Um superescâner, capaz de reproduzir partículas que são 20 vezes mais finas que um fio de cabelo, desvendou um dos mais antigos e instigantes mistérios da história da arte: por que a expressão de Mona Lisa, pintada por Leonardo Da Vinci, é tão enigmática? Esse equipamento foi desenvolvido pelo National Research Council (NRC), do Canadá, e fez com que o célebre (e maroto) sorriso da musa deixasse definitivamente de ser um segredo. O mesmo aconteceu com a mágica de cores que compõe os seus olhos e a faz observar quem a contemple, seja pelo ângulo que for, num dos mais nobres salões do Museu do Louvre, em Paris. De volta ao escâner, é importante registrar que ele reproduz imagens coloridas em três dimensões com resolução de 113 megapixels, e isso significa uma capacidade oito vezes maior em relação à mais potente câmera digital do mercado. É aí que está a chave da história.

Pintada numa prancha de madeira de 77 centímetros por 53 centímetros, entre 1503 e 1506, a Mona Lisa começou a dar sinais de desgaste há dois anos quando diretores do Louvre contrataram uma equipe de 36 cientistas para avaliar o seu estado de conservação. A equipe do NRC ficou responsável pelo check-up e em 16 horas escaneou a pintura. Preso a um cavalete diante do quadro, esse escâner realizou uma varredura da tela, reproduzindo quatro centímetros de cada vez. As imagens geradas mostraram que a prancha de álamo onde Da Vinci pintou a sua obra-prima está 12 milímetros empenada na sua metade superior (onde se vê o sorriso) e a tinta apresenta rachaduras que ameaçam se abrir cada vez mais.

A equipe técnica esperava acabar aí o seu trabalho, uma vez que a conservação do quadro era o que estava em jogo – e, assim que fosse totalmente restaurada, a Mona Lisa continuaria desafiando a humanidade com os seus mistérios. Os cientistas estavam enganados. Construído cinco séculos após a época em que Da Vinci viveu e dotado da mais alta tecnologia, o escâner canadense mergulhou na Mona Lisa em três dimensões: profundidade, largura e superfície. Isso permitiu que, pela primeira vez, se compreendesse o que o mestre do Renascimento fez com seus pincéis para obter o misterioso e incrível sfumato – palavra italiana que traduz os efeitos de névoa ou fumaça, até então nunca vistos, que contornam a boca e os olhos de sua musa. Essa técnica, uma exclusividade de Da Vinci, era mantida sob sete chaves. Eis o que o escâner revelou: Da Vinci foi mais genial do que previam seus estudiosos. Eles supunham que o mestre tinha usado a ponta dos dedos ou uma esponja no canto dos olhos e dos lábios da Mona Lisa. Nada disso: Da Vinci foi apenas paciente, ao longo de três anos, para pintar pontos microscópicos que, juntos, formaram uma área enfumaçada. É esse efeito que deu à Mona Lisa o ar tão enigmático. Ou, pelo menos, dava: desfeita friamente a sedução, muita gente jamais voltará a admirá-la com os mesmos olhos.