Um lugar charmoso, elegante, com mistério e sensualidade escondidos atrás de cada cortina, de cada pilastra e dos corpetes das damas que despertam nos cavalheiros instintos mais primitivos. Não se fala aqui de nenhum rendez vous ou casa de encontro, como alguns possam apressadamente imaginar. Depois de voltarem à cena na Europa e virarem febre em Nova York, os cabarés se tornaram a “nova” modalidade de entretenimento nas concorridas noites das grandes cidades brasileiras. Um passeio irresistível num universo dominado por fetiche, sedução, desejo e luxúria.

Célebres na França e na Alemanha, os cabarés viveram seu apogeu e declínio entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX. Agora ressurgem com força, para deleite daqueles que nem sequer eram nascidos quando a diva alemã Marlene Dietrich e a primeira-dama da música francesa Edith Piaff enfeitiçavam a assistência com doses de talento e lascívia. Esse é o caso da empresária paulistana Flávia Ceccato. Dona da Lov.e, boate que se tornou referência para a tribo da música eletrônica em São Paulo, Flávia está por trás do novíssimo Loveland. Inaugurado na metade de outubro, o cabaré abriu suas portas em alto estilo com show de uma convidada especial: a morena Michelle L’Amour, musa do teatro burlesco americano. No espetáculo de estréia, Michelle, com direito a plumas coloridas e um traje exíguo, elevou a temperatura ambiente com um rápido mas incisivo strip-tease.

A Loveland nasceu de um feliz acaso. Flávia desejava montar um bar que fugisse da desgastada fórmula boteco-com-estilo-carioca, que se proliferou na noite paulistana nos últimos anos. Depois de algumas pesquisas surgiu a idéia de resgatar do passado um modelo de diversão adulta que parecia relegado ao esquecimento. “Eu sempre gostei da estética do cabaré. Um lugar onde é possível juntar dança, teatro, música e outras intervenções artísticas. Tudo com muito bom gosto e sensualidade. Essa é a nossa proposta”, conta a empresária. Movidas pela curiosidade, cerca de 200 pessoas passaram pela casa logo nos primeiros dias de funcionamento.

Outra atração da casa, a cantora paulistana Ana Gelinskas está se tornando a primeira-dama do cabaré brasileiro. Loira, tatuada e dona de uma voz que alterna potência e doçura, ela busca nas divas do cinema e da música de décadas passadas a inspiração para o repertório e os ousados figurinos que desfila nos palcos. Entre suas referências estão as atrizes Marlene Dietrich, Hedy Lamarr, Betty Davis. E, claro, Liza Minelli, que levou o Oscar por sua interpretação no célebre musical Cabaret, de Bob Fosse, além das cantoras americanas Anita O’day e Carmen McRae. É nelas que se baseia para suas elogiadas performances. “Uma cantora de cabaré precisa interagir com o público. Estimular sua imaginação, mas sem jamais cair na vulgaridade”, explica Ana, que, antes de brilhar nos palcos, freqüentou os bancos da Boston University, nos Estados Unidos, onde se formou em arqueologia.

A “primeira-dama” se prepara para passos ainda mais largos. Ela tem planos para montar o seu próprio cabaré. Para isso, contará com a colaboração do estilista Heitor Werneck, seu sócio, que produz uma noite com o tema às segundas-feiras no restaurante Puri, da famosa rua Augusta, um centro de diversões noturnas na capital paulista. A casa da dupla deverá começar a funcionar no primeiro semestre de 2007.

Em plena atividade, o Cabaret Kalesa, na praça Mauá, zona portuária do Rio de Janeiro, conseguiu fugir do estigma de prostituição predominante na área e ferve sua pista de dança ao som de MPB. A idéia do DJ Marcelo Janot, 36 anos, é fugir do funk e de tudo que possa cheirar a modismo: “O que se massifica não entra no meu repertório”, garante. A idéia começou tímida, na inauguração da casa, em 1995. Mas o espaço entrou em decadência e fechou três anos depois, até reabrir em novembro do ano passado. Surgiu, então, a nova fórmula, que tem atingido a capacidade total de 550 pessoas aos sábados e movimentando as noites de sexta-feira, com predominância de gente jovem vinda da zona sul da cidade. As sessões vão das 22h às seis da manhã, basicamente ao som de “música brasileira de qualidade”, como classifica Janot.

Para não deixar de lado a aura dos inferninhos que povoam a região, o Kalesa reinaugurou oferecendo aos freqüentadores um show de strip-tease feminino e, logo depois, também masculino. Mas a cada vez que o dançarino começava a tirar a roupa a vaia vinha pesada. A solução, adotada desde janeiro, foi reunir os dois sexos no espetáculo de nudez. Ele é sempre realizado depois da 1h30, não dura mais do que cinco minutos e agrada em cheio. O clima dançante tem como pano de fundo um telão que exibe flashes de musicais de Hollywood. E, para agradar também aos apaixonados por música estrangeira, a casa dá uma canja de uma hora com repertório que vai do rock à disco music. De quebra, um minicarnaval ajuda a descontrair o início da noite. O público recebe máscaras de arlequim e narizes de palhaço, entre outros adereços, para animar a festa. Fica difícil resistir à nostalgia desse mergulho no passado.