Passava da meia-noite da quarta-feira 15 quando deputados gregos se reuniam em Atenas para decidir se aceitariam um novo resgate proposto pelos credores internacionais. Na mesa, estavam uma ajuda de 86 bilhões de euros nos próximos três anos e um empréstimo emergencial de 7 bilhões de euros para honrar compromissos financeiros internos. Só que a concentração de manifestantes do lado de fora do Parlamento, nervosos e armados com coquetéis Molotov, indicava que já não havia esperança de que aquele dinheiro representasse alguma salvação para um país afundado na recessão. Fortalecido por um plebiscito que rejeitava a austeridade imposta pelo Banco Central Europeu, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Comissão Europeia, o primeiro-ministro Alexis Tsipras partiu para encontrar os credores no fim de semana passado com a expectativa de que poderia renegociar os termos de forma mais vantajosa e ainda manter o país na zona do euro. No fim, voltou para casa com um acordo muito mais duro, que condena a Grécia a um futuro de miséria.

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REVOLTA
Contrários à austeridade, manifestantes protestaram na quarta-feira 15 em Atenas

A partir de agora, os gregos não só terão que pagar mais impostos, reformar a Previdência e a Justiça civil, privatizar o setor elétrico e flexibilizar as normas trabalhistas, mas também se desfazer de parte de sua história. Tsipras, que se considerou chantageado, concordou em repassar para um fundo independente 50 bilhões de euros em ativos estatais. Isso significa que, do patrimônio mais singular à Grécia, estarão à venda ilhas, reservas naturais e ruínas antigas. Para o ex-ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, o pacote representa a “completa anulação da soberania nacional”. “A recente cúpula europeia é nada menos do que o apogeu de um golpe de Estado”, escreveu em seu blog. Enquanto deputado, Varoufakis foi um dos membros do Syriza, partido governista, que votou contra a proposta trazida pelo primeiro-ministro. A rebelião foi abraçada pelo ministro da Energia, Panagiotis Lafazanis, e outros 30 membros do Syriza. Para obter a aprovação do que considera a opção “menos pior”, Tsipras precisou dos votos da oposição, o que indica que, aos poucos, ele tem perdido a confiança necessária para manter-se no cargo.

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Nesse cenário, os economistas vislumbram um destino sombrio. “A Grécia tem um nível de renda que é incompatível com seu nível de produtividade”, disse à ISTOÉ Francesco Giavazzi, professor de Economia da Universidade de Bocconi, na Itália. “Espero que esse seja o começo de uma nova Grécia, que acabe com os pequenos monopólios que impedem o país de crescer. Até lá, ela vai sofrer.” Reginaldo Nogueira, coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec, diz que, em seis meses no governo, o grande erro do Syriza foi passar a impressão de que estava disposto a enfrentar a saída da zona do euro. “Só que, no momento em que isso foi colocado à mesa, não havia um planejamento para essa alternativa”, afirma. Para Nogueira, sem uma reestruturação da dívida, o acordo só posterga o problema para os próximos dois anos. Segundo o FMI, a relação entre dívida e PIB, hoje em 177%, pode chegar a 200% em até dois anos. Os credores, no entanto, resistem em cortar parte de uma dívida que é impagável. Assim, a Europa terá de abrir mão de ao menos um de seus objetivos para esta década. Entre os cinco principais compromissos sociais assumidos pelos membros da União Europeia recentemente, está a redução da pobreza. Até 2020, o plano era tirar 20 milhões de pessoas da miséria ou exclusão social. Não é difícil supor que a Grécia, que já tem mais de um terço dos habitantes nessa situação, não ajudará a cumprir essa meta.

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Fotos: Angelos Tzortzinis/AFP; Andreas Solaro/AFP