os políticos – considerados os beneficiários finais do esquema – parecem desfrutar de um privilégio, embora aleguem que não deveriam ser condenados com base apenas nas afirmações dos delatores. Foro privilegiado não deveria significar excesso de direitos aos políticos que os detém por lei. O que deveria mudar é tão somente a instância de julgamento, não a maneira como tratar os seus processos. Não é o que aparenta até agora.

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O EMPRESÁRIO E AS SIGLAS
Marcelo Odebrecht foi indiciado pela PF, na última semana. Análise
de dados do celular do empresário, muitos deles cifrados,
revela relação com políticos

Essa diferença ficou evidente no pedido de indiciamento de Marcelo Odebrecht, dono da maior construtora do País. Em relatório preliminar, a Polícia Federal acusou o executivo de obstrução à Justiça, corrupção e lavagem de dinheiro, com o pagamento de propina a executivos da Petrobras no exterior. Além disso, a PF anexou ao documento o conteúdo de inúmeras mensagens obtidas no celular de Marcelo, em que são citados nomes de políticos do mais alto escalão da República associados a repasses de valores de propina. Há até menção à existência de recursos de uma conta na Suíça que teriam sido usados para bancar a campanha de reeleição de Dilma Rousseff em 2014. Fatos gravíssimos que deveriam ser apurados imediatamente pelo procurador-geral Rodrigo Janot. Se Janot arquivou o pedido de investigação de Dilma baseado na delação de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, sob a alegação de que os fatos mencionados por ele eram anteriores ao mandato presidencial, agora tal argumento já não seria cabível. O executivo da UTC, Ricaro Pessoa, já havia envolvido a campanha de 2014 de Dilma no Petrolão em seu depoimento. Pessoa afirmou ter sido pressionado por emissários do governo a doar R$ 7,5 milhões para a campanha à reeleição. Caso contrário, contratos firmados por ele com a Petrobras correriam risco. E, agora, Janot? A PF ainda tenta decifrar as mensagens de Marcelo, repletas de códigos e siglas. Dependendo do contexto, elas podem ter efeito devastador sobre as já investigadas contas eleitorais de Dilma. O uso na campanha de dinheiro vindo do exterior pode, em último caso, levar à cassação do mandato da presidente.

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OUTRO RITMO
Enredados na Lava Jato, Renan Calheiros, Eduardo Cunha e Fernando
Collor se beneficiam do foro mais do que privilegiado

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No início do mês, o doleiro Alberto Youssef revelou em mais um depoimento ter sido procurado por um emissário do PT para trazer do exterior R$ 20 milhões. Agora, a PF pode ter encontrado outro indício na mesma direção. Em uma das mensagens no telefone de Marcelo Odebrecht o empresário alerta: “Dizer do risco da cta suiça chegar na campanha dela”. Há também mensagens que remetem à campanha do prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) e outros políticos como Fernando Pimentel, governador de Minas e José Serra, senador tucano. Os ministros Aloizio Mercadante e Edinho Silva também são mecionados. Com base nos achados da PF, Moro deu prazo até segunda-feira 27 para que a defesa de Marcelo Odebrecht esclareça todas as menções a políticos, assim como as supostas operações bancárias no exterior e repasses para campanhas eleitorais. Na sexta-feira 24, o juiz decretou nova prisão de Marcelo e diretores da Odebrecht, agora sob a acusação de que seriam os operadores de contas na Suiça que abasteceram o Petrolão. Os políticos que teriam se favorecido com essas operações permanecem em liberdade. São fatos como estes que caracterizam o qiue os advogados tratam como dois pesos e duas medidas nos processos da Lava Jato.

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Enquanto isso, em Brasília, exibindo um rito distinto, quem pediu explicações a Sérgio Moro foi o ministro Ricardo Lewandowski, presidente do STF. Atendendo a uma reclamação formal do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, Lewandowski determinou a Moro que não profira sentença até prestar esclarecimentos sobre o ocorrido durante depoimento de Julio Camargo, delator que citou Cunha como beneficiário de uma propina de R$ 5 milhões em contratos de navios-sonda. Moro tem dez dias para explicar porque não suspendeu o depoimento de Camargo quando este citou o parlamentar, que só pode ser julgado pelo Supremo. Em suas alegações, o peemedebista acusou o juiz da 13ª Vara de Curitiba de usurpar a competência do STF. Moro rebateu alegando que não pode “silenciar testemunhas ou acusados na condução do processo”. O depoimento do delator corroborou acusações feitas anteriormente pelo doleiro Alberto Youssef. Camargo disse que foi abordado por Cunha de forma amistosa, dizendo-se “merecedor de 5 milhões de dólares”, em referência a um suposto débito do executivo da Setal com o lobista Fernando Baiano, ligado ao PMDB. No mesmo depoimento, Camargo explicou que não falou antes sobre a propina de Cunha com medo de retaliações a sua família. O peemedebista reagiu com fúria às acusações, atribuindo-as à uma manobra política do governo Dilma para desqualificá-lo. Decidiu então romper com o governo e amplificou a crise. 

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