Um número cada vez maior de pessoas começa a prestar atenção em uma proposta que sugere ao paciente um papel mais ativo no tratamento, que não estaria limitado a tomar remédios e a observar o trabalho do médico. Mais conhecida como autocura, ela procura mostrar que o sucesso da terapia depende da disposição do doente em mobilizar seus recursos interiores para ir à luta. Esse conceito inclui desde programas para exercitar músculos até técnicas para sacudir a mente. O assunto é sedutor. Recentemente, os workshops do terapeuta ucraniano Meir Schneider, feitos no Rio de Janeiro e em São Paulo, atraíram centenas de homens e mulheres dispostos a aprender os exercícios criados por ele, entre os quais treinar a visão para perto e para longe por meio de uma tarefa simples: olhar o horizonte.

Outro evento disputado aconteceu em São Paulo no mês passado. A terapeuta italiana Gioia Panozzo revelou como venceu um tipo raro de câncer de estômago ao aliar técnicas de meditação ao tratamento médico. “Mergulhava mentalmente no meu corpo junto com o líquido injetado durante a quimioterapia. Relaxava profundamente e sentia que limpava os órgãos com minhas mãos”, conta. Sua recuperação impressionou os especialistas, tornando-a parceira de trabalhos desenvolvidos por instituições como o Núcleo de Estudos de Psicologia da PUC, que investiga as relações da mente com o organismo e a saúde.

Gioia participa também dos estudos chefiados pelo oncologista Mariano Bizzarri, pesquisador da Universidade La Sapienza (Itália) e membro da junta médica que cuida do papa João Paulo II. “O sistema de defesa do organismo está relacionado com a mente, que precisa ser exercitada. A meditação imaginativa ou visualização é um recurso para ativar as forças que melhoram as respostas imunológicas”, garante o médico. Com o apoio de uma dessas técnicas, somada ao tratamento com medicamentos, a historiadora Vera Bertacchi, 52 anos, derrotou um tumor de mama. Hoje, ensina o método para os alunos dos cursos do grupo paulistano Re VIDA, que atende pessoas com câncer. “Peço a eles que se imaginem cortando e chupando um limão. Quase todos reagem com salivação ou arrepios. Trabalhamos em cima da relação entre as imagens e as reações. A partir daí, visualizamos a luta entre o sistema de defesa do corpo e o câncer”, diz.

Vera se preocupa com o uso inadequado do termo autocura. Seu receio é que pessoas em tratamento médico deixem de seguir a orientação do especialista. “A visualização é uma terapia complementar”, ressalta. Schneider afirma que seu método, denominado Self-Healing (autocura), não tem nada a ver com práticas esotéricas. “Proponho uma espécie de reprogramação do corpo e do cérebro, ativando músculos que nem suspeitamos que existam”, assegura o terapeuta, PhD em distrofia muscular pela Universidade de Golden State, na Califórnia. Ele acredita que o ser humano pode ser agente da própria cura. Sua história ilustra a tese. Até os sete anos, Schneider tinha apenas 10% de visão, em razão de uma catarata grave. Inconformado, passou a exercitar os olhos com uma técnica que inventou. Garante que recuperou 80% da visão.

De acordo com Schneider, a autocura ajuda a combater outros males, como miopia, lesão por esforço repetitivo e complicações musculares. A engenheira Valéria Portugal, 33 anos, usa a técnica para cuidar de uma rara degeneração das retinas que a impede de enxergar direito. “Oftalmologistas me disseram que ainda não há tratamento para o problema. Mas, desde que adotei o método, leio mais confortavelmente e consigo ver as placas de rua”, afirma.

Apesar de refutado por vários médicos, o Self-Healing começa a ter o aval de alguns especialistas brasileiros. Na Universidade de São Carlos (SP), o método é usado para tratar pacientes atendidos pelo SUS. Também o oftalmologista Mauro Rabinovic, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, já recomendou a técnica para alguns pacientes. “Ela ensina às pessoas a aproveitar ao máximo o pouco de visão que têm”, afirma. Mas faz um alerta: “O método não substitui os tratamentos convencionais, como a cirurgia.”