Um sonho de meio século se torna realidade. Depois de entraves burocráticos justificados pelo temor de que o Brasil produzisse armas atômicas, finalmente entra em operação a primeira fábrica de combustível nuclear da América Latina. Trezentos profissionais trabalham no distrito de Engenheiro Passos, no município fluminense de Resende, a 180 quilômetros do Rio, para que a partir de maio de 2002 o Brasil inicie a produção em série de combustível nuclear, um monopólio das grandes potências como Alemanha, Holanda, Inglaterra, França, EUA e Rússia. “Países como a Índia e o Paquistão detêm a tecnologia, mas ela não é usada em escala industrial”, explica o gerente do projeto de enriquecimento de urânio da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), Ézio Ribeiro.

A execução do projeto deve reduzir pela metade a importação brasileira do combustível e tem como prioridade abastecer os reatores nucleares das usinas de Angra I e Angra II. Outra meta ambiciosa: assegurar o acesso ao restrito e rentável mercado internacional de urânio enriquecido, que movimenta US$ 3,5 bilhões anuais e em cinco anos deve chegar a US$ 5 bilhões. O Brasil também quer exportar parte da produção. Em 2000, o País vendeu urânio enriquecido para a Argentina.

“Tivemos de obter a tecnologia através do esforço de pesquisadores brasileiros, civis e militares, e nem sequer contamos com a colaboração dos Estados Unidos e da Europa para a compra de máquinas”, explica o superintendente de produção do combustível nuclear da INB, Renato Costa. Gastou-se US$ 1 bilhão no projeto, ou 10% do despendido no acordo nuclear assinado com a Alemanha em 1975.

Na tecnologia adotada e desenvolvida pela Marinha, ultracentrífugas, girando a altíssima velocidade, separam o urânio destinado à geração de energia do urânio natural. A fábrica de Resende vai enriquecer o urânio em até 5%. Para a produção da bomba atômica, que não faz parte dos planos brasileiros, seria preciso um enriquecimento acima de 90%.

Hoje o Brasil importa combustível nuclear da americana Westinghouse ou do consórcio europeu Urenco, formado pela Alemanha, Holanda e Inglaterra. As primeiras investidas em tecnologia nuclear foram feitas na década de 70. Pressões internacionais impediram que algumas centrífugas fossem embarcadas na Alemanha e trazidas para o Brasil. As restrições à cessão de tecnologia nuclear não foram suspensas pelos integrantes do Grupo dos Paíse Ricos (G-8) nem depois que o governo brasileiro aderiu ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, no primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. É a garantia de que o País descarta de seus planos a criação da bomba atômica.