Sim, ela é a filha do genial João Gilberto com a cantora Miúcha – irmã de Chico Buarque de Hollanda – e nasceu em Nova York em pleno boom da bossa nova nos Estados Unidos. Mas, aos 33 anos, e logo no primeiro disco, Bebel Gilberto conseguiu se safar da imposição genética para brilhar no olimpo. Seu álbum Tanto tempo, lançado na Europa e nos Estados Unidos pelo selo Ziriguimboom e aqui pela Universal Music, agradou em cheio aos americanos. Até agora já vendeu mais de 200 mil cópias. Bares e restaurantes descolados de Nova York tocam o disco sem parar. E, no Canadá, a canção So nice, versão em inglês de Samba de verão, dos irmãos Marcos e Paulo Sérgio Valle, chegou ao primeiro lugar nas rádios locais, na categoria world music. Tanto tempo – que traz composições próprias e releituras de clássicos do movimento musical do qual papai João foi um dos criadores – mistura o clima jazzy da bossa nova com ingredientes eletrônicos, num tom exato de sofisticação e apelo popular.

Bebel está em turnê pelas principais capitais européias e americanas. Até o momento realizou 56 apresentações, sempre elogiadíssimas pela crítica. Em janeiro chega ao Japão. Por causa do enorme sucesso no Exterior, o Brasil ainda não tem data marcada para conhecer ao vivo o talento, a voz aveludada e as composições de Bebel. “Talvez eu faça um show surpresa no Rio, em fevereiro. Não tenho pressa”, disse ela a ISTOÉ, durante rápida passagem pelo País para divulgar seu trabalho. Bebel é assim, quando fala da carreira, uma das expressões que repete é “sem pressa”. Talvez seja herança baiana. Talvez simplesmente saiba que tudo na sua vida acontece sem muita previsão ou planejamento. Engana-se, por exemplo, quem imagina que ela sempre teve vontade de cantar só por ter sido criada num ambiente de muita e boa música. O teatro veio em primeiro lugar. Atuou numa peça ao lado da tia Marieta Severo e na novela global Bebê a bordo. Mas não teve muito jeito. Bebel nasceu cercada de sons por todos os lados e conviveu com os grandes da MPB.

Desde a adolescência, arriscava composições junto aos amigos. Sobretudo com os então barões vermelhos Cazuza e Dé. Mais feliz, registrada no disco de estréia, é dessa época. Como faz ainda hoje, compunha no piano, que aprendeu a tocar de ouvido. Violão, a moça não toca. Em 1991, decidiu passar um tempo em Nova York. Foram oito anos. De lá se mudou para Londres, no ano passado, para morar com o namorado, o consultor financeiro francês Régis Soublin. Apesar de ser filha de quem é, Bebel nunca vestiu a camisa de celebridade em Nova York. Pelo contrário, até hoje tenta desvincular sua imagem principalmente do mito paterno, único assunto do qual se esquiva falar. “Ele é um pai muito divertido, bem-humorado, mas não quero dar uma de Nancy Sinatra e viver à sombra do meu pai”, justifica. Enquanto estudava música e inglês na Big Apple, trabalhou como babá, modelo vivo para estudantes de belas artes e maquiadora por um dia. Aos poucos, conheceu músicos vindos do mundo todo e, na Bélgica, gravou seu CD. O projeto foi crescendo e agregou amigos como João Donato e Carlinhos Brown, o nipo-americano Towa Tei, do grupo Dee Lite, e o produtor iugoslavo Suba. Grande responsável pela sonoridade moderna do álbum, Suba não chegou a curtir o trabalho pronto. Pouco antes de finalizá-lo, no ano passado, morreu asfixiado num incêndio em seu apartamento, em São Paulo. Chegou-se a pensar que a fita master do disco também tinha sido destruída, mas o produtor a havia guardado no seu estúdio. “Tive muito medo de continuar sem ele. Era uma pessoa muito especial, iugoslavo com humor de brasileiro.”