Vivemos uma época de simulacros, em que as representações prevalecem sobre as coisas e filtram a nossa percepção do mundo, estabelecendo enfim uma ficção da realidade, muito mais atraente que a realidade em si. Julian Barnes decidiu radicalizar estas idéias em seu novo livro Inglaterra, Inglaterra (Rocco, 256 págs., R$ 28). No seu romance mais original e estimulante, a executiva Martha Cochrane é contratada para ajudar o megalômano magnata Jack Pittman a executar um projeto ambicioso: recriar a “velha Inglaterra” na pequena ilha de Wight, de forma que seja possível aos turistas conhecer todos os pilares da história e da cultura inglesas num único final de semana.

Pittman proclama-se governador deste duplo da realidade, muito apropriadamente batizado de Inglaterra, Inglaterra, uma versão em fantasia technicolor de um original monocromático e decadente. É claro que a função desta Disneylândia britânica é transformar o país num caça-níqueis, num pacote turístico, num objeto de consumo. Mas o império do efêmero pode ser demolido pela mulher que ajudou a realizá-lo. As implicações do enredo, no entanto, são mais profundas do que parecem. Barnes não se limita a ironizar o delírio dos poderosos numa sociedade sem alma. Ele faz o leitor pensar sobre o sentido da cultura e da História, a fragilidade das referências em que se baseia a identidade de um povo, além do culto à celebridade, o papel da imprensa, os valores morais e a lógica amoral dos grandes executivos.