Lançado esta semana, o livro "O Sonho de Carmem – Como a Sociedade Ajudou a Transformar 
a História do Câncer no Brasil", do escritor Eduardo Bueno, é uma bela homenagem à mulher que mudou a história do câncer no Brasil. Ao contar a saga de Carmem e do médico Antônio Prudente, fundadores do A.C.Camargo Cancer Center, o escritor Eduardo Bueno faz um balanço da trajetória do hospital que, nessas seis décadas, consolidou-se como referência nacional e mundial na luta contra uma das doenças mais frequentes dos dias atuais. Bueno traça também um importante retrato do papel das instituições que fizeram diferença no combate à doença no País. Se você tiver um tempinho, dê um pulo lá. Vale conhecer a história dessa gente corajosa que foi à luta para melhorar o panorama do câncer no País e batalhar pelos investimentos em atendimento e pesquisa. Gente movida pelo altruísmo e profundo interesse na medicina e no ser humano. E com noção acurada dos passos fundamentais a serem dados para construir o futuro. 

Veja, abaixo, um dos textos da exposição que reúne fotos e passagens relatadas no livro que pode ser vista até 18 de fevereiro no Conjunto Nacional: 

Opostos atraídos no amor e contra o câncer

"Eles viveram um fulgurante caso de amor. Foi como se todos os ingredientes se fundissem para tecer a trama de um  clássico romance hollywoodiano das décadas de 1930 e 40 – até porque tudo de fato se iniciou naqueles anos simultaneamente dourados e turbulentos. Eles se conheceram a bordo de um transatlântico de luxo, singrando rumo à Europa. Mas não foi amor à primeira vista – e nada mais natural que não tivesse sido, já que um era virtualmente a antítese do outro. Ele era alto, calado, quase taciturno. Ela era baixa, agitada, quase explosiva. Ele era um paulista quatrocentão, vinculado à classe cafeicultora. 
Ela era gaúcha das Missões, descendente de imigrantes açorianos; de classe média. Ele provinha da elite civil que 
recém havia sido deposta pelo grupo do qual o pai dela fazia parte. 
Ele acreditava no poder da ciência e do silêncio; ela, no som das palavras e nos laços sociais. Ambos sabiam ser 
intensamente persuasivos. 
À medida que o tempo escoava a bordo, como a água sob o casco do navio, os opostos foram se atraindo. E então, num arroubo surpreendente, certa noite, em meio a um jantar, ele passou a ela, por debaixo da mesa, o livro que havia escrito.
Não eram poemas, não era prosa. Era…um estudo sobre o câncer. No frontispício, ele grafou uma dedicatória: “Que 
Deus nos una para sempre e que nosso pensamento seja um só: a luta contra essa doença terrível”. 
Dois meses depois, já de volta ao Brasil, em 28 de dezembro de 1938, na Igreja do Rosário, no Rio de Janeiro, 
eles se casaram. Ficariam juntos até que a morte os separasse. 
Se a ligação entre Antônio Prudente (1906-1965) e Carmem de Revoredo Annes Dias (1912-2001) tivesse sido 
somente um longevo e fervoroso caso de amor, já seria tocante o suficiente e poderia até dar origem a alguma 
minissérie televisiva. Ainda assim, interessaria basicamente a eles, seus parentes e amigos. Mas, como o 
próprio Prudente havia sugerido – quase profetizado – na dedicatória visionária, aquela paixão iria se tornar 
uma das pedras angulares da luta contra o câncer no Brasil. Afinal, embora sua união não tenha gerado rebentos, 
foi capaz de lançar as bases do Hospital A.C.Camargo, atualmente A.C.Camargo Cancer Center. 
“Não tivemos filhos”, costumava dizer Carmem. “Exceto um, de concreto."

Abaixo, outro texto da exposição sobre a descoberta de uma alteração genética que aumenta as chances de câncer 

A mutação dos tropeiros

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Antônio Prudente era descendente de tropeiros – e o hospital que ele fundou em abril de 1953 iria contribuir 
decisivamente, meio século depois, para a descoberta de que, devido a uma mutação específica no gene TP53 que 
ocorre mais frequentemente na população brasileira do que em qualquer outro lugar do mundo, uma a cada 
330 pessoas nascidas nas regiões Sul e Sudeste do País apresenta alto risco de 
desenvolver determinados tipos de câncer, resultando que nessa zona do Brasil ocorra a maior concentração mundial 
de casos da chamada Síndrome de Li-Fraumeni. E tal mutação, responsável pela maior incidência de tumores 
(que se manifestam tardiamente, o que permite que seus portadores vivam mais e, portanto, passem a mutação adiante) 
teria se espalhado por meio de um tropeiro que percorria a rota entre Sorocaba (SP) e Porto Alegre (RS) durante 
o século XVIII.


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