Na tarde da quarta-feira 6, o presidente do Congresso, Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), ocupou a tribuna em mais uma batalha da guerra particular que trava com o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) e surpreendeu os colegas parlamentares com uma confissão. Depois de acusar Barbalho de receber uma bolada de R$ 100 mil da empreiteira OAS – empresa do clã dos Magalhães –, ACM ensaiou uma justificativa que acabou incriminando sua família e a construtora baiana: “Como todas as empreiteiras, a OAS, quando encontra como fazer corrupção, faz.” Era só o que faltava. Nessa estratégia camicase, ele já conseguiu rachar a base governista, criar sérios embaraços para o Palácio do Planalto e deixar o seu próprio partido irritado com a perspectiva de ficar fora do comando da Câmara e do Senado. A pedido dos partidos de oposição, toda a lama trocada entre os dois caciques será investigada pela Comissão de Ética do Senado e pelo Ministério Público.

No Senado, tudo indica que a apuração deve acabar em pizza, saindo no máximo outra censura ao comportamento de ACM e Jader. Os procuradores da República, porém, terão um farto material para investigar. A começar pela evolução patrimonial de ambos, como sugere o próprio Jader. “O Ministério Público tem que avocar todos os processos relativos aos dois senadores, como o que apura a remessa pela OAS de US$ 500 milhões para o Exterior”, cobra o senador Roberto Freire (PPS-PE). Os procuradores também vão esmiuçar as denúncias de que um apadrinhado de Jader teria praticado corrupção à frente da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Jader nega qualquer participação em irregularidades na Sudam e que tenha recebido dinheiro da OAS. E ACM insiste na versão de que não é um dos donos da OAS nem das empresas de comunicação de sua família.

A nova escaramuça entre ACM e Jader pode mudar os rumos da sucessão no comando do Senado. A contragosto, o PFL resolveu embarcar na canoa de Antônio Carlos, mesmo que para isso tenha que perder a presidência da Câmara. O PMDB decidiu cerrar fileiras em torno de Jader. “Antônio Carlos é hoje o maior cabo eleitoral de Jader. Os ataques o tornaram uma unanimidade no partido como candidato a presidente do Senado”, avaliou o senador Pedro Simon (PMDB-RS). O problema é que o PMDB, mesmo mantida a aliança com os tucanos, não tem os votos necessários para eleger Jader. Na terça-feira 12, as oposições se unem num mesmo bloco parlamentar, tornando-se com seus 17 votos a terceira maior força do Senado. PT, PDT, PPS e PSB já decidiram que não votam em Jader nem em candidato apoiado por Antônio Carlos. “Não vão conseguir usar a oposição para fazer discurso de falso moralismo, eles que se resolvam”, diz a líder do PT, Heloísa Helena (AL). A oposição pretende também tirar ACM da presidência do processo sucessório no Senado. “Como um dos alvos de investigação, Antônio Carlos tem de se afastar e passar o comando ao vice-presidente, Geraldo Mello (PSDB-RN)”, diz Roberto Freire.

O bate-boca em plenário está custando caro aos brigões. A estratégia do PMDB era preservar Jader, deixando ACM falar sozinho. Mas, na noite da terça-feira 5, resolveu mudar de tática e escalar Pedro Simon para contrapor os ataques diários de ACM e fazer um discurso cobrando investigações das denúncias contra o cacique baiano. Não deu certo. Na hora H, Simon não teve a veemência costumeira e permitiu um forte contra-ataque de Antônio Carlos. De seu gabinete, onde assistia aos debates pela TV Senado, Jader não gostou do que ouviu, ignorou os conselhos de correligionários e partiu pessoalmente para a tréplica. Fez isso mesmo sabendo que estaria tornando mais difícil sua eleição. “A questão moral extrapola a disputa política”, justifica. Se essa opção pelo confronto pode prejudicar o projeto político de Jader, está saindo bem mais cara para ACM.

Ao proclamar publicamente que a empreiteira de sua família sempre que pode pratica corrupção, no mínimo transformou em suspeitos todos os contratos da OAS para obras públicas. E não são poucos. Na Bahia, por exemplo, a construtora reina absoluta nos empreendimentos bancados por verbas públicas. Para barrar a ascensão de seu desafeto, ACM acabou pondo fogo nas próprias vestes, confirmando denúncias de que seus familiares no comando da OAS usam métodos ilegais e aéticos para conseguir obras nos governos federal, estaduais e municipais. Do ponto de vista estritamente técnico, sua declaração já é suficiente para a criação de uma CPI sobre a OAS, admite até mesmo o líder de seu partido, Hugo Napoleão (PI): “Do ponto de vista legal, teríamos ali o chamado ‘fato determinado’, capaz de deflagrar uma CPI.” ACM vai pagar um preço alto também no PFL, que debitará integralmente em sua conta o provável fracasso da candidatura Inocêncio Oliveira (PE) à presidência da Câmara.