05/06/2015 - 20:00
Paris para apaixonados. Caminhar e sentar em um dos charmosos boulevares, tomar champanhe observando as luzes da torre Eiffel, percorrer a avenida Champs Elysees até chegar ao Arco do Triunfo e, por fim, cruzar as pontes do Sena e pendurar um cadeado como símbolo de amor e união na Pont des Arts, sem esquecer de jogar a chave no rio. O roteiro típico dos enamorados, porém, não deverá se repetir graças a uma medida da prefeitura de Paris que determinou a retirada de mais de 900 mil cadeados, que pesavam cerca de 45 toneladas, fixados por casais ao longo dos últimos anos na belíssima ponte. A decisão, apoiada também pela Câmara dos Deputados, levou em consideração razões estéticas e o risco ao patrimônio histórico. “Os cadeados não colaboravam em nada com a paisagem e estavam causando problemas em função do peso”, afirma Nilson Ghirardello, arquiteto e urbanista da Universidade Estadual Paulista (Unesp). “O guarda-corpo da ponte poderia desabar a qualquer momento, causando um grande estrago para o centro histórico da cidade.” As grades foram substituídas por uma exposição temporária de arte de rua de 56 painéis ao longo dos 150 metros da ponte.
MUDANÇA
Casais que costumavam ir à Pont des Arts colocar um cadeado, jogar a chave
no Sena e fazer uma selfie (abaixo) deverão encontrar, a partir
de agora, 56 painéis de arte de rua (acima)
Projetada pelos arquitetos Louis-Alexandre de Cessart e Louis Gerald Arretche, a Pont des Arts se manteve firme até meados do ano passado, quando uma parte do gradil começou a desmoronar em função do peso excedente. A remoção dos cadeados sempre foi polêmica entre visitantes, moradores e autoridades, já que a maior parte dos turistas reconhecia a intervenção como parte integrante do roteiro entre o Museu do Louvre, a Academia Francesa e a Ile de la Cité. Prova disso, é que recentemente a tradição se espalhou e quem visita Paris consegue avistar outras pontes menores e menos famosas sendo tomadas por cadeados do amor.
Enquanto um grupo de pessoas, principalmente turistas, se sensibilizava com a retirada dos cadeados, parte da população local classificava o ritual romântico como um ato de vandalismo. A moradora americana Lisa Anselmo criou a campanha “No Love Locks” (não aos cadeados do amor), sob o slogan “Liberte seu amor, salve nossas pontes”. Lisa comemorou a decisão da remoção e a classificou como uma “pequena vitória”. A campanha foi criada por ela em janeiro de 2014, em parceria com a amiga também americana Lisa Taylor Huff, que vive em Paris desde 2006. “Foi uma iniciativa para aumentar a conscientização em relação ao problema.” Na internet, elas chegaram a fazer uma petição on-line pela retirada dos objetos de metal que já conta com mais de 10 mil assinaturas. Atendendo aos pedidos das jovens e de outros moradores, o vice-prefeito de Paris, Bruno Julliard, decidiu pelo fim dos cadeados, alertando que até a navegação no rio Sena corria riscos.
Desde a manhã da segunda-feira 1, agentes da prefeitura interditaram a passagem na ponte para que os funcionários retirassem os gradis. Cada lâmina chegava a pesar 500 quilos. Em outros países da Europa problemas semelhantes chamaram a atenção de arquitetos e urbanistas. Em Roma, na Itália, a fonte dos desejos em frente à imponente construção Fontana Di Trevi guarda a tradição de que o turista que jogar uma moeda nas águas voltará à cidade novamente. Nesse caso, segundo o arquiteto da Unesp, a diferença está na reversibilidade do processo. “As pessoas desejam interagir com as cidades e quando essas ações podem ser revertidas não há problemas”, diz Ghirardello. “A prefeitura pode retirar as moedas da fonte periodicamente, já em Paris trata-se de uma ação irreversível.” De agora em diante, os enamorados precisarão encontrar novos símbolos para eternizar sua passagem pela Cidade Luz. Em tempo: a prefeitura parisiense prometeu não jogar fora os milhares de cadeados fixados na ponte, em respeito às promessas de amor representadas neles. Casais do mundo todo agradecem.
Fotos: AURÉLIEN MORISSARD/CITIZENSIDE; DOMINIQUE FAGET/AFP PHOTO; STEPHANE DE SAKUTIN/AFP PHOTO