Se Aladim não fosse fábula mas personagem real, com certeza o governo federal iria tarifar a lâmpada maravilhosa. Gostei e ri dessa frase,
ri para não chorar diante da disparada dos valores da conta de luz – o consumo de energia no Brasil ficou R$ 3 bilhões mais caro no primeiro semestre desse ano e, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica, os números continuarão rumo à estratosfera. A tal frase de que gostei, eu ouvi de uma amiga, na verdade mais conhecida que amiga, com a qual converso quando passo no lava rápido em Santa Cecília, próximo ao ponto do táxi que me leva ao trabalho – talvez eu seja o único paulistano que não tenha carro e nem dirija a entrar num lava rápido para um simples “bom dia”. Voltando à luz, a minha amiga constatou que, dia sim, dia não, saem notícias ruins sobre a energia. Ela uniu os pontos do que leu e não gostou do desenho que eles formaram: atrasos em obras de geradoras e distribuidoras causaram um prejuízo de quase R$ 9 bilhões, e novas majorações estão previstas para o segundo semestre na casa dos 43%. Gostou menos ainda quando entendeu um dos principais motivos de tudo isso.

Antes de eu contar a explicação que ela me deu, nada mais justo do que apresentá-la melhor ao leitor: chama-se Elvira Cansada, deixando claro que Elvira é nome de verdade e Cansada é sobrenome que se autoatribuiu quando certa vez botou a maior fé numa mega sena acumulada e eu lhe falei do cronista, compositor e locutor esportivo Antonio Maria, que se definia como “brasileiro, profissão: esperança”. Ela me respondeu “então eu sou a Elvira Cansada”, a coisa pegou, e acho que é da esperança que Elvira cansou. A moça trabalha no lava rápido enfiada em macacão cenoura e botas de borracha preta, e irradia jogos de futebol imaginários enquanto esguicha carros (acha que a CBF precisa de uma operação que ela chamaria de Lava Jato e Rápido). Guarda notícias de revistas e jornais que lê começando sempre pela última página, e é fácil saber se sua cabeça está no polo da alegria ou no do mau humor – se mal humorada, é eu passar e ela gritar “vontade de espreguiçar na esquina”, sem que eu saiba até hoje o que isso significa. Seus finais de semana, Elvira classifica como oqueizinhos, normais e sensacionais – e nisso contam as notícias.

Elvira ficou injuriada quando, na semana passada, se viu a Aneel e o Ministério de Minas e Energia trombando no escuro: garantiu-se na Esplanada que não arcaríamos com eventuais melhorias no fornecimento de energia, mas dias depois a Aneel declarou que o consumidor terá de pagar sim. Elvira é simples, mas burra não é não. E quando diz “aí vem fino rebuliço” é porque a coisa é séria. No último sábado, dia de Santo Antonio (ela é devota mesmo de São Genaro), me deu a explicação sobre a disparada do preço da luz: o custo da energia com o qual estamos arcando vem lá de 2012 quando o governo forçou as distribuidoras a diminuírem o valor das contas se quisessem antecipar a renovação das concessões. Claro que ia dar curto circuito, o barato saiu caro. A prova maior do erro é o fato de a Comissão de Valores Mobiliários ter acabado de condenar a União à multa de R$ 500 mil porque, nessa história de antecipar as concessões, ela própria, União, votou contra os interesses da Eletrobras – causou-lhe prejuízo, mesmo sendo acionista, desrespeitando a Lei das Sociedades Anônimas. Elvira considera que a questão da luz merece uma operação Lava Rápido, e que a jogação de culpa na falta de chuva é tão tola que dá “vontade de espreguiçar na esquina”.

Antonio Carlos Prado é editor executivo da revista ISTOÉ