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Vitória de Pirro? Apesar de o partido Likud, de Sharon, ter esmagado os trabalhistas nas urnas, a abstenção foi a mais alta da história

As pesquisas de opinião da semana passada em Israel indicavam que 70% dos eleitores do país querem a paz com seus vizinhos árabes. No entanto, a maioria destes cidadãos foi às urnas na terça-feira 6 para eleger o linha-dura Ariel Sharon, líder do partido Likud, ao cargo de primeiro-ministro. Nada menos do que 62,5% cravaram o nome do candidato da ultradireita, contra 37,4% que optaram pelo primeiro-ministro trabalhista Ehud Barak. O ato poderia ser considerado apenas um tributo a esse general de 72 anos, um dos mais respeitados estrategistas de Israel que, em 30 anos de carreira política, ocupou seis vezes o ministério. Mas Sharon tem muito mais em seu currículo para que possa passar apenas como um velho estadista. Por exemplo: em 1953, em Qibya, uma cidade jordaniana fronteiriça, ele era o líder do esquadrão antiterrorista “101”, que assassinou 69 árabes, sendo a maioria mulheres e crianças. Nos anos 70, Sharon foi o grande arquiteto dos assentamentos de colonos judeus em territórios palestinos ocupados depois da guerra de 1967, que hoje se transformaram em grandes barreiras para a paz. Em 1982, já como ministro da Defesa israelense, o general Sharon comandou a invasão do Sul do Líbano, que acabaria somente 18 anos depois, numa decisão do primeiro-ministro Ehud Barak, seu rival nas eleições de agora. Na época, como apontou uma comissão de inquérito, Sharon também foi o responsável pelos massacres nos campos de Sabra e Shatila, nos quais cerca de dois mil refugiados palestinos foram assassinados por milícias cristãs libanesas pró-israelenses. E, mais recentemente, cercado por mil guarda-costas, Sharon foi ao Templo da Montanha – um dos mais sagrados ícones para muçulmanos e judeus, na cidade velha de Jerusalém. Deste modo, provocou a ira palestina, servindo de estopim para a nova Intifada (revolta em árabe), série de explosões de violência que abalou a região há cinco meses e já fez quase 300 mortos, a maioria esmagadora de palestinos.

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Réquiem para Oslo – O Sharon candidato concorreu sob uma plataforma que promete a busca da paz. Mas, ao mesmo tempo, ele insiste que Jerusalém é inegociável e também é contra o esquema de troca de terras por paz, que é o “espírito de Oslo”, o acordo de paz entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina de 1993. “Oslo está morto”, proclama Sharon. Assim, na visão dos palestinos e de seus aliados árabes, Israel elegeu um piromaníaco para apagar um incêndio que ele próprio vem alimentando há anos. “Este é o evento mais idiota da história de Israel”, sentenciou Yasser Abed Rabbo, ministro da Informação da Autoridade Palestina. “Um povo que realmente deseja a paz, não pode eleger um guerreiro genocida como líder”, completa Rabbo. Mas a realidade no Oriente Médio, sabe-se, é muito mais complicada e sempre desmente visões generalizantes. As eleições de agora, na verdade, não atestam apenas o triunfo dos radicais de direita capitaneados por Sharon. A começar pelo número de votantes, 62%, que significa o menor comparecimento da história de um país dos mais politizados. Os sufrágios também representam, em maior grau, um repúdio à política fracassada do derrotado Ehud Barak, que uniu um modo autocrático de governo com um plano de paz considerado o mais audacioso já proposto por Israel a seus vizinhos. Ao mesmo tempo, as urnas revelam a total perda de confiança em Yasser Arafat, o presidente da Autoridade Palestina e quem dará o jamegão final em qualquer acordo.

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Plebiscito – “O que se teve agora foi uma espécie de plebiscito sobre as atitudes de Arafat. E a maioria dos israelenses – inclusive muita gente da esquerda – mostrou que já não o considera um parceiro para a paz”, disse a ISTOÉ Yael Dayan, um trabalhista membro do Parlamento. “Barak chegou a oferecer parte de Jerusalém a Arafat, inclusive a administração do Templo do Monte. Ofereceu mais terra em troca da paz, e coroou tudo com o reconhecimento de um Estado Palestino. Arafat exigiu mais: queria ainda a volta de quatro milhões de refugiados palestinos – muitos deles nem sequer conhecem a terra para onde iriam. E isso era inaceitável, porque representaria um enorme perigo para a segurança de Israel. Arafat sabia disso e assim mesmo forçou a mão. Os israelenses compreenderam o jogo. Arafat simplesmente não queria a paz”, sentencia Dayan. O ressentimento contra Arafat nas ruas de Israel é tão denso que quase se pode usá-lo como creme sobre uma fatia de bagel (pão recheado típico). A percepção é a de que o líder palestino propositadamente aniquilou a carreira política de Barak e enterrou as melhores oportunidades para a paz. “Arafat não teve coragem para fazer história. Ele ficou com medo de ser deposto ou morto por seu povo, caso assinasse um acordo com Barak”, diz Lewis Roth, líder do grupo pacifista americano Americans For Peace.