amplo casarão que abriga a sede da Pastoral da Criança, em Curitiba, está em polvorosa. Indicada para o Prêmio Nobel da Paz, a entidade foi criada há 18 anos pela médica e sanitarista Zilda Arns Neumann. “Só pela mobilização do voluntariado, já ganhamos um grande prêmio”, diz a médica. Quando começou o trabalho de atendimento a crianças em bolsões de miséria, Zilda contava com meia dúzia de voluntários. Hoje a pastoral está espalhada por mais de 22 mil comunidades e sua rede de 150 mil voluntários vem mudando vergonhosas estatísticas. A taxa de mortalidade infantil, cuja média nacional é de 34,6 por mil nascimentos, cai para 13 nos lugares de atuação da entidade.

São 1,6 milhão de crianças cujo desenvolvimento é acompanhado mês a mês. Para vencer o drama crônico da desnutrição, a pastoral popularizou a multimistura, um complemento alimentar preparado com arroz, milho, casca de ovo e produtos que variam de região para região. Nas comunidades carentes, a multimistura é mais conhecida como “farinha milagrosa”. O custo do trabalho, já implantado em outros 12 países, também parece auxiliado pelos céus: menos de R$ 1 por criança, por mês Irmã de dom Paulo Evaristo Arns, cardeal emérito de São Paulo, a médica acredita que o combate à miséria e às injustiças sociais é essencial para a construção da paz. Inconformada com a violência no cenário mundial, ela também defende o ecumenismo. Não se trata apenas de discurso. Na Guiné-Bissau, por exemplo, a pastoral de Zilda é tocada, há cinco anos, por muçulmanos. “A prevenção contra a violência é fundamental”, defende. “Nenhum país vai se salvar se a solidariedade não for globalizada.”

A rede solidária foi indicada para o prêmio da paz no ano do centenário do Nobel, com outros 131 candidatos, sendo 29 instituições. As candidaturas não são públicas, mas sabe-se que a Cruz Vermelha, entidade humanitária internacional, está entre os fortes concorrentes. Na relação também estão Kofi Annan, o presidente da Organização das Nações Unidas (ONU) e as Avós da Praça de Maio, mães de desaparecidos políticos, que lutam para descobrir o paradeiro de seus netos, nascidos em prisões argentinas. O Brasil já concorreu ao prêmio em outras duas ocasiões. A primeira, em 1970, com dom Hélder Câmara, então arcebispo de Olinda e Recife. A segunda, em 1989, com dom Paulo, um dos 12 irmãos de Zilda. Ambos foram boicotados pelos governos militares. Os tempos mudaram. Desta vez, além de torcer a favor, o governo fez questão de oficializar a candidatura.


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