Mulheres, relaxem. Quando seu parceiro vier com aquele papo de que não entende o sexo feminino, que mulher é muito complicada e vive de TPM, dê de ombros. O problema não é só hormonal. As mulheres são muito mais complexas do que se imaginava, mas a culpa é da genética, mais especificamente do cromossomo X.

Dois estudos publicados na semana passada na revista britânica Nature esquentam a guerra dos sexos. Ao sequenciar o cromossomo sexual X, pesquisadores americanos identificaram 1.098 genes ativos. Descobriram que as mulheres têm 15% mais genes do que os homens e por isso produzem doses mais elevadas de certas proteínas. Nesse intrincado quebra-cabeça genético suspeita-se que estariam guardados os mistérios capazes de explicar algumas das diferenças na biologia e no comportamento de homens e mulheres. Nesse quesito, o sexo frágil sai na frente.

Durante a evolução humana, o cromossomo masculino, o Y, perdeu terreno
para o feminino, o X. Atualmente, o Y tem um terço do tamanho do X e possui
apenas 100 genes ativos, principalmente usados na formação e no funcionamento dos testículos. As outras funções do organismo dos homens vêm do cromossomo
X, herdado de suas mães. O achado é tão importante que os próprios
pesquisadores sugerem ser preciso lidar com dois genomas distintos, um
para os homens e outro para as mulheres.

Todo ser humano possui 46 cromossomos, que se agrupam em pares em cada célula do corpo. Dentro dos cromossomos ficam os genes que compõem o DNA, a molécula na qual estão as informações genéticas de um indivíduo e que funciona como uma receita da vida. Desse conjunto de cromossomos, dois são sexuais. Na mulher eles se expressam como XX e nos homens, como XY. Como nas mulheres eles aparecem em dobro, a própria evolução se encarregou de desativar um dos X para que houvesse um equilíbrio natural entre os sexos.

A chave dessa complexidade está justamente nesse X adormecido. Sabia-se que alguns de seus genes entravam em ação apenas quando a cópia, localizada no outro X, apresentava defeito. “É como se a mulher, ao nascer, recebesse duas chaves para abrir uma porta. Mesmo se ela perder uma delas, ainda assim vai conseguir abrir a porta. O homem só recebe uma chave”, diz Emmanuel Dias Neto, geneticista do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP). Isso explica por que muitas doenças características do cromossomo X só se expressam nos homens, como hemofilia, distrofia muscular e daltonismo.

Ao analisarem o comportamento genético de 40 voluntárias, porém, o que os cientistas descobriram é que 25% dos genes que deveriam estar desligados estão mais ativos do que nunca, fabricando proteínas responsáveis por coordenar e executar as funções do organismo. Outros 10% dos genes se expressam de maneira diferente entre as próprias mulheres. Apenas 75% dos genes estão permanentemente inativos. Significa que as mulheres possuem entre 200 e 300 genes a mais do que os homens. “Os efeitos desses genes do cromossomo X inativo podem explicar algumas das diferenças que não são atribuídas aos hormônios sexuais”, diz Laura Carrel, pesquisadora da Universidade do Estado da Pensilvânia e uma das autoras do estudo.

Receita – Apesar da importância da descoberta, ainda é cedo para saber o que significa na prática essa duplicidade de ações da genética feminina. Isso pode trazer tanto boas quanto más respostas. Afinal, imagina-se que um gene que vem duplicado no organismo feminino possa causar algum tipo de desordem genética. Ou não. “É como se para um mesmo bolo a mulher usasse o dobro de alguns ingredientes usados pelos homens”, exemplifica Emmanuel Neto.

De qualquer forma, a expectativa é grande. Os cientistas esperam conhecer o funcionamento das doenças nos dois sexos e ainda produzir medicamentos que respeitem essa diversidade. “Poderemos entender como pessoas de uma família com a mesma mutação genética apresentam doenças com quadros tão diferentes”, diz a geneticista Mayana Zatz. Como se vê, de sexo frágil a mulher não tem nada.