À primeira vista o sindicalista Rafael Marques da Silva Júnior, que na semana passada venceu o embate dos metalúrgicos do ABC com a Volks, parece ser totalmente diferente dos líderes que fizeram história no movimento sindical nas últimas quatro décadas. Ele não usa barba, prefere uma boa taça de vinho aos goros de cachaça e tem o hábito de trocar a feijoada ou o churrasco por um prato de lasanha de berinjela. 
 

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Eletricista de manutenção na Ford desde 1986, casado e pai de um jovem de 18, Rafael, como é tratado pelos companheiros, é fã de rock pauleira e não curte nem um pouco os melosos sertanejos. Quando perguntado sobre as preferências musicais é enfático: Black Sabbath, Slayer, Kiss, Ozzy Osbourne, Iron Maiden, Aerosmith e Whitesnake.
 
O estilo pauleira termina no gosto musical. Quando se trata de política sindical, Rafael é um construtor de pontes, embora não abra mão de princípios como a manutenção do nível de emprego e as conquistas consolidadas na CLT. Mas nem sempre foi assim. Antes de se tornar um articulador, Rafael teve seus momentos de radicalismo explícito. Em sua sala, com o ar-condicionado desligado apesar do calor senegalês que fazia em São Paulo na última semana, ele recebeu a reportagem de ISTOÉ e descreveu a sua trajetória.  
 
Corintiano doente, desses de freqüentar estádio até debaixo de trovoadas, Rafael conta que começou a se interessar pela política ouvindo conversas e frequentando reuniões com velhos colegas de fábrica pertencentes ao antigo Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8), organização política que participou da luta armada contra a ditadura militar. Do MR8, migrou para a Convergência Socialista, uma das tendências mais radicais do PT, que rompeu com o partido e hoje transformou-se no PSTU. 
 
Em 1988 começou a tomar posturas mais conciliadoras e se aproximou do grupo de Lula, onde permanece até hoje. Dos tempos de radicalismo, Rafael garante que manteve apenas a ideologia socialista. E nesse momento explica porque não liga o ar-condicionado: “Não quero levar uma vida muito diferente do que a do peão de chão de fábrica. E lá não há privilégios”.
 
Para conduzir os metalúrgicos à vitória na semana passada, que levou à multinacional a reverter 800 demissões, Rafael administrou dez dias de greve, manteve milhares de trabalhadores sintonizados via whatsApp e, ao mesmo tempo em que se mostrava inflexível ao patronato, buscava as articulações políticas que poderiam assegurar os postos de trabalho. Na terça-feira 13, o presidente do sindicato fez uma romaria entre o Palácio dos Bandeirantes, onde pediu ajuda do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, para apoiar o movimento e intermediar as negociações. 
 
Depois foi a Brasília, para o quarto andar do Palácio do Planalto, piso do gabinete da presidenta Dilma Rousseff, onde manteve-se reunido com o ministro Miguel Rosetto, da secretaria-geral da presidência. Lá, reafirmou o apoio ao PT, mas deixou claro que emprego não pode ser moeda de troca para qualquer que seja a política econômica. “A luta pelo emprego é a principal pauta do movimento sindical e todas as centrais para este ano”, afirmou. Se depender da disposição de Rafael, o ABC poderá voltar a protagonizar momentos marcantes na política brasileira.