Tombadas como patrimônio histórico, Olinda e Ouro Preto decidiram botar ordem na folia e proibiram a música eletrônica no Carnaval. Os vilões são as caixas de som instaladas nas janelas e varandas por locatários e turistas que ocupam sobrados antigos. As parafernálias tocam gêneros sem nenhum parentesco com os ritmos tradicionais e reúnem foliões em frente às casas, o que atrapalha o fluxo dos blocos. Por considerar que as bandas de frevo vêm sendo prejudicadas por esses “focos não oficiais de animação”, a prefeita de Olinda, Luciana Santos (PCdoB), baixou um pacote de medidas para organizar a festa. Ela promete cobrar multas no valor de R$ 5 mil para quem ousar instalar caixas de som nas casas. Luciana também culpa os tais “focos não oficiais” pelos danos ao patrimônio, já que eles ajudam a atrair um número cada vez maior de foliões na cidade. “Se não formos rigorosos, a cada ano Olinda ficará mais e mais depredada depois do Carnaval. Vamos organizar a bagunça”, diz a prefeita.

A Lei Municipal do Carnaval proíbe a instalação dos equipamentos, mas a antiga gestão fazia vista grossa. “O bloco pára em frente a estas casas porque muita gente fica embaixo das caixas e a potência do som é tanta que, no longo prazo, abala as estruturas da cidade”, afirma Sérgio Rezende, secretário municipal de Cultura e Patrimônio. As restrições não se limitam ao som. A brincadeira agora terá sentido obrigatório. Ninguém mais vai poder pular na contramão e as agremiações terão de obedecer ao sentido do desfile nas vielas imposto pela prefeitura. A polêmica intervenção é uma das tentativas de melhorar o fluxo, evitando que um bloco trombe com outro e ninguém saia do lugar. Ambulantes de tapioca e queijo de coalho deverão abandonar seus antigos pontos nas laterais das ruas. Apenas um corredor será destinado aos vendedores. E, para evitar depredações, a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, de 1580, ficará cercada por seguranças.

A mesma proibição também deve amenizar os danos causados ao patrimônio de Ouro Preto. A cidade recebe cerca de 30 mil pessoas todos os anos – quase um terço de sua população – e sofre com as caixas de som nas varandas. No último ano, um casarão do centro histórico abrigou um grupo de 100 paulistas e, como era de se esperar, teve sua estrutura totalmente comprometida pelo barulho ensurdecedor e por atos de vandalismo dos visitantes. A depredação foi tamanha que os foliões respondem a uma ação popular. Para a festa deste ano, a área destinada à bagunça durante a noite foi limitada à parte baixa da cidade e a instalação das caixas foi proibida pela Justiça.

Lixo e insegurança – Infelizmente as medidas anunciadas não contemplam obras de saneamento e infra-estrutura nas cidadelas do século XVI, pouco preparadas para receber uma imensa quantidade de visitantes. Todo ano, turistas e moradores enfrentam os mesmos problemas: sobra lixo, falta água e segurança. Vítimas de depredações, os centros históricos terminam o Carnaval atulhados de detritos e com os esgotos transbordando. Os 15 mil moradores do centro histórico de Olinda são obrigados a inalar o odor da urina que desce literalmente das ladeiras da cidade. Nas ruas e vielas foram recolhidas mais de 50 toneladas de latas de alumínio na Quarta-feira de Cinzas do ano passado, resultado da bebedeira de um milhão de foliões. Este número exorbitante de pessoas vai voltar a pular freneticamente este ano sobre os paralelepípedos do sítio histórico fundado em 1535. É claro que não há organização possível durante o Carnaval, quando poucas almas restam sóbrias. Os estragos, certamente, continuarão sendo grandes. Tanto que o projeto de revitalização de Olinda, sustentado pelo Monumenta, programa do Ministério da Cultura em parceria com o BID e a Unesco, só começará em março. O representante da Unesco no Brasil, Jorge Werthein, quer que as festas continuem animadas, mas alerta para a necessidade de se conscientizar os cidadãos: “Nada vai dar certo se o folião não for responsável pela preservação do patrimônio destes lugares.”