Se você nunca ouviu falar em Ana Ferreira, vai se surpreender. Ela acaba de lançar seu primeiro livro, Amadora (Geração Editorial, 150 págs., R$ 25), injetando um novo fôlego à literatura erótica. Ana evita admitir traços biográficos na fogosa protagonista, capaz de se relacionar em uma mesma noite com três homens, tudo para esquecer um quarto, pelo qual temia ser rejeitada. Na contramão das obras eróticas, a personagem Ângela é movida por amor. Ao contrário de A casa dos budas ditosos, de João Ubaldo Ribeiro, por exemplo, os jogos amorosos são contados – em primeira pessoa – pela ótica de uma mulher, o que dá um delicado e verossímil sabor à obra. “Não me convenci de que Budas ditosos é narrado por uma mulher. Não me deu tesão nenhum”, provoca Ana.

O título Amadora é de intencional duplo sentido. A protagonista age como uma iniciante – “no fundo, ela é muito pura e por isso mesmo acaba chocando”, admite a autora – e se comporta como uma experiente amante. No início o livro pode parecer uma obra de contos. Mas não. Há uma cuidadosa costura em cada capítulo, com um fim inesperado. O mais impressionante é que Ana Ferreira, 36 anos, nascida em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, é filha de pais professores, foi criada em colégios católicos e nunca fez psicanálise. Sua falta de autocensura para descrever cenas eróticas em detalhes é fruto de uma afiada antena ficcional, de quem está sempre atenta ao que ouve, somada a um estilo profundo. “Tento pensar como a personagem”, simplifica.

Ana foi uma menina que sempre ganhou concursos de redação, embora nunca tivesse se assumido como escritora. Na adolescência, viveu em Londres e depois custou a se readaptar numa cidade do interior. Trocou então a arquitetura pelos cursos de dramaturgia e interpretação, com Antunes Filho, em São Paulo. Daí em diante atuou e escreveu muito. Foi premiada na jornada Sesc com a peça As Priscillas de Elvis, em 1996. Levou um ano para escrever Amadora, não por acaso quando saiu de dez anos de casamento. “Sou a favor da família e do casamento”, surpreende, para quem fala de sexo com uma desenvoltura de fazer inveja a Henry Miller ou Anaïs Nin. Ela nega ter sofrido influências, mas sempre foi uma leitora voraz, inclusive do próprio Miller.

Ana vai lançar uma peça com Marcelo Rubens Paiva, Closed show. Foi ele quem a estimulou a editar Amadora, depois de se encantar com os originais. “É um livro excitante. Ela abre o jogo de uma maneira deliciosa, com fantasias secretas e desejos proibidos”, elogia Paiva. A autora já tem dois outros livros engatilhados. Um sobre uma modelo que fica famosa do dia para a noite e outro inspirado em seu avô, cego a partir dos 15 anos e ainda assim casado com uma linda mulher que lhe deu muitos filhos e netos. “O livro vai mostrar o que seria sua vida se não tivesse perdido a visão”, antecipa.